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terça-feira, março 27, 2012

Aula 19 do Curso Intensivo de Black Music: Babyface


A linhagem mais melódica da música negra influenciada pelo “som da Motown” estava sendo traduzida com competência, nos anos 90, por um sujeito chamado Babyface (uma nova usina de hits semelhante a Williams “Smokey” Robinson, dos Miracles) e por uma dupla étnica chamada Lighthouse Family.

O rosto do homem que os fãs chamam de Babyface e os amigos, apenas de Face, é liso e suave, mas isso não causa estranheza.

Ele tem um atrativo informal: é glamouroso, ao mesmo tempo que parece o rapazinho que mora ao lado.

Foi exatamente o seu talento para tornar esse glamour acessível a todos que possivelmente transformou Babyface (seu nome verdadeiro é Kenneth Edmonds) no mais bem-sucedido escritor de canções da era pós-Lennon/McCartney.

Ele é o artista que teve o maior número de indicações para o Grammy de 1998: doze.

Entre as indicadas para esse prêmio estavam as trilhas sonoras dos filmes “Falando de Amor”, com Whitney Houston e Angela Basset no elenco, e “Fenômeno”, com John Travolta.


Aos 38 anos, Babyface já havia escrito 22 canções classificadas em primeiro lugar nas paradas de sucesso, teve 61 entre as 10 primeiras e 49 nos primeiros lugares nas listas das melhores de R&B.

Além disso, ganhou o Grammy de melhor produtor de 1997.

Além das canções que ele mesmo canta, Babyface forneceu material para músicos de vários gêneros – Eric Clapton, Mariah Carey, Madonna, Michael Jackson – e estava mantendo conversações com os Rolling Stones.

Nos últimos dez anos, porém, não foram muitas as vezes em que uma canção escrita, produzida ou cantada por Babyface esteve nas listas das músicas pop em algum lugar.

Embora ele tivesse três álbuns de sucesso próprios, seu rosto de criança quase não era reconhecido universalmente.

Com sua mulher, Tracey, Babyface mantinha inviolada sua intimidade, especialmente depois do nascimento de seu filho Brandon, em 1997.

Em certo sentido, Babyface colecionava mais sucesso por trás dos bastidores como escritor, arranjador e produtor do que como um popstar.

Suas suaves canções de amor ajudaram a construir La Face Records, com sede em Atlanta, bem como uma nova geração de produtores e escritores musicais independentes, incluindo Dallas Austin e Jermaine Dupree.

Seu atualizado som soul serviu de instrumento para a construção de uma nova geração de artistas R&B: cantores influenciados por Babyface, como Tony Rich, D’Angelo e Maxwell, estão fazendo discos populares que não ressuscitam tanto a sensibilidade do cantor de soul, mas a adaptam para uma era mais cínica.


Babyface estava realizando uma revolução na classe média.

Sua habilidade para escrever canções tem raízes em sua devoção incomparável ao hook – o fragmento repetido de uma canção que na memória parece contê-la inteira.

Seus hooks – em canções como “Change the World”, de Eric Clapton, “End Of The Road”, de Boyz II Men, e “Take A Bow”, de Madonna – têm uma maneira de insinuar-se sem oprimir.

Em poucas palavras, são um pouquinho como ele mesmo.

No estúdio, ele se sente em seu elemento, cercado por toda essa engenharia acústica que a tecnologia digital e os royalties dos discos têm a oferecer.

As fotos de capa de seus álbuns freqüentemente projetam uma imagem de Babyface como um tender lover de encanto e elegância.

Mas, quando a gente o vê trabalhando, aparece sua verdadeira face: Babyface é uma pessoa superaplicada ao trabalho, um homem que prefere que seus hooks falem por ele.

Ainda assim, ele decidiu fazer um vídeo para promover “For The Lover In You”, uma reedição da canção “Shalamar”, de seu último álbum, “The Day”, para poder apresentar melhor seu próprio rosto.

Babyface fala mansinho e supostamente é tão acanhado que levou três anos para voltar a destacar-se com esse álbum – respeitoso, romântico e sincero demais para deixar embaraçado um gangsta rapper.

A obra que o define deve ser a música “Waiting To Exhale”.

O canto de Babyface nunca aparece, mas sua voz está evidente em toda parte.

As 16 canções – todas elas, com exceção de uma, escritas ou co-escritas por ele – pretendem fornecer o acompanhamento musical comum para vozes extraordinárias: Whitney Houston, Mary J. Blige, CeCe Winans.

“Ele é o único rapaz que conheço capaz de escrever a respeito do que uma mulher sente”, disse Whitney Houston. “É muito estranho que um homem possa fazer isso, mas, de alguma maneira, ele consegue descer ao fundo de sua alma e tirar tudo isso para fora.”


“Não que eu entenda as mulheres melhor do que os outros, mas eu entendo os sentimentos”, explica Babyface. “Entendo que as pessoas ficam magoadas e os homens sofrem e sentem o mesmo que as mulheres. Afinal de contas, somos todos iguais.”

Quando Kenneth Edmonds estava crescendo em Indianápolis, a música soul estava em seu ápice.

Ele a ouvia, mas o que realmente o impressionou e lhe deu a sensibilidade que hoje irradia foi a banda Bread.

O grupo de pop-rock, do qual hoje quase ninguém se lembra, tinha muitas músicas de sucesso no início da década de 70 (como “Make It With You”, “It Don’t Matter To Me”, “The Guitar Man” e a baba “If”), que eram os equivalentes musicais das histórias em quadrinhos “O Amor É...”.

Edmonds não tinha toca-discos, por isso gravava as canções do grupo diretamente do rádio com um antigo gravador.

Foi o Bread que o tornou um “homem da melodia”, disse ele.

Edmonds concluiu o curso colegial e imediatamente mergulhou no repertório das melhores 40 bandas negras conhecidas, tocando guitarra na rede Holiday Inn e bases da Força Aérea, e abrangendo tudo, desde Horse With No Name até os maiores sucessos de Stevie Wonder e K.C. & the Sunshine Band.

“Essa foi a minha escola”, explica. “Tocar nota a nota versões dos solos, tentando cantar a canção principal exatamente como Stevie a cantava: é assim que a gente aprende e é isso que infelizmente os rapazes de R&B de hoje não têm oportunidade de aprender, porque não existe mais o ambiente dos clubes.”


Ele acredita que muitos artistas não são mais músicos e o mundo alternativo do rock consiste apenas em estar numa banda.

“Existe a garagem onde a gente pratica a profissão e se torna músico”, diz. “A música negra não se parece mais com isso.”

Além da morte do circuito de clubes, há uma razão tecnológica para explicar por que a musicalidade negra caiu em tempos difíceis: máquinas que fazem o som de tambores e seqüências tornaram possível que uma só pessoa sintetizasse um som grupal.

“A gente como que se liberta da razão de precisar entrar na garagem e praticar”, diz Babyface. “Você pode fazer isso sozinho no quarto.”

Segundo ele, muitos desses artistas, quando surgem, precisam de letristas e produtores.

É por isso que quem virou letrista ou produtor se tornou mais especial.

“Provavelmente, hoje mais do que nunca, temos muito mais rapazes que querem ser letristas-produtores.”


Isso é exatamente o que ocorreu no início da década de 80, quando Edmonds se uniu com Antonio (L.A.) Reid, na Deele, uma banda de R&B (foi quando ele estava na Deele que Bootsy Collins, baixista da Parliament-Funkadelic, comentou um dia a respeito de seus traços suaves e lhe deu o apelido de Babyface).

Reid e Edmonds começaram a produzir outras peças e a escrever canções juntos, tornando-se conhecidos como confiáveis autores de sucessos.

Os dois formaram a La Face Records em 1981 e, embora tenham deixado de trabalhar juntos como uma equipe criativa há cerca de dois anos – existe claramente uma tensão, embora nenhum deles queira discutir isso –, continuaram como parceiros comerciais.

Em seu último álbum, Babyface faz um dueto com Kenny G., um colosso do saxofone.

Também regravou a baba “If”, do grupo Bread, com uma levada mais suingada.

Entre outras coisas, o moleque favoreceu a carreira de Eric Clapton razoavelmente fazendo-o tocar com mais facilidade a guitarra e fazendo-o também cantar como Babyface.

“Ele está evoluindo para se tornar um fenômeno histórico”, disse Don Cornelius, produtor e ex-anfitrião do Soul Train. “Motown, Stax, James Brown, Barry White – algumas pessoas marcaram época com seus nomes”, comenta. “Acho que estamos entrando na era Babyface.”

Esse texto foi escrito em 1998, mas a pergunta talvez seja pertinente: além de mim, alguém ainda curte Babyface?

Um comentário:

Edu disse...

FENÔMENO COMO ESSE NÃO PODE PASSAR SEM SER RECONHECIDO... EU CURTO! QUEM NASCEU EM SÃO PAULO COMO EU E CURTIU AS BALADAS ROMÂNTICAS DO "DEELE", SABE DO QUE DO QUE ESTOU FALANDO "