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segunda-feira, junho 20, 2011

Aula 41 do Curso Intensivo de Rock: Soft Machine e ELP


A saga do Soft Machine iniciou-se por volta de 1961, ao redor da Simon Langton School, em Canterbury, no norte da Inglaterra.

Lá, um grupo de estudantes das mais diversas áreas costumava reunir-se nos fins de semana para ouvir as novidades do jazz (Coltrane, Mingus, Coleman) e discutir suas predileções nos campos das artes plásticas (Jackson PoIlock, Mark Rothko), literatura (todos os beats) e música contemporânea (Stockhausen e Luigi Nono principalmente).

Entre os papos, a turma tocava informalmente, dando o nome de Wilde Flowers à flutuante formação que, segundo a lenda, mudava a cada semana.

Entre os mais assíduos dessas jams estavam Mike Ratledge (teclados), Robert Wyatt (bateria, voz) e Kevin Ayers (baixo, voz).

Certa noite, um amigo os apresentaria ao guitarrista Daevid Allen, um freak australiano que por sua vez os iniciou na técnica dos tape-loops (que ele desenvolvera originalmente com o então desconhecido Terry Riley) e no uso do LSD.

A idéia de formar um novo grupo, que daria forma ao Soft Machine, partiu de um encontro bastante curioso de Daevid Allen e Kevin Ayers com um milionário texano chamado Wes Brunson, em Mallorca, na Espanha.

Brunson concordou em financiar uma nova banda, o que permitiu aos jovens comprarem novos instrumentos e alugar um lugar em Canterbury para os ensaios, e, em troca disso, o excêntrico milionário receberia uma porcentagem das bilheterias dos futuros shows, dinheiro este que ele nunca viu.

O milionário texano, aliás, acabaria morrendo em uma situação tragicômica: durante suas férias na Espanha, ele tentava pular na frente de carros e caminhões para obrigá-los a parar, até que um dia a brincadeira não deu certo.

Em agosto de 1966, sob o nome de Soft Machine, inspirado em um livro homônimo do escritor William Burroughs, nascia o novo grupo com Kevin (baixo e voz), Daevid (guitarra e voz), Robert Wyatt (bateria e voz) e Mike Ratledge (teclados).

Eles ainda recrutaram o guitarrista Larry Nolan, mas apenas para as apresentações ao vivo.


Em 17 de fevereiro de 1967 o grupo lançou seu primeiro single, com as canções “Love Makes Sweet Music” e “Feelin’ Reelin’ Squeelin’” (que teve a participação de Jimi Hendrix), pela Polydor.

Três meses depois gravaram algumas demos com produção de Giorgio Gomelsky, que ficaram escondidas por vários anos.

Entre outras, gravaram as seguintes canções: “That’s How Much I Need You”, “Save Yourself”, “I Should’ve Known”, “Jet Propelled Phonograph”, “When I Don’t Want You”, “Memories”, “You Don’t Remember”, “She’s Gone” e “I’d Rather Be With You”, que foram lançadas pela Byg Records em 1971.

Como quarteto – e ocasional quinteto –, o Soft Machine começou a fazer vários shows em Londres, bem no início do psicodelismo.

Acontecia então os dias da Swingin’ London e o Soft era figurinha fácil em clubes como UFO e Roundhouse, onde dividiam o palco com o Pink Floyd, liderados pelo então alucinado Syd Barrett, que reza a lenda, virou grande amigo do igualmente doido Daevid Allen.

Foi vendo Syd tocar que Allen inventou a técnica do glissando em sua guitarra, que consiste em tocar o instrumento com uma pequena barra de ferro no lugar do slide, reproduzindo o som de cítara.

Os shows eram verdadeiras viagens, com adições de luzes, levadas de bateria e climas lentos e hipnóticos e o grupo improvisando no palco por horas e horas.

O show mais memorável deles aconteceu no dia 29 de abril, quando tomaram parte de um evento organizado pelo jornal underground International Times, batizado de 14 Hour Technicolor Dream, tocando ao lado do Floyd.

Foi durante uma viagem para St. Tropez, na França, que aconteceu um incidente que marcaria a formação do grupo.

Daevid Allen, australiano de nascimento, teve seu visto de entrada negado quando tentou voltar à Inglaterra, por ter trabalhado ilegalmente no país.

Daevid acabou optando por permanecer na França, onde montaria tempos depois, o Gong.

O restante do grupo resolveu seguir apenas como trio.


Em fevereiro de 1968, embarcam em uma turnê de três meses pela América, abrindo para ninguém menos do que The Jimi Hendrix Experience, mas sem serem citados nos pôsteres da época.

Aproveitam a viagem para a América e gravam seu primeiro disco, em Nova York, com a produção dividida entre Tom Wilson (que já havia trabalhado em alguns discos de Bob Dylan) e Chas Chandler (ex-baixista dos Animals e produtor dos dois primeiros discos de Jimi Hendrix).

O disco foi feito em apenas quatro dias com todas as canções sendo registradas em pouco takes e não teve uma grande qualidade de som.

Assim, nascia “The Soft Machine”, um disco que mostraria suas qualidades em pouco tempo e a grande criatividade do trio restante.

No final de abril o grupo volta para Londres e em maio conseguem um novo guitarrista: Andy Summers, que no futuro ficaria famoso ao tocar no trio The Police.

Summers já havia tocado nos grupos Zoot Money’s Big Roll Band, Dantalian’s Chariot e até no Animals, de Eric Burdon, e foi recrutado para a segunda parte da turnê norte-americana durante os meses de julho até setembro.

Mas as tensões internas eram enormes e Summers nem chegou a terminar a excursão.

Ao final da turnê, Wyatt resolveu ficar em Nova York para trabalhar com Hendrix, enquanto Ratledge e Ayers voltaram para a Ingalterra.

Em dezembro, o baterista foi contatado pela Probe, que havia lançado o primeiro disco para tentar promover algumas apresentações da banda.

Como Ayers não foi encontrado, a saída foi chamar Hugh Hopper, que acabara de vender seu baixo, a entrar no grupo.

Mike topou voltar ao Soft Machine e eles passaram um mês ensaiando na casa do baterista, em West Dulwich.


Em fevereiro de 1969 fazem uma estréia grandiosa, no Royal Albert Hall, poucos dias antes de entrarem em estúdio para a gravação de um segundo disco.

Convidam para as gravações e apresentações Brian Hopper, irmão de Hugh, para tocar sax tenor.

Aos poucos, o grupo vai evoluindo em direção ao jazz e a um som mais elaborado, que acabaria fazendo da banda o principal expoente do “Canterbury Sound”, que teria outros importantes representantes como o Caravan, Gong, Hatfield & The North e National Health, entre outros.

Um show histórico dessa fase aconteceu no dia 27 de março, no London 100 Club, quando receberam o convite de Syd Barrett, que queria a participação do trio em seu disco-solo, “The Madcap Laughs”.

Em abril é lançado “Volume Two”, o segundo disco do grupo e logo após o lançamento, ganham outros integrantes, com a adição de músicos do grupo do pianista Keith Tippett: Elton Dean (sax alto), Marc Charig (trompete), Nick Evans (trombone), além de Lyn Dobson (sax e flautas).

Assim, o grupo era agora um septeto, ainda que por poucas semanas, e dessa maneira gravaram um programa na BBC e fizeram shows na França, no final do ano.

O Soft Machine começou a ganhar fama no circuito europeu de jazz e fizeram dezenas de shows na Inglaterra, Bélgica, Holanda e França.

Em dezembro é lançado o primeiro disco solo de Kevin Ayers, Joy Of A Toy, com participações de Wyatt, Mike e Hugh, juntos, nas faixas “Joy Of A Toy Continued” e “Songs For Insane Times”.

Nessa primeira fase – que se estendeu até 1969 –, as composições do grupo estavam banhadas de vibrações ácidas, introduzindo um clima burlesco salpicado de citações dada no sisudo universo sonoro britânico.

Musicalmente, tais temas escancarariam de vez as fronteiras existentes entre o jazz e o rock, além de – ousadia maior – privilegiar os timbres de teclados, em pleno reinado da guitarra elétrica.

Em 3 de janeiro de 1970 é lançado o primeiro disco-solo de Syd Barrett, “Madcap Laughs”, com participação do trio Hopper-Wyatt-Ratledge na faixa “Love You”.

No dia seguinte, o quinteto Elton Dean, Lyn Dobson, Hugh Hopper, Mike Ratledge, Robert Wyatt, toca em Fairfield Hall, em Croydon, e algumas dessas partes seriam usadas no novo disco do grupo.


Seria o nascimento da grande obra-prima do Soft Machine e um dos mais importantes discos do gênero que passaria a ser conhecido como rock progressivo: o álbum duplo “Third”.

Vale lembrar que, no mesmo ano de 1970, Miles Davis gravaria “Bitches Brew”.

No trabalho em questão, o quarteto original foi reforçado por uma excepcional seção de metais: Nick Evans (trombone), Lyn Dobson (flauta, sax) e o veterano Jimmy Hastings (clarineta, flauta), mais o violino de Rob Spall.

O LP “Third” dividiu-se em quatro faixas, cada uma ocupando o lado inteiro de um disco.

Eram temas complexos, altamente improvisados, que fluíam às custas do virtuosismo dos músicos.

Frases e linhas pessoais independentes umas das outras, mas que em momentos-chave se coagulavam em núcleos de puro êxtase.

Jazz, nova música ou o quê?

A beleza atemporal de “Third” conseguiu desafiar os rótulos fáceis.

A verdade é que “Facelift”, “Slightly All The Time” e “Out-Bloody-Rageous” e, principalmente, a insana fantasia de “Moon In June” permaneceram à parte de tudo que foi criado no período.

Um vórtice de colagens radiantes, breaks violentos, espasmos, fugas de órgão, clusters de sax e devastações rítmicas que confluíam para um incandescente oceano sônico de basalto e lava vulcânica.

Ao lado de “Ummagumma”, de Pink FIoyd e “In The Court Of The Crimson King”, do King Crimson, “Third” foi à derradeira pá de cal despejada sobre o esquife dos Beatles.

A partir dele, nomes já esquecidos, como Henry Cow, Faust, Matching Mole, Caravan, Centipede, Gong e Hatfield and the North realizaram apaixonantes exercícios no gênero, sem encontrar, todavia, a coesão e o impacto dos modelos originais.


Ainda em 1970, Wyatt começa uma interessante carreira-solo paralela ao grupo, lançando “The End Of An Ear”.

O baterista era o único que queria cantar no grupo, mas como Soft Machine havia se tornado apenas instrumental, Robert fez um disco em que havia várias referências ao pessoal de Canterbury (como em “To Caravan And Brother Jim”).

Após um concerto no Royal Albert Hall, em agosto, o grupo começou a preparar o material para o novo disco, que se chamaria apenas “Fourth”.

Esse seria o último disco com o quarteto formado por Wyatt, Hopper, Ratledge e Dean.

O disco seria lançado em março de 1971 e mostrava o Soft seguindo a mesma linha de “Third”, só que dessa vez sem vocais.

Um disco bastante experimental e quase tão bom quanto o anterior.

Vários músicos foram adicionados ao quarteto nesse período, entre eles, o baixista Roy Babbington e o baterista Phil Howard, para aumentar as possibilidades sonoras.

Nesse mesmo ano, Elton Dean lançou seu primeiro disco-solo, com o seu grupo “Elton Dean Band”, que contava com o próprio Phil Howard, além do baixista Neville Whitehead.

Mike Ratledge tocou em algumas faixas.

Mas a situação entre os músicos era tensa internamente e em agosto o grupo sofreu uma perda considerável quando Robert Wyatt deixou o Soft Machine.

A escolha natural acabou sendo efetivar Phil Howard em seu lugar, mas a verdade é que o Soft perdeu todo seu carisma sem o baterista original.

Mas Robert não ficou muito tempo parado e logo formou o Matching Mole.


Enquanto isso, o Soft enfrentava nova crise.

Howard não agradava Hopper e Ratledge que consideravam seu estilo de tocar incompatível ao que queriam.

Howard acabou sendo sacado durante as gravações do novo disco, que seria batizado como “Fifth”.

A saída foi chamar o baterista John Marshall, ex-Nucleus, que deu ao grupo um som de jazz mais convencional, um pouco mais distante das experimentações dos dois discos anteriores.

Lançado em 23 de junho de 1972, “Fifth” já era um trabalho mais conservador, bem perto da fronteira do jazz-rock em voga nos anos 70.

Mas antes mesmo do disco sair, Elton Dean deixa a banda, insatisfeito com o resultado obtido e começa a tocar com grupos de jazz acústicos e até se envolve com uma banda holandesa de rock progressivo, Suspersister, entre 1973 e 1974.

Karl Jenkins, que havia tocado também no Nucleus é chamado para a vaga de Dean.

Talentoso e bom compositor, ele começa a dividir as composições com Ratledge.

Em novembro gravam uma apresentação feita no dia 1º de novembro, no Civic Hall, em Guildford, que posteriormente seria usado em um novo disco.

O grupo fica ensaiando até dezembro de 1972 e no dia 17 de fevereiro de 1973 lançam “Sixth”, o novo disco.

Assim, como “Third”, era um álbum duplo, sendo um lado de estúdio e o outro ao vivo, usando o show do Civic Hall.

O novo disco mostra uma volta ao experimentalismo e a melhor amostra é a composição “The Soft Weed Factor”.

Em maio, nova baixa: Hugh Hopper deixa a banda saturado de tantas idas e vindas após quatro anos e parte para uma carreira-solo.

Mas a notícia mais triste aconteceu em junho: durante uma festa em Londres, Robert Wyatt, bêbado, perdeu o equilíbrio e caiu de uma janela do terceiro andar.

Wyatt não morreu, mas ficou paraplégico, perdendo os movimentos da cintura para baixo.

O baterista havia voltado a ser um artista solo após sair do Matching Mole e estava escrevendo as canções de sua melhor obra, “Rock Bottom”.


Sem Hopper, o velho amigo Roy Babbington foi escalado para assumir o baixo e o Soft conservava agora apenas Mike Ratledge como membro original.

Em julho, começam a gravação de um novo disco, que se chamaria “Seven”, a ser lançado no dia 27 de outubro.

Mas o som mudou radicalmente já que Roy não usava mais um baixo acústico, trocado por um baixo elétrico de seis cordas.

Isso levou o grupo cada vez mais ao rock progressivo, com canções mais curtas e menos improvisadas.

Já nessa época, o Soft Machine era considerado um dos maiores grupos do mundo no gênero progressivo e participou de vários festivais, como o de Great Easter Circus, em Dortmund, na então Alemanha Ocidental, ao lado de Emerson, Lake & Palmer, Atomic Rooster e Tangerine Dream, entre outros.

No dia 4 de novembro, o Soft Machine se junta aos velhos companheiros do Pink Floyd para uma causa mais do que nobre: levantar fundos para que Robert Wyatt pudesse continuar seu tratamento médico.

Os dois shows acontecem no Rainbow Theatre, em Londres.

Em dezembro, o grupo ganha um novo guitarrista, o jovem Allan Holdsworth.


Em 1974, eles participam de uma grande excursão pela Europa, Estados Unidos e Canadá e em julho entram em estúdio para gravar um novo disco (que não iria se chamar Eight...)

“Bundles” é lançado em 22 de março de 1975 e o som havia mudado radicalmente para bem próximo da fusion e do rock.

Holdsworth era um guitarrista muito talentoso, mas havia tornado o som do Soft um tanto quanto convencional, bem longe das experiências dos primeiros discos.

Um dos motivos para o disco não levar um número na capa é que tinham deixado a gravadora CBS e tinham se mudado para a Atlantic Records.

Além disso, o grupo tentava deixar o universo underground para se transformar em uma banda mainstream, daí a aproximação com um som mais em voga naqueles tempos.

Mas Allan logo deixou a banda, entrando em seu lugar, John Etheridge, que havia sido recomendado pelo próprio Holdsworth.

O grupo acabou embarcando em uma ambiciosa, mas mal-sucedida turnê pela Europa com o Caravan e o Mahavishnu Orchestra, pela Áustria, Iugoslávia Itália, Alemanha Ocidental, Holanda, Bélgica, Suíça, Dinamarca e Suécia, tendo convidados como Lou Reed, Wishbone Ash, Reinassance e Climax Blue Band.

Batizaram a mesma de Star Truckin’ 75.

A experiência mostrou-se um fracasso financeiro imenso e em janeiro de 1976, Mike Ratledge, o último membro original, deixa o Soft Machine.

Sem ele, Karl Jenkins e John Marshall convidam o saxofonista Alan Wakeman (primo do tecladista Rick Wakeman) para entrar no grupo e lançam “Softs”, em 25 de junho de 1976.

Mas Alan só ficou seis meses e foi logo substituído pelo violinista Rick Sanders.

Roy Babbington foi o próximo a deixar o grupo entrando Percy Jones, ex-Brand X em seu lugar, que cedeu meses depois o posto para Steve Cook.

O grupo passa o ano de 1977 excursionando e lançam a coletânea tripla “Triple Echo”.

Disco novo só sairia em março de 1978: “Alive & Well”, gravado durante as apresentações feitas em Paris, em julho de 1977.

O disco marca o fim das atividades até dezembro, quando fazem o derradeiro show, em Bremen, no estádio Westfallenhalle, no dia 8.

A banda anuncia o fim das atividades, sendo que a formação nessa época contava com John Ethridge, Karl Jenkins, John Marshall e Rick Sanders.


Segundo o velho barbudão Karl Marx, a história sempre se repete como farsa.

E na história do rock também não poderia ser diferente.

Fundado em 1970, quando outros mastodontes progressivos como o Pink Floyd (1965), o Genesis (1967) e o Yes (1968) já acionavam seus torpedeiros épicos, o Emerson, Lake & Palmer (“ELP”) investiu pesado na munição tecladeira se apresentando pela primeira vez no Festival da Ilha de Wight, com excelente repercussão.

Vale lembrar que no começo dos anos 70 o rock já há muito tinha perdido o sufixo dançante – “and roll” – e não mais se prendia apenas às origens negras.

Transformou-se num “state of art” desvinculado do chacabum babélico das ruas, sendo que a maioria dos grupos de rock progressivo caçava as raízes nos seus jardins botânicos antepassados, os compositores clássicos.

Foi assim que o ELP consequiu colocar na parada de sucesso o russo Mussorgsky (1839-1891) de “Pictures At An Exebition”, mais tarde transformado em filme.

O hit “Fanfare For The Common Man”, de Aaron Copland (1900-1990), escalou o segundo lugar.

O disco conceitual “Tarkus”, com todo o obscurantismo de representação da besta eletrônica de science fiction, desembarcou por uma semana no primeiro lugar entre os mais vendidos na Inglaterra.


As latitudes da salada progressiva do ELP comportavam ainda mugidos sintetizados do Moog, então vanguardista, sotaque latino modelito “fusion Chick Corea” e até jazz rasgado do tipo que o pai de Carl Palmer (baterista de orquestra de dança) cansou de acompanhar.

Em plena apoteose das estrelonas do rock, que provocaria a cusparada dialética do punk, o trio era um típico supergrupo setentista.

Uma conjunção astrológica perfeita formada pelos escorpiões Keith Emerson (um piloto de teclados recém-saído do The Nice) e o baixista Greg Lake, egresso do King Crimson (que emprestaria também o letrista Pete Sinfield) com o pisciano Carl Palmer, ex-baterista do Atomic Rooster.

Em 1972, o ELP lança sua primeira obra-prima “Trilogy”, que tinha como destaques as faixas “From The Beginning” e “Hoedown”.

O disco alcança o segundo lugar na parada britânica e o quinto na americana.

Começam as excursões, com uma média anual de 180 shows.

A ambição do grupo cresceu exponencialmente – eles se tornaram o primeiro supergrupo a levar para as turnês sua própria estrutura de palco, o que exigia nada menos que 40 roadies para montar os equipamentos.

O crescimento também foi econômico: o ELP criou seu próprio selo, o Manticore, que lançaria os próximos discos do grupo e de outros artistas.


O primeiro produto do novo selo foi o 4º disco de estúdio do trio, “Brain Salad Surgery”, de 1973, que já se mostrava grandioso a partir da capa – o design foi desenvolvido por H. G. Giger, responsável pela concepção do filme “Alien, O Oitavo Passageiro”.

Considerado o “Sgt. Pepper do ELP”, o disco trazia como destaques a balada “Still...You Turn Me On” e “Karn Evil 9”, uma suíte com mais de 29 minutos e quatro atos que praticamente inaugurava a utilização do teclado eletrônico como principal condutor de uma banda de rock.

É nessa música que está a famosa frase do grupo “Welcome back my friends to the show that never end”, que acabaria intitulando seu segundo LP ao vivo, um disco triplo lançado no ano seguinte.

Nesse meio tempo, a estrutura do trio ficou ainda mais gigantesca – para os shows, eles já carregavam 30 toneladas de equipamentos, incluindo som quadrafônico e sofisticados canhões de luz.

Em apenas quatro anos, o ELP já havia gravado seis discos e viajado quase o mundo todo.

O grupo, então, resolveu dar um tempo para que seus integrantes se dedicassem a trabalhos solo.


O resultado dessa presepada foi mostrado em “Works 1”, um disco duplo lançado em 1977, no qual o trio resolveu dedicar um lado de cada LP aos projetos de seus integrantes e o último ao seu trabalho conjunto.

As faixas mais interessantes eram a balada “C’est La Vie”, composição solo de Greg Lake, e “Fanfare for The Common Man” e “Pirates”, compostas pelo trio.

Na turnê para divulgação do disco, eles levaram uma orquestra de 75 músicos.

Quase foram a falência por conta dos custos astronômicos envolvidos na parada.

No final do ano, lançaram o chatíssimo “Works 2”, com os rebotalhos e sobras do trabalho anterior.

O reinado das individualidades contidas no ELP durou até 1980, quando a revoada de egos inflados tornou-se inevitável.

O baterista Carl Palmer foi o primeiro a picar a mula.

Emerson e Lake arrumaram outro P, de Cozy Powell, para uma coda do ELP, antes da debandada completa.

Carl Palmer integrou outro grupo, o Asia.

Depois Greg Lake juntou-se ao blues-roqueiro Gary Moore e Keith Emerson partiu para trilhas de cinema.


A ressurreição do trio original aconteceu em 92, com o álbum “Black Moon”.

Cada um dos integrantes do revival tinha uma frase feita para espantar o fantasma caça-níquel do eterno retorno.

“A família está junta outra vez”, afagou Emerson.

“O ELP foi a melhor coisa que fizemos”, suspirou Lake.

“É a hora perfeita para a volta, porque agora a gente tem uma aparelhagem para vôos nunca antes planejados”, emendou Palmer.

Nem tanto ao céu nem tanto ao inferno.

A faixa título, uma rasante sobre a Guerra do Golfo, soava uma caricatura hollywoodiana dos velhos progressivos.

O erudito convocado desta vez, Prokofiev (1891-1953) de “Romeo And Juliet”, destilava hibridismo classic rock numa balada de teclados com patas de elefante.

Havia espaço até para um libelo antibélico em “Farewell To Arms”.

A gaita bluesy de “Paper Blood” fornecia uma pitada de jazz ao recheio.

Mas na ironia farsesca da história, o melhor do novo-velho ELP tinha caligrafia de base acústica, como em “Footprints In The Snow” e “Affair Of The Heart”.

Ou seja, o excesso de confeitos dos bolos de noiva instrumentais do gênero acabava por empurrar a simplicidade de volta para o futuro, e tal como havia previsto o velho Karl Marx no século 19, a história se repetia como uma farsa grotesca.

Talvez Robert Fripp tivesse mesmo razão quando falou cobras e lagartos sobre a música-cabeça do ELP.

Era uma música-cabeça, sim. Para descerebrados.

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