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quarta-feira, outubro 29, 2014

Os cafajestes têm salvação?


A armadura de cafajeste é realmente impenetrável? Cumpadi Washington responde

Ricardo Coiro

Outro dia, entre um chope gelado e fritas bem oleosas fizeram-me a seguinte pergunta: “Os cafajestes têm salvação?”.

Como eu reagi? Reagi feito o político escorregadio que diz, diz, diz, mas que, na verdade, não diz coisa alguma. Apenas enrolei.

Agi assim, irmão, porque eu não tinha a menor ideia da resposta. Porém, saí daquele bar decidido a descobrir o xis daquela questão. E não demorei a ligar para um amigo muito sábio:

Cumpadi Washington?

É ele. E quem é a ordinária que resolveu me acordar?

É o Ricardo Coiro! Aquele cara que, dias antes da sua participação na Banheira do Gugu, deu-lhe um amuleto contra ereções fora de época! Sabe?

Claro! Como eu poderia me esquecer daquela foto da sua avó pelada e do quanto ela foi útil para evitar que eu ficasse ereto em rede nacional?

Que bom que eu ajudei, irmão. Mas agora é a sua vez. Pode ser?

É só pedir.

Cumpadi, você sabe se os cafajestes têm salvação?

Pau que nasce torto nunca se endireita!

Mas você não acha que...

Sabe de nada, inocente!

E assim acabou o meu papo com o ícone do axé. Porém, algo me dizia que eu precisava, urgentemente, de uma segunda opinião. Mas a quem recorrer? Foi aí que eu tive a brilhante ideia de ligar para um grande amigo e cafajeste de carteirinha:

Zé, é o Coiro. Tudo bem?

Tudo ótimo, cara.

Preciso bater um papo com você. Onde você está?

Tô aqui no bar do Pedroso. Passa aqui!

Eu fui.

Assim que ele me viu entrar no bar, pediu licença à morena que estava com ele e apertou o passo para me abraçar. Eu não demorei a entrar no assunto que, naquele momento, deixava-me aflito:

Zé, os cafajestes como você têm salvação?

Claro que não, Coiro. A cafajestagem está em nosso DNA, corre solta em nossas veias. Somos “cafas” desde o útero!

Mas você nunca...

Nunca, Ricardinho, nunca!

Mas nem...

NUNCA!

Foi aí que eu percebi que havia algum trauma cravado nas profundezas do Zé. 

E, para tentar aflorá-lo, pedi uma garrafa de tequila ao garçom.

O Zé se manteve o mais imutável dos cafajestes até o décimo copo. 

Depois disso, como eu nunca havia visto, ele iniciou uma longa sessão de choro. 

Chegou até a babar sobre a lapela da minha camisa. 

E fez uma confissão que parecia estar, há tempos, entalada na goela dele:

Um dia eu fui romântico, cara. Fui romântico pra caralho. Fui bem mais romântico do que o Roberto Carlos em Dia dos Namorados. Mandava buquês enormes, escrevia poesias que deixavam as músicas do Fábio Jr. no chinelo, escondia bombons sob o travesseiro dela e fazia serenatas daquelas bem açucaradas. Até que, um dia, eu resolvi sair mais cedo do trabalho. E adivinha o que aconteceu? Peguei a Marina na cama com o veterinário do Rex. Abri a porta do quarto e flagrei-a emaranhada com aquele homem cheio de pelos nas costas. Foi foda. Demorei mais de seis meses para me recuperar. E quando parei de ter pesadelos com aquela cena, resolvi que seria o mais frio dos seres; que não me doaria, por completo, nunca mais. E desde aquele dia forço-me a permanecer à prova de amores e envolvimentos mais longos. A verdade, Ricardinho, é que morro de medo de me machucar. Sabe aquela pessoa que, depois de perder um cachorro querido, nunca mais tem outro bicho de estimação? Esse sou eu no amor. Um ser que faz de tudo para não se apegar, com medo de sentir, novamente, a dor do necessário desapego. Consegue me entender?

Depois do desabafo, o Zé dormiu no meu colo, com as pálpebras inchadas e a respiração cheia de alívio. 

Como se tivesse, enfim, tirado um pedaço de carne seca que, há anos, estava entre seus dentes.

E eu, depois de enfiar uma nota de cem no bolso de um simpático taxista, que aceitou levar o Zé em segurança, escrevi um e-mail para a moça que havia me perguntado se os “cafas” têm solução:

Não sei se existem cafajestes que assim são por influência genética e que, independente das experiências que terão, dessa maneira continuarão a ser até o dia da morte. 

O que sei, de fato, é que alguns homens, depois de desilusões amorosas traumáticas, tornam-se cafajestes por opção. 

Caras que, impulsionados pelo medo de terem que encarar uma nova frustração sentimental, transformam-se em “cafas”. 

Mas será que essa armadura de cafajeste é, realmente, impenetrável? Tenho certeza que não. 

Sabe o que é capaz de furá-la? A paixão. 

Quem nunca viu um homem que se dizia o mais indomável dos cavalos, por causa de uma paixão fulminante, tornar-se, abruptamente, um poodle obediente? 

Eu já presenciei vários casos assim.

A verdade é que muitos vivem a berrar que são cafajestes convictos porque ainda não conheceram o potencial embriagante e transformador que tem a paixão. 

Ou porque já perceberam que ser romântico pode ser bem doloroso. 

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