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segunda-feira, outubro 11, 2010

O terror dos garçons

Renato Pitanga dando uma aula sobre direitos civis para Almir Graça e Cassiá Mié, durante uma noitada no Bar do Armando

Setembro de 2000. Conhecido pelo seu apego exagerado aos direitos previstos na Cartilha do Consumidor, o publicitário Renato Pitanga havia acabado de produzir o último programa radiofônico do prefeito Angelus Figueira, candidato à reeleição em Manacapuru, quando resolveu levar sua equipe de trabalho para um almoço comemorativo antecipado.

Era um domingo, por volta das três horas da tarde, e o único restaurante aberto na cidade era o Rodoviário. A turma entrou no restaurante, ocupou duas mesas e Renato Pitanga chamou o garçom:

– Vocês têm filé?

– Temos sim, patrão. Temos filé com fritas, filé à parmegiana, filé à Chautebriand, filé a cavalo, filé ao molho madeira e filé à cubana! – explicou o rapaz.

– Como a gente está com pressa, não vamos pedir pratos diferenciados. Você me vê oito filés com fritas mal passados e oito Coca-Cola com gelo!

Dali a dois minutos, o garçom começou a colocar os refrigerantes sobre a mesa. O temperamental Pitanga estrilou:

– Cadê o gelo?

– Olha, patrão, o nosso gelo acabou. Mas a Coca-Cola está supergelada! – explicou timidamente o garçom.

O resto da equipe (Marcos Figueira, Denise, Carlinhos, Paulão, Denisia etc.), que já bebia afoitamente os refrigerantes, confirmou a afirmativa do garçom. Pitanga nem aí:

– Porra, meu, se eu pedi com gelo é porque só bebo Coca-Cola com gelo. Leva essa merda daqui e me traz um copo de água natural...

– Com gás ou sem gás? – insistiu o garçom.

– Natural, porra, natural! – vociferou Pitanga.

O garçom retirou um dos refrigerantes da mesa, foi até a cozinha e retornou com um copo de água mineral. Pitanga abriu o copo, deu uma golada e começou a ficar puto:

– Escuta aqui, bicho, você está querendo curtir com a minha cara? A porra dessa água não está nem fria...

– É que o senhor pediu água natural! – explicou o garçom.

– Porra, bicho, natural, pra mim, é qualquer água que não recebeu gás carbônico. A água é natural porque veio diretamente da fonte... – ensinou o publicitário. “Leva essa merda daqui e traz uma água natural estupidamente gelada...”.

– Pois pra mim e pra todo mundo que mora em Manacapuru, água natural é qualquer água que ainda não foi gelada, qualquer água que ainda esteja na temperatura ambiente! – devolveu o garçom, também já ficando puto com aquele cliente superexigente, enquanto recolhia o copo de água da mesa.

De repente, o celular do publicitário tocou. Enquanto ele saía da mesa para atender o telefonema, o garçom começou a servir os filés com fritas. O resto da equipe (Marcos Figueira, Denise, Carlinhos, Paulão, Denísia etc.) avançou nos pratos com uma fome de anteontem.

Alguns minutos depois, Renato Pitanga retornou à mesa. Assim que mastigou o primeiro pedaço de carne, deu um berro para a equipe:

– Podem parar de comer!

Seus famélicos funcionários – alguns com o prato já devorado pela metade! – obedeceram. Em pé, ali perto, observando a comilança, o garçom não entendeu nada. Ele foi chamado às falas pelo temperamental publicitário.

– Porra, meu, isso aqui não é filé nem aqui nem na China, porque filé eu conheço!

– É verdade, patrão, isso aí não é filé não. Como o filé acabou, nós fizemos os pratos com alcatra maturada e só vamos cobrar a metade do preço. Mas a alcatra maturada está tão macia quanto o filé... – explicou amigavelmente o garçom.

O resto da equipe (Marcos Figueira, Denise, Carlinhos, Paulão, Denísia etc.), que estava achando a comida deliciosa, confirmou a afirmativa do garçom. Pitanga nem aí:

– Porra, bicho, eu não pedi desconto de vocês. Aliás, eu não perguntei nem o preço de cada prato. O que eu pedi foi filé! Se não tinha filé, você devia me informar para eu pedir outra coisa. Essa merda eu não quero!

Aí, se virando para o resto da equipe, determinou:

– Vamos embora, pessoal, que eu não vou pagar por essa porra! Pra cima de mim, não!

Diante de um garçom estarrecido pelo enorme prejuízo, eles abandonaram o restaurante. Rodaram o resto da tarde em busca de um restaurante aberto. Nada.

Terminaram de almoçar no único “pé sujo” ainda aberto na cidade, na região do cais do porto, devorando sanduíches de mortadela com Tampico de laranja.

Mas a reputação de consumidor exigente do Renato Pitanga foi preservada.

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