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quarta-feira, novembro 23, 2011

Petrobras: responsabilidade social pra inglês ver ou a miséria moral da nossa maior estatal


Em outubro de 2005, uma balsa da empresa Delima Comércio e Navegação Ltda, que presta serviços de frete para a empresa de transportes do Sistema Petrobras (Transpetro), envolveu-se em um acidente náutico com um pequeno barco de pesca nas proximidades de Codajás.

A balsa bateu na embarcação pela parte de trás e passou por cima do barco, que ficou completamente destruído.

Três dos quatro tripulantes do barco ficaram feridos, entre eles o menor Sergio Barroso, de 16 anos, que teve sua perna esquerda amputada pela hélice da balsa um pouco abaixo do joelho.

A tripulação da balsa socorreu as vítimas, que foram levadas até Codajás.

Pela gravidade do ferimento, Sergio Barroso foi enviado a Coari e, de lá, para Manaus, onde foi atendido no Pronto Socorro João Lucio, na zona leste.

Na época, o pescador Dorinho Barroso, proprietário do barco, disse que não tinha o que reclamar do atendimento da equipe da Petrobras.

Nesses seis anos, sua opinião mudou muito.

Único meio de subsistência que possuía, o barco de pesca destruído no acidente jamais foi indenizado.

Aos 60 anos, ele sofre de depressão crônica e passa o dia em casa, remoendo suas mágoas, no mais completo silêncio.

O pedido de indenização pelo filho mutilado, por conta das reiteradas chicanas jurídicas utilizadas pela empresa Delima Comércio e Navegação, continua dormindo na gaveta de alguma autoridade judiciária.

Casado e pai de uma filha, Sergio Barroso sobrevive fazendo corte de cabelo em Manacapuru.

Mesmo trabalhando diariamente, das seis da manhã às dez da noite, de domingo a domingo, incluindo os feriados, ele mal consegue ganhar R$ 400 por mês.

É com esse dinheiro que ele sustenta o pai adoentado, a mãe idosa, dois irmãos menores, a esposa e a filha.


Na ação cível que moveu contra a empresa responsável pelo acidente, Sergio Barroso ganhou na primeira instância graças à sensibilidade do juiz Diógenes Pessoa.

O juiz condenou a empresa a indenizar a vítima em R$ 60 mil, a título de danos morais, bem como ao pagamento de uma pensão vitalícia no valor de 1 (um) salário mínimo, a título de danos materiais, concedendo tutela antecipada – ou seja, a empresa teria de pagar imediatamente a importância devida a vítima mesmo que ainda pudesse apelar judicialmente.

A empresa recorreu da decisão, argumentado que o pequeno barco tinha sido responsável pelo acidente porque trafegava de luzes apagadas durante a madrugada e, em vez de pagar a indenização à vítima, preferiu fazer o célebre “depósito bancário em juízo”.

Na verdade, o barco de pesca havia sofrido uma pane elétrica e seu Dorinho Barroso estava no porão da embarcação tentando resolver o problema quando a balsa atingiu a embarcação.

O desembargador Arnaldo Carpinteiro Peres, relator da matéria em 2ª instância, observou em seu parecer que o laudo sobre o acidente emitido pela Marinha do Brasil reconhecia uma parcela de culpa da empresa apelante, a citada Delima.

Afinal, a balsa fretada pela Petrobras possuía instrumentos capazes de orientar o condutor acerca de eventual aproximação de outras embarcações, já que possuía a bordo do empurrador um equipamento de radar que auxilia na navegação.

Além disso, disse o relator, “não se mostra nem um pouco prudente navegar pelos rios amazônicos sem uma qualificada percepção visual do trajeto, esquecendo-se de uma população ribeirinha, que costumeiramente navega em embarcações de pequeno porte, sem qualquer equipamento de segurança”.

No seu parecer, o desembargador manteve incólumes os termos dispositivos da sentença em 1ª instância, notadamente a condenação da empresa ao pagamento de R$ 60 mil a título de danos morais, impondo-lhe ainda a obrigação de custear os gastos médicos realizados pelo acidentado até a sua recuperação integral.

A decisão do desembargador Arnaldo Carpinteiro Peres, que obteve a aprovação unânime dos desembargadores da Segunda Câmara Cível do TJA, foi proferida no dia 22 de novembro de 2010.


Um ano depois, Sergio Barroso continua sem receber um único centavo da empresa Delima Comércio e Navegação, prestadora de serviços da Petrobras, que se diz “uma empresa campeã de responsabilidade social do país”.

O mais grave ainda: a prótese mecânica do rapaz precisa de reparos urgentes, avaliados em R$ 3 mil, para troca do silicone e das peças de sustentação.

O conserto deveria ter sido feito no ano passado, mas o jovem amputado não tem como conseguir esta, para ele, “pequena fortuna”.

É bem provável que a Petrobras se exima de sua responsabilidade, argumentando que não pode ser culpada pelos descalabros feitos pelos seus fornecedores, escamoteando marotamente o fato de ser uma empresa ISO 14000.

Neste país, como é do conhecimento de todos, a hipocrisia as vezes não tem limites.

De qualquer forma, o egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Amazonas bem que poderia desengavetar o processo e obrigar a Delima a pagar imediatamente, com juros e correção monetária, tudo que é devido legalmente a Sergio Barroso.

O jovem amputado não está pedindo piedade, comiseração ou solidariedade.

Está pedindo apenas uma pequena dose de Justiça!

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