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quarta-feira, abril 29, 2009

A dura faina de um piscicultor aprendiz


Ex-secretário de Indústria e Comércio do Amazonas, Cristóvão Marques resolveu se aventurar pelo fascinante mundo da piscicultura em gaiola. É sabido por todos que a criação de peixes em tanques-rede ou gaiolas flutuantes é uma das melhores formas de aproveitar racionalmente os recursos hídricos disponíveis, seja rio, lago ou açude.

Como possuía um sítio às margens do igarapé do Tarumã, Cristóvão resolveu juntar a fome com a vontade de comer. Ele mesmo desenvolveu as gaiolas, cuja borda superior flutuava cinco centímetros acima da linha d’água, e optou pelo cultivo de pirarucu.

Também é sabido por todos que o cultivo de pirarucu em gaiolas aumenta a produtividade do manejo por permitir altas taxas de estocagem de alevinos (filhotes) em virtude da renovação constante da água. Em cada uma das 50 gaiolas, Cristóvão estocou 10 mil alevinos.

Um mês depois, Cristóvão descobriu que, misteriosamente, mais da metade dos alevinos havia sumido das gaiolas.

Depois de intensas pesquisas e observações de campo, ele descobriu o que estava acontecendo: as gaivotas e garças simplesmente estavam “morando” em cima das gaiolas e fazendo a maior farra. Pra aves, era a mesma coisa que pescar em bilha.

Cristóvão matou pessoalmente uma garça, mediu seu bico (10 cm) e fez uma reengenharia nas gaiolas. A borda superior passou a flutuar 15 centímetros acima da linha d’água.

Dois meses depois, Cristóvão descobriu que, misteriosamente, os 10 mil alevinos iniciais haviam se transformado em menos de mil.

Depois de intensas pesquisas e observações de campo, ele descobriu o que estava acontecendo: os alevinos de piranha vermelha conseguiam entrar nas gaiolas pelas malhas de abertura e detonavam os inocentes alevinos de pirarucu.

Atendendo a sugestão de um especialista, ele resolveu colocar guardiões para proteger o estoque de pirarucus: alevinos de tucunaré, que têm uma preferência gastronômica por alevinos de piranha vermelha. No início, a estratégia foi um sucesso.

Três meses depois, Cristóvão descobriu que, misteriosamente, os menos de mil alevinos de pirarucu haviam desaparecido completamente. Nas gaiolas, restavam apenas os alevinos de tucunaré.

Depois de intensas pesquisas e observações de campo, ele descobriu o que estava acontecendo: os alevinos de tucunaré se desenvolviam bem mais rápidos do que os alevinos de pirarucu e, predadores vorazes por natureza, na falta de piranhas vermelhas passaram a comer os pirarucus.

Cristóvão resolveu fazer uma nova reengenharia nas gaiolas, de forma que os alevinos de piranha vermelha não pudessem adentrar no recinto pelas malhas de abertura das gaiolas, o que também o desobrigaria de colocar alevinos de tucunarés para combater os invasores.

As 50 novas gaiolas foram construídas com telas galvanizadas, no dobro do tamanho original. Em cada uma delas, ele colocou 20 mil alevinos.

Semanalmente, Cristóvão monitorava o crescimento dos peixes e percebia que a perda de filhotes era mínima. Dessa vez, o empreendimento tinha tudo para dar certo. Cristóvão parou de se preocupar.

Oito meses depois, o senador Romeu Tuma estava fazendo uma visita a Manaus e foi convidado pelo piscicultor para conhecer o empreendimento.

Amigos de longa data, Romeu Tuma aceitou o convite com uma condição: gostaria de ir até o local no barco regional do empresário e, se possível, que o almoço fosse um exemplar de pirarucu pescado na hora.

Pelos cálculos de Cristóvão, seus peixes já estariam pesando uns 10 quilos, o que daria de sobra para o senador fazer uma lauta refeição.

Ao chegarem ao local, Cristóvão deu ordens aos seus “vaqueiros” que levantassem uma das gaiolas para o senador escolher pessoalmente o seu pirarucu. A primeira gaiola foi levantada: nem sombra de pirarucu. A segunda gaiola, idem. A terceira, ibidem, e assim por diante.

Só então Cristóvão percebeu o que havia acontecido. A acidez da água do igarapé do Tarumã havia corroído completamente as telas galvanizadas. Os pirarucus, já taludinhos, não tiveram que fazer muita força para arrombar as gaiolas e se escafederem. Não ficou um para contar a história.

O mico só não foi maior porque a cozinheira do barco improvisou uma macarronada com sardinha em lata, uma das paixões gastronômicas do senador Romeu Tuma.

E porque, indiretamente, Cristóvão repovoou o igarapé do Tarumã com 1 milhão de pirarucus. Não é pouca porcaria.

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