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sexta-feira, dezembro 25, 2009

Eu vou ali, mas volto logo!


Estou bebendo com o Simas Pessoa, o Gigio Bandeira, o Aureo Petita, o Zé Guedes, o Ernâni, o Paulo Filho, o Márcio Rogério, o Ferrinho, o Luiz Lobão e mais alguns homeboys circunstanciais desde quinta-feira. O fígado tem se comportado como se deve.

Como ainda me acho filho de Deus, amanhã saio de férias e o mocó só volta a funcionar na segunda semana de janeiro.

Pra quem tem tido a boa vontade de vir aqui no pardieiro de vez em quando, meus votos de um 2010 muito melhor do que 2009, mas infinitavemente pior do que 2011. Em 2012 a gente acerta os ponteiros de vez...

Minha dica de presente de fim de ano? O belíssimo disco que estou ouvindo agora, "Zé Ramalho canta Luiz Gonzaga", dado de presente pelo (quem mais poderia ser?) antenado Simas. O fato de ele ser meu irmão caçula é o de menos.

E a música definitiva é a primeira, "Fica Mal Com Deus", do Geraldo Vandré, em que, mesmo depois de morto, o velho Lua faz um dueto emocionante com o Zé Ramalho.

Essa canção - que eu curtia na versão do Quinteto Violado - tem sido minha bússola, meu sextante e meu GPS ao longo desse mais de meio século de existência. Curtam e inté a volta...

Fica mal com Deus
Quem não sabe dar
Fica mal comigo
Quem não sabe amar

Pelo meu caminho vou
Vou como quem vai chegar
Quem quiser comigo ir
Tem que vir do amor
Tem que ter pra dar

Fica mal com Deus
Quem não sabe dar
Fica mal comigo
Quem não sabe amar

Vida que não tem valor
Homem que não sabe dar
Deus que se descuide dele
O jeito a gente ajeita
Dele se acabar

Fica mal com Deus
Quem não sabe dar
Fica mal comigo
Quem não sabe amar

terça-feira, dezembro 22, 2009

Snoopy é eleito cão mais conhecido da cultura pop


O cãozinho Snoopy, e seu dono, Charlie Brown, criados por Charles Schulz

Da Reuters

O personagem Snoopy, da tirinha de Charlie Brown, foi eleito o cachorro mais conhecido da cultura pop pelo Clube Canino Americano nesta terça-feira (22), como parte de seu 125º aniversário.

Cerca de 76 mil pessoas votaram on-line para escolher os favoritos de uma lista de cães da literatura, televisão, cinema, esportes e artes, disse o clube.

Snoopy é o cachorro pensativo, cujo melhor amigo é um pássaro e que parece mais esperto que seu dono na tirinha criada por Charles Schulz, que morreu em 2000.

"Charlie Brown", que por quase cinco décadas serviu como um espelho para a geração baby-boom, aparece em 2.600 jornais em 21 línguas.

O segundo lugar foi para o mascote Reveille, da Universidade do Texas A&M, seguido de Scooby-Doo, o personagem do desenho de televisão.

Eis a lista dos 10 mais escolhidos:

1. Snoopy

2. Reveille

3. Scooby-Doo

4. Eddie, do seriado de televisão "Frasier"

5. O brinquedo Pound Puppy

6. O quadro "Cães Jogando Pôquer"

7. A música "How Much is that Doggie in the Window"

8. Jack, o buldogue de Georgetown

9. A música "Who Let the Dogs Out"

10. Brian Griffin, do seriado animado de TV Family Guy

O desencanado Pluto, do camundongo Mickey, ficou em 35º lugar e o inesquecível Rin Tin Tin, em 46º. Quer dizer, esses internautas de hoje não entendem porra nenhuma de cultura pop.

Clique aqui para ver a lista completa.

Mitos pra todos os gostos


por Mouzar Benedito

Andei pensando na origem e na “capacidade de transformação” de nossos mitos. Não no Saci, que já escrevi dezenas de vezes sobre sua origem indígena, o ganho da cor, a perda da perna e a aquisição do gorrinho vermelho.

Primeiro, o Mapinguari, mito pouco conhecido em outras regiões, mas presente e temido na Amazônia, principalmente nos seringais do Acre e do Amazonas. Segundo alguns linguistas, o nome dele é de origem aruak, mas Câmara Cascudo diz que pode ser tupi, seria uma contração de mbaé-pi-guari, “coisa do pé torto”. Só que ele não tem nada a ver com pé torto. E sua origem, podemos dizer, tem algo a ver com a pré-história.

Cientistas brasileiros e estrangeiros procuram fósseis dele na região. Era uma preguiça gigante, com mais de três metros de altura, em outros tempos não tão antigos quanto o dos dinossauros. No imaginário popular dos moradores da floresta, principalmente seringueiros, o Mapinguari não é de outras eras, é atual.

Ele é peludo, tem um bocarrão vertical na barriga e anda pela mata dando urros medonhos. Quando encontra seringueiro trabalhando em domingo ou dia santo, come a cabeça dele, e larga o resto do corpo sangrando. Então, além de tudo, ele é anticapitalista e católico! Respeita domingos e dias santos.


Por falar em católico, tem também – no outro extremo do Brasil, o Rio Grande do Sul – outro mito de origem católica, o Negrinho do Pastoreio, que era órfão e foi criado por um fazendeiro mau que tinha um filho igualmente malvado. Judiavam do Negrinho, que nem nome tinha. Castigado com uma surra de chicote pelo fazendeiro por ter deixado escapar um cavalo, ele teve que reencontrar o animal, mas o filho do fazendeiro o soltou para que o pai castigasse o Negrinho de novo.

O Negrinho levou nova surra e foi colocado sangrando num formigueiro, para ser comido vivo pelas formigas. Mas quando o fazendeiro foi ver, dias depois, o resultado desse castigo, encontrou o Negrinho são e salvo, com a pele luzindo, ao lado de Nossa Senhora, protetora do menino. E o cavalo perdido, ao lado deles. O menino montou no cavalo e saiu a galope, e até hoje quando alguém perde alguma coisa reza para o Negrinho do Pastoreio e pede que encontre o objeto perdido.

Um mito mais moderno é a Perna Cabeluda, em Recife e Olinda. Ela é o contrário do Saci. Tem só uma perna, falta o resto do corpo. E é uma perna danada, braba, que dá belas surras de chutes em algumas pessoas. Quando cercada pela polícia, ela dá um arroto alto e fedido, some e reaparece noutro lugar. Tudo começou com um guarda noturno que chegou em casa de manhã, um pouco mais cedo que de costume, deitou-se ao lado da mulher e sentiu que tinha alguma coisa debaixo da cama. Olhou e viu só uma perna cabeluda...

Tem também as transformações: a Iara, na origem, não era mulher, chamava-se Ipupiara, era o Senhor das Águas. Com a chegada dos europeus, o ser que dominava as águas foi comparado com as sereias europeias e virou mulher.


Tem ainda as diferenças do mesmo mito conforme a região, e mitos muito parecidos, com nomes diferentes em outras. Por exemplo: o Caipora, protetor dos animais da mata, em certas regiões do Nordeste é mulher, a Caipora, por sinal muito namoradeira e ciumenta. Namora homens e, quando é traída, bate bastante no sujeito.

Já o Curupira, protetor das matas, é confundido com o Caipora em vários lugares. E o Pé-de-garrafa na região do cerrado se parece muito com os dois, no sentido de castigar quem entra na mata para matar animais sem necessidade, mas tem uma perna só, com um pé redondo, que justifica o seu nome.

Bom, e quem vê todos esses seres? Olha, com certeza quem vive isolado tem mais chances. Parece que os mitos não gostam de aparecer para multidões. Lembro-me de uma história contada pelo grande escritor Simão Pessoa, em Manaus. Um amigo dele, viajando de barco, parou numa cabana na beira do rio, onde morava um velho sozinho, sem nenhum vizinho em muitos quilômetros, e perguntou ao velho:

– Como é, tem visto muito Saci por aqui?

O velho respondeu:

– Saci, até que tem aparecido bastante. O que tá em falta é Mapinguari.



(Essa matéria é parte integrante da edição impressa da revista Fórum de outubro de 2009.)

Chupa que é doce!


Produção de cana-de-açúcar da Agropecuária Jayoro

Maio de 1988. A Agropecuária Jayoro, no município de Presidente Figueiredo, nasceu em 1984, no rastro de financiamentos e incentivos fiscais do Pró-Álcool. Levou quatro anos para começar a produzir. A primeira colheita resultou em menos de 500 toneladas de açúcar.

Intrigados, os burocratas de Brasília avisaram ao governador Amazonino Mendes que uma equipe do TCU iria se deslocar até Manaus para verificar pessoalmente a existência dos canaviais.

Supostamente, uma grande parte do financiamento para consolidar o pólo de cana-de-açúcar do município havia sido desviada para bancar a campanha eleitoral do candidato do governo em 1986 (o próprio Amazonino).

Convocado para desatar o nó, o secretário de Produção Rural, Jaith Chaves, armou um pequeno circo. Com uma semana de antecedência, ele mandou deixar em várias casas flutuantes existentes na orla fluvial de Iranduba uma quantidade considerável de cana caiana, importadas diretamente da Copersucar, de São Paulo.

A robusta cana caiana ganhou esse nome porque as primeiras mudas vieram de Cayenne, capital da Guiana Francesa, então domínio de Portugal, chegando ao Rio de Janeiro, em maio ou junho de 1810, e daí se espalhando pelo país.

Os técnicos do TCU foram recebidos pelo secretário na sede da Sepror. Após as mesuras tradicionais de parte a parte, Jaith Chaves deu uma verdadeira aula sobre o cultivo da cana-de-açúcar na região amazônica.

Segundo ele, os cientistas do Inpa em parceria com os técnicos da Embrapa haviam desenvolvido um cultivar que se adaptava perfeitamente às nossas várzeas. As águas do rio podiam subir durante a maior enchente do mundo, que a cana-de-açúcar continuaria ali, firme e forte.

Para comprovar suas afirmativas, o secretário embarcou os burocratas em uma lancha e rumou para a região do Iranduba. Pararam em uma das casas flutuantes que haviam sido contempladas, previamente, com as canas oriundas da Copersucar.

– Ô compadre Zé Luiz! – berrou o secretário, da amurada da lancha. “Me dê uns roletes dessa sua cana para eu mostrar aqui pros meus amigos de Brasília!”

O caboco não se fez de rogado e entregou um feixe de cana caiana para o secretário.

Com uma habilidade exemplar, Jaith descascou a cana doada pelo caboco, cortou em rodelas e distribuiu para os burocratas. Eles experimentaram e acharam a qualidade da cana excelente.

Para quem não sabe, a cana caiana é a cana mais pobre em sacarose, por isso é a melhor, mais mole e mais gostosa de chupar e, consequentemente, a que dá o melhor caldo.

As canas destinadas ao fabrico de açúcar, por conterem alto teor de sacarose, costumam provocar embaraços intestinais na pessoa que as chupa. Mas desde quando um burocrata de Brasília vai saber desses pequenos detalhes?

Jaith Chaves repetiu a mesma lambança em mais cinco ou seis casas flutuantes. Quando os burocratas se deram por satisfeitos pela qualidade da cana de açúcar, ele resolveu levá-los para ver as plantações. A lancha embicou na direção do encontro das águas.

O secretário apontou para aquele mar verde formado por canaranas e chutou de bico:

– Esses aí são os nossos canaviais nativos! São esses cultivares que foram desenvolvidos pela parceria entre o Inpa e a Embrapa. A gente não vai poder se aproximar muito porque esse tipo de cana é extremamente sensível ao barulho. Os agricultores fazem o manejo pilotando canoas bem devagarinho...

Visivelmente maravilhados, os burocratas começaram a fotografar as canaranas. A lancha iniciou a subida do rio Solimões e nada de o canavial terminar.

Aliás, se eles navegassem até Tabatinga iriam continuar se admirando com as plantações de canaranas dos dois lados do rio. Uma hora depois, pediram para o secretário retornar para Manaus. Estavam satisfeitos com a inspeção.

Concluíram que o futuro do Pró-Álcool estava nas várzeas amazônicas e que o Amazonas, sozinho, poderia abastecer o planeta inteiro com açúcar, cachaça e etanol.


Agricultor fazendo manejo de canavial nativo nas proximidades de Manaus

Para quem também não sabe, canarana é um termo híbrido, junção de “cana” e “rana”. O vocábulo “cana” vem do latim “canna”, e refere­-se ao caule de inúmeras plantas das famílias das gramíneas, como a cana-de-­açúcar e a taquara. O vocábulo “rana” é sufixo de origem tupi (igual, semelhante, parecido). A palavra canarana designa uma planta palustre que se assemelha à cana-de-açúcar, mas que não passa de um vagabundo capim nativo da Amazônia.

Esta gramínea se encontra em vastíssima área da bacia amazônica, principalmente nos rios, igarapés e lagos de águas amarelas, presas ou flutuando, à mercê das correntezas, não tendo apenas um grande valor para a alimentação do gado, mas servindo de abrigo aos peixes à noite, e, durante o dia, protegendo as desovas dos mesmos e a vida dos alevinos que nadam entre as suas hastes e radículas.

Mas desde quando um burocrata de Brasília vai saber desses pequenos detalhes?

O Jaith Chaves, sozinho, colocou eles todos no bolso.

Bom, mas o que se sabe é que, com a ajuda oficial minguando, fustigada pelo clima implacável da região e cortada por uma estrada de terra – frequentemente interditada por causa das chuvas –, a usina da Agropecuária Jayoro entrou em processo de decadência.

Em 1994, as máquinas pararam e restou apenas um pequeno engenho, suficiente para dar conta da produção de 100 toneladas por ano. Uma doce coincidência, entretanto, tirou a Jayoro da lista interminável de projetos agroindustriais fracassados na Amazônia.

A Coca-Cola precisava de açúcar para abastecer sua única fábrica de concentrado, instalada na Zona Franca de Manaus. Ela é uma das cinco maiores do mundo e abastece as 49 fábricas no Brasil. A fábrica também exporta o concentrado para o Paraguai, Colômbia, Venezuela e Austrália.

Levar para Presidente Figueiredo o açúcar do Sul ou do Centro-Oeste do País encareceria demais os custos. O jeito era produzi-lo na região.

A usina, embora funcionando em condições precárias, tinha espaço para ampliar a plantação e maquinário. O casamento aconteceu em 1995.

De lá para cá, a Coca-Cola já investiu R$ 48 milhões na Jayoro. A área plantada passou de 400 para 2.618 hectares – a meta é chegar a quatro mil hectares em 2013.

“A tecnologia da Jayoro nada fica a dever à das maiores usinas do Sul do País”, diz o diretor de relações governamentais da Coca-Cola, Jack Corrêa. “Ela é a única empresa de açúcar da Coca-Cola no mundo”.

segunda-feira, dezembro 21, 2009

A fotografia de primeira página


Abril de 1992. Eu estava trabalhando na agência G&F Comunicações, do Valdo Garcia, ali na Rua Ituxi, no Vieiralves, quando o telefone tocou.

Do outro lado da linha, um sujeito explicou que gostaria de falar comigo pessoalmente. Ele havia chegado recentemente de Curitiba e vinha recomendado pelo poeta Hélio Leites.

Ensinei o endereço da agência. Dali a meia hora, entrou na minha sala o poeta, artista plástico e fotógrafo profissional Alberto César Araújo.

Ele me contou a sua história. Nascido em Manaus, Alberto Araújo tinha picado a mula aos 15 anos de idade. Depois de morar em São Paulo e Rio de Janeiro, fixou residência no Paraná, onde conheceu Hélio Leites.

Publicou livros de poesias, estudou fotojornalismo, participou de oficinas de textos, trabalhou em jornais de Curitiba e Londrina, fez exposições de artes plásticas, se filiou ao Sindicato de Fotógrafos e Cinegrafistas Profissionais e Autônomos do Paraná, participou de congressos, seminários, conferências, cursos, ciclos de debates e palestras relacionadas com o exercício da atividade profissional, enfim, o moleque de pouco mais de 20 anos exibia um currículo cascudo.

Ele havia retornado a cidade para fundar uma associação profissional de fotógrafos, mas estava desempregado. Precisava de minha ajuda.


Ricardo Oliveira, Alexandre Fonseca e Alberto Araújo

Na mesma hora, telefonei para o jornalista Mário Adolfo, que na época era o editor da primeira página do jornal Amazonas Em Tempo. Expliquei a situação.

Ele concordou em receber o Alberto Araújo para uma entrevista no dia seguinte. Solicitou apenas que o fotógrafo levasse seu portifólio para, se fosse o caso, ser mostrado para a diretora de redação do jornal, jornalista Hermengarda Juqueira.

Trocamos telefones, desejei boa sorte a ele e o Alberto Araújo foi embora.

Cerca de dois meses depois, encontrei o moleque casualmente no Bar do Armando e começamos a conversar. Alberto havia sido contratado pelo jornal Amazonas Em Tempo, mas estava puto com o Mário Adolfo.

– Aquele teu amigo é um cretino! – desabafou o fotógrafo. “Ele não entende porra nenhuma de fotojornalismo e ainda quer queimar meu filme...”

Pelo que me contou, Alberto fazia diariamente uma porrada de fotografias de alto nível, que deixava os pauteiros e os editores dos cadernos encantados. Mas quando o Mário Adolfo começava a examinar as mesmas fotografias, só encontrava defeitos.

– Está uma merda, Alberto, está uma merda! Eu quero uma fotografia de primeira página, porra! Cadê a minha fotografia de primeira página? Isso aqui é tudo lixo! – detonava implacavelmente.

Alberto havia feito um contrato de experiência de três meses e Mário Adolfo já cantara a pedra: se naquele período ele não emplacasse uma foto na primeira página seria demitido sumariamente. Aquela situação esdrúxula deixava o fotógrafo indignado.

Ainda mais que ele desconfiava que Mário Adolfo o boicotava propositalmente. Para provar o que dizia, Alberto me mostrou algumas cópias das fotografias recusadas pelo editor da primeira página. Eram mesmo muito boas.

No dia seguinte, liguei pro Mário Adolfo para reclamar que ele estava sendo muito exigente com o moleque. Acabamos discutindo. Mário Adolfo estava irredutível:

- Ou ele faz a porra de uma fotografia de primeira página ou eu não renovo o contrato dele.


Andreia Mayumi, Alberto Araújo e Alexandre Fonseca

Alguns dias depois, alguém telefonou para a redação do jornal para avisar que estava acontecendo um incêndio catastrófico no Porto da Jonasa, ali na estrada da Ponta Negra. Único fotógrafo presente na redação, Alberto Araújo foi despachado para cobrir a tragédia.

Como a redação do jornal ficava em São Jorge, em menos de dez minutos ele foi o primeiro fotógrafo a chegar ao local. As labaredas gigantescas proporcionavam um visual primoroso. Era a chance que ele tinha de fazer a tal fotografia da primeira página.

Alberto bateu uma foto dali, outra daqui, correu pra cá, correu pra acolá, invadiu um galpão, contornou um muro, sempre captando ângulos cada vez mais diferentes.

Não satisfeito, ele resolveu fazer uma fotografia aérea e subiu em um poste de quase 10 metros de altura. Empoleirado lá de cima, botou pra disparar sua tele-objetiva.

Quando os fotógrafos dos outros jornais chegaram ao local, os bombeiros já haviam debelado o incêndio. Só o jornal Amazonas Em Tempo teria fotografias do incêndio em todo o seu esplendor. A fotografia de primeira página estava garantida.

Ocorre que Alberto Araújo sofre de acrofobia (medo de altura). Com a adrenalina a mil por hora, ele conseguiu subir no poste, na maior facilidade. Mas agora que a situação estava calma, com seu organismo em condições normais de pressão em temperatura, o fotógrafo entrou em pânico:

– Me tirem daqui! Me tirem daqui! Eu não posso olhar pra baixo que sofro de vertigem! – berrava ele, desesperado, demonstrando ansiedade e angústia verdadeiramente desproporcionais.

Os bombeiros tiveram que interromper o trabalho de rescaldo e usar uma escada magirus para resgatar o aloprado fotógrafo. Os fotógrafos dos demais jornais não perderam tempo e o resgate de Alberto Araújo virou alvo de dezenas de tele-objetivas.

Não lembro se alguma fotografia dele pegou a primeira página do jornal Amazonas Em Tempo, mas ele próprio foi primeira página em todos os outros jornais da cidade.

Hoje, Alberto Araújo é professor de fotojornalismo da UniNorte e subeditor de fotografia do mesmo Amazonas Em Tempo, depois de ter trabalhado nos jornais A Crítica, Diário do Amazonas, Correio Amazonense e Jornal do Norte.

Como freelancer tem trabalhos publicados nos principais jornais e revistas do país: O Globo, Folha de S.Paulo, O Estado de S. Paulo, Jornal do Brasil, Correio Braziliense, Zero Hora, Valor Econômico, O Dia, Veja, Época e National Geographic, entre outras publicações.

No exterior suas fotos já ilustraram as páginas do San Francisco Crhonicle, Sun Sentinel, New York Times, Newsweek, e The Independent. Atualmente tem contrato de parceria com a Agência Estado e Folhapress.


Em 2001, Alberto Araújo venceu o Prêmio Esso de Fotojornalismo, com a foto “Horas de tensão”. Ele registrou o instante decisivo em que o artista conhecido como “Rambo da Amazônia” sai do seu ateliê, com o filho de 1 ano e 4 meses nos braços, apontando uma faca para o abdômen do menino.

A ação acabou tendo um desfecho feliz, após exaustiva negociação, mas o registro de Alberto eternizou a surpreendente cena. “Todos aguardavam a saída do artista, mas ninguém esperava uma cena daquelas. O meu posicionamento propiciou o ângulo ideal para a composição da foto”, explicou o fotógrafo.

Além de ter ajudado a fundar a Associação Amazonense de Fotojornalismo, Alberto Araújo também coordenou a I Semana de Fotografia de Manaus, trabalhou na documentação do Centro Histórico para a Coordenadoria do Patrimônio Histórico e Artístico da Secretaria de Cultura do Amazonas, foi selecionado para o “II FotoNorte”, livro editado pela Funarte que fez um mapeamento da fotografia na região e ministrou a oficina “Linguagem fotográfica através da Fotografia Documental”, no Sesc.

O fotógrafo com eterna cara de menino continua fazendo o seu currículo ficar cada vez mais cascudo. E também continua um homeboy cada vez mais chegado. Acontece.

domingo, dezembro 20, 2009

Ex-membros do Velvet Underground se reúnem em NY


The Velvet Underground, Andy Warhol, Edie Sedgwick, entre outros, em 1965

Os ex-integrantes do Velvet Underground Lou Reed, Maureen Tucker e Doug Yule se reuniram na Biblioteca Pública de Nova York esta semana, no que foi uma rara aparição pública para os ex-companheiros de banda, desativada desde os anos 90 (quando parte deles voltou para uma turnê especial, após a dissolução em 1973).

No programa batizado The Art and Soul of the Velvet Underground, um dos tópicos de conversa foi a associação do grupo com o artista multimídia Andy Warhol.

Conhecido como referência máxima da pop art, Warhol produziu o disco de estreia, The Velvet Underground & Nico, de 1967 - é nele que aparece a famosa banana, ilustração de Warhol que virou marca registrada do Velvet Underground.

A participação da cantora alemã Nico, no caso, teria ocorrido menos por desejo do grupo e mais por insistência do artista.

No bate-papo em Nova York, que aconteceu no esquema “perguntas & respostas” com o público, Reed admitiu que, no início, o grupo só recebeu atenção por ser “cria” do artista.

“Warhol era uma das pessoas mais brilhantes que já conheci na vida”, disse Reed sobre o homem morto em 1987.

“Sem ele, [o Velvet Underground] era meio que inconcebível. Quando nos contrataram para fazer um álbum, não era por causa da gente, era por causa dele. Eles não nos conheciam. Achavam que [Warhol] era o guitarrista principal ou algo parecido.”

A parceria com o artista não se repetiu no segundo álbum, White Light/ White Heat, de 1968.

Outra curiosidade sobre o conjunto: cada vez que eles tocavam um lick de blues, tinham que pagar uma multa de US$ 10, “porque não era legítimo”, revelou Reed.

A ideia era preservar a originalidade da banda, que, numa sentença atribuída a Brian Eno, não teve mais que 10 mil unidades vendidas do primeiro disco, “mas todo mundo que o comprou, formou uma banda”.

Reed acredita que a cena atual deixa a desejar em relação à dos tempos áureos do Velvet Underground.

“Até agora, não acho que tem rolado muita coisa que chegue perto ao que o Velvet fez”, disse.


A reunião dos ex-colegas de banda aconteceu por conta do recém-lançado The Velvet Underground: New York Art, livro que traz uma compilação de fotografias, capas de disco, reportagens, pôsteres, manuscritos e mais memorabilia relacionada ao grupo, com ênfase na segunda metade dos anos 60.

A conversa aconteceu com presença de plateia e incluiu afagos, como quando Reed declarou que Tucker foi o melhor baterista com quem ele já trabalhou.

Apesar de Nico ser o primeiro nome que salta à mente quando se fala da voz feminina do Velvet, Tucker chegou a assumir o vocal principal em algumas poucas faixas, como “After Hours”.

“Eu desde então tentei arranjar um baterista que fizesse o que ela fazia, e é impossível. Eles não conseguem”, disse o ex-frontman do grupo, em relato reproduzido por um programa da BBC Radio 4.

“Se nós aceleramos, ela acelera. Em vez de ter um baterista que vai sentar lá e tentar segurar a batida, a nossa música ia mais rápido e freava a toda hora”, recordou.

John Cale, um dos membros fundadores do Velvet Underground e substituído por Yule em 1968, foi ausência sentida no encontro.

O guitarrista Sterling Morrison, outro membro original, morreu em 1995, após perder a batalha contra um linfoma. Sua viúva, Martha, e o filho Thomas estavam na plateia.

A modelo e cantora Nico morreu em 1988, por conta de um acidente de bicicleta em Ibiza, ilha espanhola.

Assista abaixo a dois vídeos da reunião em Nova York feitos por fãs:



sábado, dezembro 19, 2009

A odisséia do Murrinhas do Egito no 2º Peladão - 1974 (Parte 1)


Nóis na fita, em 1974, na Praça do Congresso. Em pé: Luiz Lobão, Airton Caju, Gilmar Velhota, Silene Pessoa, Mário Adolfo, Fábio Costa e Erivam Cabocão. Agachados: Chico Cavalinho, Wilson Fernandes, Heraldo Cacau, eu, Mazinho e Áureo Petita

Agosto de 1974. Depois de muitas discussões nas mesas do Top Bar, do seu Aristides, resolvemos participar do 2.º Peladão, promovido pelo jornal A Crítica. O nome do time, “Murrinhas do Egito”, era uma gíria do nosso folgado centroavante Chico Costa (aka Chico Cavalinho) para designar qualquer “nó cego” do bairro.

Comprei um equipamento meio psicodélico: camisas de listras verticais grená sobre um fundo laranja e calções brancos. Mário Adolfo se encarregou de pintar o nome do time e os números das camisas. O contador Olibio Xiri, cunhado do Mazinho, assumiu a função de técnico do time.


O coordenador do “Peladão” era o vereador e jornalista Messias Sampaio, morador do bairro e amigo da gente desde seu início de namoro com a Rosely (irmã do engenheiro Roberto Amazonas, ex-diretor do DER-Am), com quem acabou se casando. Ele nos deu a maior pilha para participar do evento.


Nosso míssil balístico intercontinental era a minha irmã, Silene, uma morenaça na flor dos 20 anos, indicada como rainha do nosso time no primeiro ano em que rolou o concurso. A direção do jornal caiu de amores por ela (era difícil sua foto não sair toda semana na primeira página) e o nosso time, por razões óbvias, passou a dispor de privilégios inconfessáveis.

O Murrinhas do Egito tinha craques como Áureo Petita, um armador que combinava a elegância de Ademir da Guia, os dribles geniais de Garrincha, a visão de jogo de Gérson e a explosão de Pelé. Tivesse nascido no Rio de Janeiro, ele teria chegado à seleção brasileira.

Outro craque era o nosso goleiro Mário Adolfo, que compensava a baixa estatura (1,70 m) com uma agilidade de felino. O ponta de lança Luiz Lobão, o lateral-direito Ari Rodrigues e o zagueiro Petrônio Aguiar também eram muitos bons.


Desfile do Murrinhas na abertura do campeonato. No primeiro plano, Erivam e Fábio. Atrás, Áureo Petita e Wilson Fernandes. Mais atrás, Luiz Lobão, Gilmar Velhota e Heraldo Cacau.

Eu fazia parte dos “cabeças de bagre”. Apesar de ter jogado no juvenil do São Raimundo e ter sido campeão (e artilheiro, imagine!) pelo Holanda, no campeonato interno do Oratório – um celeiro de craques de onde saiu o centroavante Dentinho, que jogou profissionalmente na Portuguesa (SP), e o fantástico time da Tuna Luso, com Bosco, Preto Fernando, Manuel Maravilha e companhia –, minha atuação no Peladão, reconheço, era bem medíocre.

Tanto que comecei como ponta-esquerda ciscador e acabei como quarto-zagueiro carniceiro. Não fosse dono do time, acabaria como roupeiro ou massagista.

No total, inscrevemos 20 jogadores já que poderiam ser feitas até seis substituições por partida: Mário Adolfo e Erivam Cabocão (goleiros), Arizinho, Airton Caju, Almir Português, Carlito, Gilmar Velhota, Petrônio Aguiar e Fábio Costa (zagueiros), Aureo Petita, Betinho, Mazinho e Wilson Fernandes (meio-campo) e Heraldo Cacau, Gilson Cabocão, Luiz Lobão, Chico Cavalinho, Kepelé, Nilton Torres e eu (atacantes).


A nossa desabusada rainha no dia do desfile na avenida Eduardo Ribeiro

Na primeira fase, eram 336 times distribuídos em 56 chaves com seis times cada. Seriam classificados os dois primeiros times por pontos ganhos e um terceiro, por disciplina.

Caímos na chave do Rosa Com Amor, formado por homeboys da Avenida Castelo Branco, entre os quais os irmãos Nazon e Nelson – hoje casado com minha irmã Selane –, o primo deles, Marcus (irmão do Lucio Branco, do Sancol), Jones Cunha (até hoje, um grande parceiro de gandaia), Rubem Amazonas (irmão do Roberto Amazonas) e Bobô, que no ano seguinte jogaria pelo Murrinhas. Dos outros quatro times, a gente não conhecia ninguém.


O time do São Francisco realizou a suprema façanha de nos derrotar em nosso jogo de estréia no Peladão. Mas também só fez isso.

Na primeira rodada, talvez por conta do nervosismo da estréia, perdemos de 1 a zero do São Francisco, em uma partida onde eu e Chico Cavalinho perdemos, no mínimo, uns três gols feitos cada um. Uma merda! O Rosa Com Amor enfiou 4 a 1 num tal de Caveira. O São Raimundo enfiou 5 a 1 no General Glicério.

Da segunda rodada em diante, o nosso time entrou nos eixos: ganhamos do São Raimundo (2 a 1), do Caveira (3 a 1), do General Glicério (4 a zero) e empatamos com o Rosa Com Amor (1 a 1).

Como o Rosa Com Amor havia ganho três partidas e empatado duas, ele ficou em primeiro da chave e a gente, em segundo. O São Francisco se classificou por ser o mais disciplinado. Os outros times foram tomar um drink no inferno.


Apesar do nome aviadado, o Rosa Com Amor era formado por uma galera de respeito. Em pé: Rubem Amazonas (goleiro), Marcus, Evandro, Souzinha, Jaime e Sabará. Agachados: Sabazinho, Álvaro, Nazon, Bobô e Jones Cunha.

Na segunda fase, ficaram 168 times distribuídos em 42 chaves com quatro times cada. Seriam classificados apenas os dois primeiros times por pontos ganhos.

Pelo sorteio, novamente caímos na chave do Rosa Com Amor. Os outros dois times eram o Grêmio Rodoviário, formado por veteranos do time profissional da Rodoviária e do São Raimundo, e um tal de Kung Fu.

Na primeira rodada, empatamos de 2 a 2 com o Grêmio Rodoviário, enquanto o Rosa Com Amor deu de 4 a 1 no tal de Kung Fu.

Na segunda rodada, o Grêmio Rodoviário ganhou de 1 a zero do Rosa Com Amor e nós, inexplicavelmente, perdemos de 1 a zero do Kung Fu, apesar de termos dominado o jogo.

Na última rodada, o Grêmio Rodoviário ganhou de 3 a zero do Kung Fu e nós perdemos de 2 a 1 do Rosa Com Amor. Dançamos.

O Rosa Com Amor e o Grêmio Rodoviário se classificaram para a fase seguinte.

Até hoje, eu tenho uma explicação possível para o desastre da segunda fase. Sabendo que todos os atletas do Murrinhas do Egito eram biriteiros profissionais, o coordenador Messias Sampaio só marcava nossos jogos para o sábado à tarde. Tinha sido assim na primeira fase.


Os atacantes Paulo Burra Preta (o primeiro da foto) e Santarém (o terceiro) eram algumas das estrelas do Grêmio Rodoviário

Já na segunda fase, a pedido do Grêmio Rodoviário (a maioria de seus atletas trabalhava durante o sábado porque eram funcionários do DER-Am – e o campo era deles), o horário foi mudado para domingo de manhã.

Como a maioria da moçada não conseguia curar a bebedeira de sábado à noite antes do meio-dia de domingo (cortesia das infernais batidas do Caxuxa!), a gente só entrava em campo às 9h com, no máximo, nove atletas. Deu no que deu.

Na única vez em que o time jogou completo, o Grêmio Rodoviário, do ponta de lança Paulo Burra Preta e do centroavante Santarém, ambos campeões profissionais pelo São Raimundo em 1966, teve de suar sangue para empatar com a gente já quase nos descontos (o Murrinhas estava ganhando de 2 a 1, gols de Petita e Nilton).

Bom, mas como todo “boleiro” saudosista com mais de 50 anos se lembra, o Peladão daquela época era mais emocionante do que uma final de Copa do Mundo entre Brasil e Argentina. Em 1974, portanto, havia alguns times que a gente tremia só de encarar a possibilidade de enfrentá-los.


Havia o Juventude Atlética Paroquial (JAP), de São Raimundo, primeiro campeão do Peladão, em 1973, com seu futebol-solidariedade, uma tática nova que havia sido elevada à condição de arte pela seleção holandesa (como esquecer Cruijff, Neeskens e companhia?).

Havia o Torpedo, do Japiim, com o habilidoso centroavante André fazendo misérias (ele seria o artilheiro da competição, com 27 gols), e o Estrela, do Boulevard Amazonas, comandado pelo inesquecível professor Thompson (assassinado estupidamente por um ladrão vagabundo na década seguinte) e pelo arisco Torrado, irmão do Luiz Lobão.

Correndo por fora, estavam o Ponta Pelada, de militares da Aeronáutica, que na primeira fase tinha feito 30 gols e não tomado nenhum, e o Bulbol Peças, formado por ex-profissionais do Fast Clube. O campeoníssimo Arsenal, dos irmãos Gonzaga, só ficaria famoso em meados dos anos 80.

Como as chaves inicialmente obedeciam a uma distribuição geográfica, era pouco provável que o nosso time, Murrinhas do Egito, da Cachoeirinha, cruzasse com essas equipes nas fases preliminares.

Nosso medo quase pânico era enfrentar outros dois times, também da Zona Sul: o Arranca Toco, de Educandos, e o Estalo, da Colônia Oliveira Machado. Eles disputavam, cabeça com cabeça, a condição de favoritos da competição, ao lado dos outros citados anteriormente.

Verdadeiros ninhos de cobras, suas exibições eram simplesmente primorosas e atraíam torcedores dos quatro cantos da cidade. Foram os dois melhores times de pelada que já vi jogar na vida. Pelo menos, na minha época.


O brioso time do Aeromar, do cumpadi Helvécio. Em pé: Lauro Goiaba, Wolney, Manuel Ovo, Rubinho, Sadok, Orlando e Ceará. Agachados: Epitacinho, Valtinho, Beto Folha Seca, Jorge, Antídio e Rubem Moraes

A exemplo do Rosa Com Amor, dois outros times da Cachoeirinha haviam conseguido passar para a fase seguinte: o Sancol, do Cassianinho, e o Aeromar, de Antenor Caldas, um dos fundadores da famosa Banda do Mandy’s Bar.

O Sancol tinha uma zaga intransponível (o ex-goleiro profissional Pompéia e os zagueiros Petrobinha, Lucio Preto, Almir e Abreu), um meio-campo estiloso (Heraldo e Paulinho, irmão do ex-craque Horácio, do Rio Negro) e um ataque de respeito (Helder, irmão do ex-craque Wandi, do Olímpico, Gilberto, Cassianinho e Lúcio Branco, primo de Nelson e Nazon, do Rosa Com Amor).

O Aeromar era formado basicamente pelos sujeitos que fundariam o bloco Andanças de Ciganos no ano seguinte: Wolney Souza, Sadok Pirangy, Antídio Weil, Manuel Ovo, Orlando e Jorge Almeida, Epitacinho, Valtinho, Beto Folha Seca, Rubem Moraes, Sapatão, Soldado e Odivaldo Guerra. O técnico era o Helvécio, um dos melhores contadores de anedotas de português que já vi na vida.

Por causa dos dotes de nossa candidata à rainha, Messias resolveu nos colocar na “repescagem”. Eram 64 times jogando no sistema “mata-mata”, até sobrarem dois para se juntarem aos trinta que seriam classificados pelo sistema normal.


Auto-intitulado "o papão de Flores", o Central Park não foi páreo para o Murrinhas

No primeiro jogo da "repescagem", vencemos o Central Park por 3 a zero (dois gols do Nilton e um do Wilson Fernandes), num jogo à noite, no campo do Bancrévea, em que pela primeira vez ficaram cara a cara a Silene e a candidata Irecê, do Central Park, de Flores, uma pantera de 18 anos e um corpo de enlouquecer celibatário.


O supersônico de Flores chamado Irecê, candidata do Central Park, a quem dediquei vários cultos a Onan

No nosso segundo jogo, fomos surpreendidos pelo jogo catimbado e muquirana do enjoado JARA, da Alvorada, e perdemos de 1 a zero, por conta de um pênalti inexistente marcado pelo juiz. Fomos eliminados bisonhamente.

O pior é que os nossos outros parceiros não tinham tido melhor sorte. O Rosa Com Amor havia perdido de 2 a 1 para um novo bicho-papão chamado Divisão de Equipamentos e Oficinas (DEO) na quarta fase e, logo em seguida, perdeu de 1 a zero do Colorado, na primeira rodada da "repescagem". Estava fora.


O afetadíssimo juiz Ademar Silva, que se achava as pregas da Odete

O Aeromar também havia perdido de 3 a 2 do mesmo DEO, em uma das melhores partidas do campeonato. O time do Helvécio saiu na frente e fez logo 2 a zero, com dois gols de Rubem Moraes.

No começo do segundo tempo, o centroavante Somé, do DEO, fez um gol faltoso de cabeça, depois de empurrar escandalosamente o goleiro do Aeromar e tirá-lo da jogada.

Os jogadores do Aeromar protestaram. Discutem daqui, discutem dali, empurra daqui, empurra de lá, surge um começo de briga, entra em campo a turma do "deixa disso".

O juiz expulsa o zagueiro Ademir, do Aeromar.

Quinze minutos depois, a confusão continua. Puto da vida, o artilheiro Jorge Almeida saiu de campo, achando que a partida ia ser suspensa, trocou de roupa e foi embora.

Pra completar, o Aeromar já havia feito as seis substituições a que tinha direito (e o DEO, idem).

O polêmico juiz Ademar Silva, celebrizado como o “Armandinho Marques do Peladão”, mandou o jogo continuar.

Com apenas nove jogadores em campo e os nervos à flor da pele, o Aeromar foi envolvido pela correria desenfreada do DEO, levou mais dois gols (Moreno e Somé) e deu adeus à competição.


Lucio Preto, Petrobinha e o goleiro Pompéia, do Sancol, enfrentando os aloprados atacantes do Estalo

Somente o Sancol estava dando conta do recado, derrotando quem cruzasse com ele pela frente. No mesmo dia em que o Aeromar foi derrotado, o Sancol enfrentava o Estalo, dando início a uma das maiores rivalidades do campeonato de peladas.

O atacante Lucio Branco fez 1 a zero pro Sancol e Roberto Branco empatou pro Estalo. Gilberto fez 2 a 1 pro Sancol. Roberto Branco empatou o jogo novamente. Quase terminando a partida, Isaac Benayon fez 3 a 2 pro Estalo.

O time do Sancol protestou porque um jogador do Estalo havia entrado em campo com uma camisa diferente do resto do equipamento do time e, ainda por cima, sem numeração. O jogo foi anulado. O Estalo, claro, ficou puto da vida, mas não teve jeito.

O novo jogo foi marcado para o dia seguinte, uma noite de segunda-feira, no campo do Bancrévea. Dessa vez, o Sancol não tomou conhecimento do time da Colônia e ganhou de 3 a 1, num jogo de muita catimba e violência, que por muito pouco não descambou para uma briga generalizada. O Estalo também estava fora da competição.

Resolvi apelar. Procurei o Messias Sampaio e cantei a pedra: “Se nosso time ficar de fora da fase final da competição, minha irmã também sai do concurso de rainhas!”




Favoritas disparadas, Silene e Irecê dividiam os corações e as mentes (sujas) dos torcedores

Messias ficou pálido. Aquilo era uma tragédia. Havia uma única candidata capaz de ofuscar a beleza da Silene: a graciosa Irecê, do Central Park. Confesso que, nas internas, eu torcia secretamente pela candidata do time de Flores.

Messias foi contar a “boa nova” para Umberto Calderaro. Quase perdeu o pescoço. O jornal apostava no confronto entre as duas beldades para esgotar as edições dominicais e a tática estava surtindo efeito.

Como é que, de uma hora pra outra, os leitores do jornal e os milhares de torcedores do Peladão iriam encarar aquela desistência intempestiva de uma das favoritas? Messias que desse um jeito, esbravejou Calderaro.

O coordenador criou, então, a “repescagem da repescagem”, que no regulamento original não existia e foi batizada de chave “Pelo Amor de Deus”.

Eram 32 times divididos em 8 chaves de quatro, disputando uma única vaga, no sistema “mata-mata”.

Quatro times se pegavam de manhã cedo, em jogos de 30 minutos. O campeão enfrentava o campeão de outra chave à noite, em tempo normal. Os vencedores dessas partidas continuariam se pegando no dia seguinte até sobrar apenas um campeão.

Essa chave dos “desesperados” teria que ser concluída em uma semana para não atrasar o resto da competição.


Formado por oficiais da Base Aérea, o Ponta Pelada era uma máquina de fazer gols

Na rodada das oitavas de finais, quando sobrariam apenas oito times, o Estrela ganhou de 4 a zero do Fast, o Sancol ganhou de 4 a 3 do Ponta Pelada (um jogo de arrepiar, emocionante do começo ao fim e dentro do campo da Base Aérea!), o Vasquinho ganhou de 4 a 3 do Grêmio Amazonas, o Bulbol ganhou de 3 a 1 do Torpedo.

Nas outras partidas, o Vasco ganhou de 3 a 2 do Rener, o Colorado ganhou de 3 a 1 do Castelinho e o DEO ganhou de 3 a zero do JARA. O Polônia, do ex-craque Mário Motorzinho, ficou de folga para decidir a última vaga com o campeão da chave “Pelo Amor de Deus”.


O ex-craque do Nacional, Mário Motorzinho, que nos anos 60 fazia dupla com Rolinha, era o cérebro do Polônia

Os oitos times desclassificados (Fast, Ponta Pelada, Rener, Torpedo, JARA, etc) também foram incluídos às pressas na chave dos “desesperados”.

E para evitar uma nova chantagem de minha parte, os jogos foram marcados para só começar depois da grande final do concurso de rainhas, que rolaria no dia 21 de dezembro, sábado, no anfiteatro do balneário Parque Dez.

A odisséia do Murrinhas do Egito no 2º Peladão - 1974 (Final)


Irecê (no centro) e Silene (primeira à direita): a batalha final

Na segunda-feira da semana da grande final, a Silene amanheceu se queixando de umas estranhas manchas vermelhas na pele. No dia seguinte, as manchas evoluíram rapidamente para pústulas horrorosas.

A sacana havia contraído catapora. Dá pra imaginar uma desgraceira maior?

As benzedeiras, mães de santo e médicos mais chegados (incluindo o Dr. Sebastião, que morava em frente de casa) desenvolveram todo tipo de ungüentos, pomadas, simpatias e banhos de descarrego, para contornar o problema, sem resultados.

Silene resolveu encarar o desfile daquele jeito. O Salão de Beleza da Joelma que desse os seus pinotes para disfarçar as intempéries.

Portando bandeiras, faixas de pano, caixas de foguetes e dezenas de litros de batida do Caxuxa, os moradores da Cachoeirinha lotaram o anfiteatro do Parque Dez , para torcer pela Silene. O pessoal de Flores fez o mesmo, para torcer pela Irecê.

Quando, depois do desfile das candidatas, o apresentador anunciou a Silene como primeira Rainha do Peladão, a galera explodiu de alegria. O vereador Fábio Lucena fez a saudação da nova rainha em nome do jornal A Crítica. A Miss Amazonas, Suzana Pires, fez a entrega da faixa.




Minha primeira reação foi correr para confortar a Irecê, que chorava copiosamente com o desmoralizante segundo lugar – ainda mais perdendo para uma rainha com visíveis marcas de catapora pela pele.

As pernas não obedeceram. Foi quando percebi que não devia ter tomado tanta batida de tamarindo do Caxuxa. Eu estava a um passo de entrar em coma alcoólica.

Voltamos para o bairro em carreata, onde a celebração virou uma zorra infernal, quase um carnaval fora de época. A Cachoeirinha em peso estava comemorando a vitória.

O Murrinhas do Egito já tinha cumprido metade da tarefa a que se propunha (ganhar os dois títulos em disputa). O resto era com nossos talentosos craques de futebol.

Numa quarta-feira pela manhã, Dia de Natal, no campo da Coca Cola, quando começou oficialmente a disputa da chave “Pelo Amor de Deus”, nossos piores pesadelos se concretizaram.

Na nossa chave estavam Estalo, Arranca Toco e Bancrévea. A gente ia enfrentar o Estalo, depois jogariam Arranca Toco e Bancrévea. A chave seria decidida entre os vencedores das duas partidas.


O timaço do Arranca Toco. Em pé, da esquerda pra direita, o radialista Waldir Corrêa é o terceiro, e Enedino Major, o quarto. Agachados, Folhinha abraçando João Cará (sentado sobre a bola), uma dupla infernal que aterrorizava os zagueiros adversários

Meu brother Enedino, o famoso “Major”, volante do Arranca Toco (e com quem eu trabalharia seis anos depois na Philco), explicou porque haviam sido desclassificados no “mata-mata” da fase normal da competição.

A Comissão do Peladão marcou o jogo pra domingo de manhã. Todo mundo cheio de mé, só apareceram oito para jogar. Levaram de um a zero, do Rener. Comecei a acreditar que aquela era a chave dos “cachaceiros”.

Pra mim, foi um dia inesquecível. No primeiro jogo (dois tempos corridos de quinze minutos), o Estalo fez um gol no início da partida (num vacilo do Petrônio Aguiar, que escorregou na hora de isolar a bola) e foi todo pra defesa.

Os sacanas chutavam a bola pro matagal ao lado do campo, onde funcionava uma pista de motocross, a gente levava uma eternidade tentando encontrar a bola para reiniciar o jogo e o tempo correndo.

Faltando pouco mais de um minuto pra terminar a partida, eles cometeram uma falta na lateral esquerda do campo, nas proximidades da grande área.

Capitão da equipe, eu mandei todo mundo ir pra dentro da área (inclusive o goleiro Mário Adolfo), que eu ia meter um “chuveirinho” e fosse o que Deus quisesse.

Se o Estalo armasse um contra-ataque e metesse a bola no gol vazio, era o de menos. A gente já ia ficar de fora mesmo.


O brilhante time do Estalo quis fazer graça e acabou pagando caro pela gaiatice

Áureo Petita enrolou a beira do calção (toda vez que estava nervoso, ele fazia esse gesto), posicionou a bola no local apontado pelo juiz e falou pra mim:

– Presidente, deixa comigo, que eu vou colocar essa bola na cabeça do Luiz Lobão!

Concordei e fui lá pro meio do “bolo”. No mínimo, com os meus 1,78 cm e 80 quilos (é, já fui mais magro), eu ajudaria a atrapalhar a visão do goleiro.

Aí, o filho da puta do Áureo, em vez de levantar a bola na área como a gente havia combinado, meteu uma trivela de três dedos por cima da barreira.

A bola fez uma curva e se alojou no ângulo direito do goleiro Akel, que ficou parado embaixo da trave. Simplesmente uma pintura. Petita acabara de fazer um gol de placa histórico.

Nos pênaltis, Mário Adolfo defendeu duas cobranças e despachamos o Estalo, time do meu querido professor Bar, com que eu também trabalharia na Philco na década seguinte.

No segundo jogo, o Arranca Toco meteu 2 a zero no Bancrévea (gols de Lindemberg e Osmar) no primeiro tempo e passou o segundo tempo apenas tocando a bola de pé em pé, se poupando visivelmente para a partida decisiva contra o nosso time. O toque de bola dos filhos da puta era de encher os olhos.

Para enfrentar aquele toque de bola infernal, armei a única tática possível: nada de o nosso time ir pro ataque. Iríamos ficar o tempo todo na defesa e, toda bola que a gente tomasse teria que ser isolada no matagal.

Era um anti-jogo, evidentemente. E daí? O poderoso Estalo quase nos tirara da competição fazendo aquela mesma papagaiada. Íamos nos envergonhar de que?...

Dito e feito. Enfrentamos a pressão absoluta do Arranca Toco durante meia hora, com o nosso time inteiro (e o deles) dentro do nosso campo, chutando a bola para o matagal e o Mário Adolfo fazendo milagres embaixo do gol.

Arrancamos um heróico zero a zero. Nos pênaltis, Mário Adolfo defendeu uma bola e despachou o timaço do Arranca Toco.


Tuna Luso: Bosco, de cabelo black power, é o quinto dos que estão em pé, enquanto Preto Fernando, hoje treinador do Zaire, é o último. Entre os agachados, o fabuloso colored Manuel Maravilha, um cracaço

Na noite do dia seguinte, no campo do Bancrévea, enfrentamos a Tuna Luso, dos meus brothers e ex-companheiros de ETFA: o atacante Bosco, hoje dono do restaurante “Três Porquinhos”, e o lateral esquerdo Preto Fernando, atualmente professor do Cefet.

Pra chegar até ali, a Tuna havia derrotado o Banik e depois o JAP, que tinha como credenciais ter sido campeão da competição em 73 e campeão do torneio início de 74. Quer dizer, a Tuna não era nenhum time de manés.

Foi um jogo catimbado, do começo ao fim. No primeiro tempo, zero a zero. No começo do segundo tempo, o Bosco fez um gol de cabeça usando a mão. Todo mundo viu. Quer dizer, todo mundo não. O juiz validou o gol.

Foi uma confusão do cacete. Quando os ânimos se acalmaram, depois de uns dez minutos, a gente só estava com nove: Luiz Lobão e Nilton haviam sido expulsos.

Em vez de ir pra cima e resolver logo a parada, o time da Tuna se acovardou e foi todo pra defesa, esperar o tempo passar. Foi o erro deles.

Faltando uns cinco minutos, o Áureo Petita driblou três marcadores e serviu de bandeja ao Wilson Fernandes, que driblou o goleiro e entrou com bola e tudo. A partida estava empatada.

Na decisão por pênaltis, Mário Adolfo defendeu uma cobrança e nós ganhamos do time do Bosco de 5 a 4.

Nosso próximo jogo seria no domingo de manhã, dia 29 de dezembro, no campo do Oratório. Iríamos jogar contra o Juventus, da Aparecida, uma outra pedreira.

Eles tinham sido campeões de uma outra chave onde também só havia timaços: Castelinho, Grêmio Amazonense, Rener e Fast, entre outros.

O vencedor desse jogo enfrentaria na mesma tarde o Areal, time de meu brother Mário Gordinho, no campo da Coca Cola. Quem vencesse disputaria a oitava vaga com o Polônia.

Graças ao talento de Mário Gordinho e Ironilson, o Areal já havia detonado vários bichos-papões, porque caíra no grupo mais difícil da chave “Pelo Amor de Deus”.

Aeromar, Torpedo, Ponta Pelada, JARA, Academia, Grêmio Rodoviário, todos eles haviam sido despachados pelo valente time de Santa Luzia.

O Juventus nos pegou em um dia em que nada dava certo. Além de a gente perder gols incríveis, o Mário Adolfo engoliu alguns “frangos” memoráveis. Com menos de meia hora de jogo, a gente já estava perdendo de 3 a zero.

No segundo tempo, o massacre continuou, mesmo com Erivam entrando no lugar do Mário Adolfo, que reconheceu não estar em um de seus melhores dias.

Somente com a entrada de Kepelé nos 15 minutos finais, quando eles já nos ganhavam de 4 a 1, foi que a gente esboçou uma pequena reação. Mas não deu.

O Juventus nos ganhou de 5 a 3, mas infelizmente cometeu um erro primário. Fez sete substituições, quando o máximo permitido era seis.


O velho Simão e Diego Casado, filho da Silene: torcedor dos Murrinhas desde épocas imemoriais

Quem notou a presepada foi meu pai, o velho Simão, um torcedor fervoroso – e briguento! – dos Murrinhas.

Os advogados Vilson Benayon e Oásis Trindade, irmão do Olíbio Xiri, foram imediatamente denunciar a fraude na coordenação do Peladão. Ganhamos os pontos no tapetão.

À tarde, quando nos preparávamos para enfrentar o Areal no campo da Coca Cola, o Juventus e centenas de moradores da Aparecida apareceram no local e não deixaram o jogo acontecer. A partida foi suspensa.

No segundo julgamento, foi confirmada de novo a nossa vitória no tapetão. O jogo Murrinhas e Areal foi marcado para a manhã de uma quinta-feira, dia 2 de janeiro, no campo da Coca Cola.


O advogado Vilson Benayon encostando Messias Sampaio na parede. De pantalona e bolsa a tiracolo, o inesquecível Wilson Fernandes

Dessa vez, não houve apelação. Em um jogo muito disputado, mas sem catimba ou violência, o Areal nos ganhou de 2 a 1.

Naquela mesma noite, o Polônia derrotou o Areal por 1 a zero, mas o jogo foi anulado.

No novo jogo, na noite seguinte, o Areal enfiou 5 a 1 no Polônia (3 gols de Ironilson e 2 de Mário Gordinho) e conquistou o direito de ficar entre os oito melhores times da competição. Ou seja, o Murrinhas quase chegou lá.

Nas quartas de final, o Estrela derrotou o Colorado por 2 a zero. O Vasquinho empatou com o Vasco (um genérico do JAP) em 1 a 1, mas ganhou a vaga nos pênaltis.

O Areal ganhou do famigerado DEO de 2 a zero (dois golaços do Mário Gordinho).

O Bulbol empatou com o Sancol em 1 a 1. Como o campo já estava no escuro, não pôde haver disputa de pênaltis. Os capitães do time, em comum acordo com a coordenação do Peladão, resolveram fazer um novo jogo no dia seguinte. O Sancol perdeu de 2 a 1.


O Bulbol era formado basicamente pelos ex-profissionais do Fast Clube, que havia sido campeão amazonense em 1971: Marialvo, Pedro Hamilton, Casemiro, Edinho, Sé, Antonio Piola, Edson Piola, Cláudio, Santos, Paulo e Zezinho Bulbol. O ex-goleiro Marialvo jogava na linha. Quem fechava o gol do time era o goleiro Alfredo.


O Estrela também tinha alguns ex-profissionais como Paulinho (ex-ponta esquerda do Rio Negro), Torrado (ex-centroavante do América), Esquerdinha (ex-ponta esquerda do Nacional), Rubens (ex-volante do Rio Negro) e Tocaia (ex-quarto zagueiro do Olímpico), mas sua grande estrela era o grandalhão Thompson, vice-artilheiro do campeonato com 26 gols. O técnico era o Amaury, goleiro profissional do América.

Estava na cara que a final seria entre os dois times.


O Vasquinho tinha bons craques como Tadeuzinho, Eurico e Lelé, mas faltou um pouco mais de malícia, experiência e picardia para ser campeão

A exemplo do Murrinhas, o Areal e o Vasquinho eram formados basicamente por moleques vindos dos campos de várzea. Eles não seriam páreos para ex-profissionais tarimbados, muito deles ainda em plena forma física como os irmãos Edson e Antonio Piola.

Os dois jogos da semifinal foram realizados no Parque Amazonense. No primeiro jogo, o Estrela ganhou do Vasquinho de 2 a zero (gols de Paulinho e Torrado), mostrando um futebol burocrático e pouco criativo, que não empolgou ninguém.


Mario Gordinho, ainda louro, comemora o 1º gol do Areal contra o Bulbol. Depois, São Pedro resolveu estragar a festa dos moleques.

No segundo jogo, o Areal surpreendeu o Bulbol, quase enlouquecendo os velhinhos com seu apurado toque de bola e rapidez nas conclusões.

Fez 1 a zero (gol de Zé Carlos, passe de Mário Gordinho), carimbou a trave duas vezes, o goleiro Alfredo, do Bulbol, fez uma defesa inacreditável para evitar o segundo gol, enfim, o Areal estava dominando a partida e desenhando uma sonora goleada.

De repente, não mais que de repente, começou a cair um aguaceiro infernal, que não parou mais. Era uma chuva torrencial, dessas típicas do inverno amazonense.

Com o campo completamente encharcado, onde o que conta é a força física e não o toque de bola, os meninos de Santa Luzia se viram em apuros.

Dotado de um dos chutes mais fortes e precisos da história do futebol amazonense, Antonio Piola foi o verdadeiro artífice daquela virada.

Toda bola que ele pegava, em que parte do campo estivesse, o sacana levantava a esférica, metia um tirambaço, e mandava de “chuveirinho” para a área do Areal (naquela época, as bolas de couro encharcavam e ficavam pesando uns cinco quilos). Não deu outra.

O centroavante Santos fez 3 gols de cabeça, enquanto Marialvo e Zezinho Bulbol completaram a goleada de 5 a 1.

Foi uma grande injustiça. Em campo seco, dificilmente o Bulbol teria derrotado o Areal. Mas isso faz parte da vida.


A decisão do campeonato aconteceu no campo do General Osório (atual Colégio Militar de Manaus). O chute inicial foi dado pela Silene, vestida com o equipamento do Murrinhas do Egito, marrelógico.

Na disputa pelo terceiro lugar, os garotos do Vasquinho ganharam de 2 a 1 dos garotos do Areal, num jogo bastante pegado, mas sem violência.

Na grande final, o Estrela fez 2 a zero, mas o Bulbol tanto pressionou que acabou empatando o jogo. A partida ficou eletrizante, com os dois times partindo decisivamente pro ataque.

Quase no fim da partida, numa bobeada do zagueiro Pedro Hamilton, o centroavante Thompson fez o gol da vitória e garantiu o título para o time do Boulevard Amazonas.

Ainda no primeiro tempo, Paulo (Bulbol) e Torrado (Estrela) foram expulsos por trocarem amabilidades sobre as respectivas genitoras.



Na sequência, o nosso meia-armador Áureo Petita foi escolhido o craque do ano e na seleção do Peladão, além do Áureo, também estavam meus brothers Bosco (Tuna), Mário Gordinho (Areal), Orlando (Aeromar) e Gilberto (Sancol).


Seleção do Peladão: Tom (Areal), Orlando (Aeromar) e Bosco (Tuna)



A coordenação do Peladão garantiu que os 16 times melhores colocados seriam premiados com uma bola Drible e um jogo de camisas. Pela nossa contagem, a gente havia terminado atrás do Polônia e, portanto, ficaríamos em 10º lugar (o Polônia, que perdera a oitava vaga, pela lógica seria o 9º).


Áureo Petita, primeiro craque de Peladão e meu parceiro de birita até hoje

Ocorre que a coordenação preferiu levar em conta a campanha dos times antes de participarem da chave “Pelo Amor de Deus”. Acabamos no 20º lugar. Os advogados Vilson Benayon e Oásis Trindade ainda se escalaram para a gente virar a mesa no “tapetão”.

Achei melhor não. Para um time de biriteiros contumazes em seu primeiro ano de campeonato, a gente já tinha dado um passo maior do que a perna. Era melhor deixar a poeira baixar e se preparar para o próximo ano.

Bons tempos, zifio, bons tempos! E quem quiser que conte outra.