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terça-feira, março 24, 2009

Será que Deus está de mau humor?



Conheci o jornalista Sebastião Reis em 1979, por intermédio dos jornalistas Mário Adolfo e Inácio Oliveira, quando ambos trabalhavam no jornal A Crítica, cuja redação ficava na Rua Joaquim Sarmento, no centro da cidade. Continuamos nos vendo com freqüência, mesmo depois que Sebastião Reis foi trabalhar no Jornal do Comércio, cuja redação ficavam no Japiim.

Sempre que ia deixar minhas colaborações no Suplemento JC, eu aproveitava para papear com ele na redação. Quem o conheceu sabe, que ele sempre foi um excelente papo e um brilhante contador de “causos” hilariantes e gafes homéricas, tanto de políticos como de colegas de redação. Eu vivia implorando para ele colocar essas presepadas no papel. Ele nunca quis.

Em alguns finais de semana, nesse meio tempo, a gente disputava “rachas” animadíssimos (2 X 2, ou seja, eu e o diagramador Jorge Estevão contra ele e Mário Adolfo) em um sítio na AM-010, ali nas proximidades da Casa do Índio, da Funai. Na beira do campo, o “juiz” Inácio Oliveira se limitava a xingar uns e outros de pernas-de-pau, rir de se contorcer no chão e encher o tanque de birita. Bons tempos, zifio!

Sebastião Reis, Inácio Oliveira e Mário Adolfo, entre outros, estavam na equipe que o jornalista Deocleciano Souza montou para colocar nas ruas o primeiro número do jornal Amazonas em Tempo, em setembro de 1987. Na redação, ele conheceu a jornalista Mônica Maia (que havia sido minha contemporânea no curso ginasial do Ida Nelson), namoraram, casaram e se mandaram para o Rio de Janeiro. Lá, ele começou como repórter esportivo do Jornal dos Sports e terminou como chefe da sucursal carioca d’O Estadão. O caboco era suburucu.

Sebastião Reis retornou a Manaus no final de 1998, depois de vários anos de exílio voluntário na Cidade Maravilhosa e em Brasília, para ser editor executivo do jornal A Crítica. Em março de 2000, ele me chamou para colaborar no jornal com um artigo semanal. A Crítica iria voltar a circular às segundas-feiras e eles precisavam de alguém bem humorado(?) para retratar o cotidiano da cidade de uma maneira assaz descontraída. O tema a ser abordado ficaria inteiramente a meu critério. Não haveria censura nem imposição de pauta. O texto seria publicado no espaço nobre do jornal, na página A4, a mesma da coluna “Sim & Não”, a mais lida e comentada da imprensa amazonense, e logo embaixo da charge do Myrria, que dispensa apresentação. Aceitei o convite na hora.

Nas conversas posteriores que mantive com o Reis, argumentei que, em vez de fazer crônicas “leves” sobre o cotidiano baré, preferiria relatar causos políticos que havia coletado ao longo dos anos e que haviam ficado de fora do meu livro “Folclore Político do Amazonas”, publicado pela Editora Valer como parte da coleção “Em busca da identidade regional”, patrocinada pela Secretaria de Estado da Cultura e Turismo. Sebastião Reis levou minhas sugestões à vice-presidente do jornal, Tereza Cristina Calderaro Corrêa, que me deu carta branca para tocar o projeto. Os dois, portanto, se tornaram co-responsáveis pela publicação daquelas diatribes ao longo da década.

A primeira crônica foi publicada no dia 9 de abril de 2001, com direito a chamada na primeira página do jornal. Como nunca tive a pretensão de ser historiador, limitei-me a vender o peixe tal como havia comprado. E assim foi nas crônicas subsequentes. Houve repercussão, claro, mas nada comparável ao barulho que ocorreu três meses depois, mais precisamente no dia 1º de julho, quando a crônica foi publicada na página A5, da edição de domingo, no espaço antes ocupado pela coluna “Taqui pra ti”, do meu amigo José Ribamar Bessa Freire. A leitura enviesada que alguns cretinos fizeram foi a seguinte: eu, um cronistinha de merda, aprendiz de escrivinhador, havia “puxado o tapete” do consagrado jornalista Babá Bessa. Houve choro e ranger de dentes. Devo ter sido amaldiçoado até a quinta geração.

O pior é que nem sequer estava em Manaus – estava em Parintins, fazendo o lançamento do meu livro “Funk: a música que bate”, na companhia de Mário Adolfo, que estava lançando o seu “Conversa pra boi dormir.” Na segunda-feira, minha mulher me ligou para avisar que a coluna não havia saído. Na quarta, quando retornei a Manaus, liguei para o Reis, para saber o que estava acontecendo. Só então fiquei sabendo que a coluna havia sido publicada no domingo, porque a direção do jornal havia interrompido a colaboração do Ribamar Bessa. Não perguntei o motivo e nem me interessei pelo assunto. Como dizia um psiquiatra amigo meu, “dessas coisas de linha editorial eu nunca entendi bem”.

O certo é que continuei publicando esses “exercícios de memórias” todos os domingos, em A Crítica, até abril de 2003, em uma colaboração que durou exatos dois anos. Pela quantidade de e-mails elogiosos que recebi e de processos furibundos que respondi, muita gente gostava e odiava na mesma proporção. Sebastião Reis sempre segurou a barra, porque acreditava na “liberdade de imprensa”. Mas no final de abril, ele deixou o jornal para tocar um novo projeto (o jornal Estado do Amazonas, do empresário Francisco Garcia).

No dia 27 de abril, o novo editor (o jornalista J. Paulo, de triste memória, que havia sido trazido do Rio de Janeiro pelo próprio Sebastião Reis) não gostou muito de publicar um “direito de resposta” na minha coluna, em que a economista Nereida Coelho reduzia a pó de traque a minha reputação por causa – vejam só! – de uma “releitura” de um texto do Felix Valois sobre o ex-governador Plínio Coelho. Na minha última coluna, publicada no dia 18 de maio, eu tentava desfazer o equívoco. Três dias depois, por telefone, o iracundo J. Paulo me dispensou, sem maiores explicações.

Coloquei a viola no saco e fui cantar em outra freguesia. No caso – e de novo a convite do Sebastião Reis –, na revista que era encartada aos domingos no jornal Estado do Amazonas. Continuei publicando meus “causos” políticos, como colaborador da revista, até maio de 2005. Foi quando, a convite do Paulo Castro, passei a ser colunista diário do Correio Amazonense. Mas minha amizade com o Sebastião Reis sempre permaneceu inalterada. Nos falamos pessoalmente várias vezes no ano passado.

Ultimamente, os dois (Reis e Castro) dividiam a editoria geral do Amazonas em Tempo. Estive na redação do jornal há algumas semanas, mas não o vi por lá. E a certeza de que nunca mais vou vê-lo é que me deixa o coração apertado nessa manhã chuvosa. Daí lá vamos nós com aquele velho bordão que só nos aumenta a dor ainda mais: com tanto filho da puta pra morrer, por que logo o Sebastião Reis?...

Descanse em paz, meu guerreiro! Com tantos ex- parceiros seus aí em cima – Chico Pacífico, Aguinelo Oliveira, Paulo José, Ernesto Coelho, Nego Ivan, Antonio Paulo Graça, Rosendo Lima, Nestor Nascimento, Alberto Simonetti, Silvério Tundis, Elaine Ramos, Theodoro Botinelly, Luiz Almeida Marrom, Crisanto Jobim, Sabá Raposo, Jomar Jr., Celeste Pereira, Manoel Borges, Elaine Lima – eu já estou quase convencido de que a animação boa está mesmo aí no segundo andar. Dia desses a gente se vê!

Um comentário:

Fred Novaes disse...

Fala meu irmão! Lamentável a morte do contestado e admirado Reis.
Entre invejosos e órfãos, fica o jornalismo, de luto, mais pobre e careta. Com Reis, foi a ousadia e a coragem de não ser limitado a normas e a tudo que todo mundo já faz. Não concordava com muito do que ele fazia, mas o admirava porque continuava fazendo, apesar dos risinhos escondidos, daqueles que o invejavam. Um abraço, irmão.