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quinta-feira, setembro 26, 2013

A volta do terror “old school”


André Barcinski

Confesso que estava sem paciência para filme de terror “mainstream” nos últimos tempos.

Não aguento filmes em 3D, e acho o “torture porn” – títulos como “O Albergue” e “Jogos Mortais”, exercícios de sadismo que lembram videogames – uma chatice sem tamanho.

O último filme do gênero de que gostei, entre os feitos por estúdios de Hollywood, foi “Deixe-me Entrar” (2010), refilmagem da excelente produção sueca “Deixa Ela Entrar” (2008). Caso raríssimo de refilmagem que não fica a dever ao original.

Mas dois filmes recentes me surpreenderam. Em agosto, estreou por aqui “Os Escolhidos” e, há duas semanas, “Invocação do Mal”.

É reconfortante saber que ainda existem filmes como “Os Escolhidos”, que, embora não seja nenhuma obra-prima, pelo menos ressuscita um estilo de cinema fantástico que parecia morto e enterrado: o que assusta pela sugestão.

A história é manjada: família de classe média começa a ser assombrada por aparições de “espíritos” e acontecimentos bizarros, como ver toda a mobília da casa empilhada em estranhas esculturas.


No princípio, os pais, Lacy (Kerri Russell) e Daniel (Josh Hamilton), acreditam se tratar de brincadeiras dos filhos, o adolescente Jesse (Dakota Goyo) e o pequeno Sam (Kadan Rockett). 

Mas logo o casal descobre que alienígenas estão de olho na família. 

Sam começa a ter pesadelos com seres que descem do céu e faz desenhos onde ele próprio aparece cercado por criaturas.

Não há nada muito inovador em “Os Escolhidos”. Há ecos de “Contatos Imediatos de Terceiro Grau” e uma desnecessária incursão pelo artifício narrativo típico da série “Atividade Paranormal” (os pais colocam câmeras nos quartos dos filhos para tentar flagrar os “espíritos”).

Mas o diretor, Scott Stewart, mostra talento ao criar um clima de suspense sem precisar, de fato, mostrar as criaturas, preferindo focar nas reações da família e em pistas que o roteiro vai espalhando pelo caminho (marcas, pegadas, etc.).

Numa época de superexposição e YouTube, em que nos acostumamos a ver e rever tudo e de todos os ângulos possíveis, é bom saber que existe um filme que ainda deixa algo para a imaginação do espectador.


Dirigido por James Wan (“Jogos Mortais”), “Invocação do Mal” é mais uma história sobre exorcismo e uma casa assombrada por espíritos malignos, mas contada com estilo, clima e uma boa dose de humor.

O filme é inspirado em um caso supostamente real envolvendo Ed e Lorraine Warren, investigadores especializados em fenômenos paranormais e conhecidos pelo caso de Amityville, que gerou dois filmes, alguns livros e muitas acusações de charlatanismo.

“Invocação do Mal” se passa em 1971. O casal Perron – Carolyn (a ótima Lili Taylor) e Roger (Ian Livingston) – se muda com as cinco filhas pequenas para uma velha mansão à beira de um lago. 

A família não demora a perceber que algo está errado com a residência: pássaros caem mortos no jardim, barulhos de passos são ouvidos à noite e todos os relógios da casa param de funcionar na mesma hora. 

Os Perron chamam Ed (Patrick Wilson) e Lorraine (Vera Farmiga) para ajudar, e o filme vira uma assustadora caçada ao demônio.

Muitos filmes do gênero cometem o erro de empilhar efeitos especiais por toda a história, o que tira o impacto do clímax. 

Mas o diretor James Wan mostra talento para criar um clima de suspense crescente com cenas simples e bem arquitetadas, incluindo uma envolvendo uma inocente brincadeira de cabra-cega.

O filme culmina em uma ótima sequência de exorcismo, aí sim, com muito barulho e efeitos especiais.

Wan é esperto e não tenta empurrar o filme como uma experiência “real”, a exemplo de alguns filmes do gênero “found footage”, como “Atividade Paranormal”. 

Quem quiser acreditar, que acredite. 

O roteiro traz alguns diálogos engraçados e até ingênuos, que tornam a coisa toda meio cômica.

Quando perguntam aos Warren se basta sair da casa mal-assombrada para se livrar dos espíritos, eles dizem: “Demônio é que nem pisar em chiclete: você pode mudar de lugar, mas acaba levando ele junto.”

Os dois filmes não vão mudar a vida de ninguém e não são obras-primas, mas pelo menos mostram uma tendência de volta a um estilo “old school” do cinema de horror, em que a história e ambientação valem mais que efeitos especiais e pirotecnia.

O que mais me incomoda no cinema fantástico recente é a overdose de “sustos”. 

Como já disse antes, os roteiristas parecem achar que basta empilhar cenas assustadoras uma em cima da outra, sem nada no meio.

Mas os grandes clássicos do gênero têm um equilíbrio entre cenas de preparação e o clímax.

Há alguns dias, o Telecine Cult reprisou “O Bebê de Rosemary”. 

É impressionante como Roman Polanski passa o filme inteiro só preparando o espectador para a sequência do parto. 

Antes disso, não há sangue ou violência, só mistério. 

E mesmo as cenas pós-parto não são explícitas e chocam muito mais pelo que não mostram.


Claro que hoje ninguém vai ao cinema esperando ver um novo “Bebê de Rosemary”. 

Mas esses filmes recentes não envergonham ninguém. 

E o final de “Invocação do Mal” é bem assustador. 
Recomendo.

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