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sábado, julho 08, 2017

Palmério Dória: tudo índio, tudo parente!


Foi no começo de abril de 1996. Um sujeito ligou para a redação do jornal Amazonas em Tempo, onde eu era editor de Cultura, explicando que tinha uma pauta: queria me fotografar para a revista Sexy.

Achei estranho. Eu, na Sexy, com quarenta anos de idade, careca e barrigudo? Alguma coisa estava fora de ordem...

Durante aquela conversa de bêbado para delegado, o sujeito se identificou.

Era o fotógrafo Wesley Andrade, que eu ainda não conhecia pessoalmente (dez anos depois, trabalharíamos juntos no jornal Correio Amazonense), mas que já era considerado um dos melhores profissionais de Manaus.


Enrolei o Wesley até não mais poder, para que as fichas caíssem.

Uma semana depois chegou à redação um fax do Edson Aran, com 20 perguntas indecentes. Aí, as fichas caíram.

Eu ia sair na coluna “Fax”, da Sexy, por conta da 2.ª edição do livro “Manual do Canalha”, que estava sendo publicado pela Topbooks, do editor Zemário Pereira.

Na época, a Sexy era editada pelo jornalista Palmério Dória e Edson Aran (jornalista, humorista, escritor consagrado e ex-diretor de redação da revista Playboy) era um dos redatores.

Lembro até hoje de umas das 20 perguntas indecentes:

Aran: Reeleição ou reereção?

Eu: Reereção. Reeleição é coisa de viado!


Continuar acreditando nisso até hoje me parece apenas um sinal de coerência ideológica.

O desabusado Palmério eu já conhecia por telefone, por conta do médico botafoguense João Sabino Neto, irmão do saudoso ex-vereador e ex-administrador do Porto de Manaus, Nelson Neto, e do sindicalista portuário Jerry Nelson, de Itacoatiara.


Morando havia mais de 15 anos em São Paulo, onde fazia especialização em cardiopatia no Hospital das Clínicas, Sabino sempre me ligava aos sábados à tarde, em meio a um porre monumental, e, invariavelmente, colocava o Palmério na linha, para conversar comigo.

O bar onde eles se reuniam, o famoso Tucupi, na Avenida Bela Cintra, era ponto de encontro dos nortistas. No geral, falávamos mal da arrogância abissal dos bandeirantes de Sampa e da deselegância indigesta dos buzanfãs de suas meninas – a maioria delas dando a impressão de que recebeu uma remada na bunda na hora em que nasceu.

Tenho quase certeza de que Sabino convenceu Palmério a divulgar meu livro, Palmério passou a bola para o Aran, que colocou o Wesley na jogada e ele entrou em contato comigo.

Acabei na piscina do Tropical Hotel, cercado por 20 ninfetas de parar o trânsito (uma delas, uma morena-jambo na flor dos seus 16 anos, Bhia Borges, depois virou apresentadora do jornal local da TV Cultura e hoje é a pin up mais cult da cidade), de paletó e bermuda, ostentando numa das mãos uma bebida servida em copo longo enfeitada com guarda-chuvinha de papel roxo.

Mais cafajeste, convenhamos, impossível!

Wesley fez, por baixo, umas 50 fotos. A revista Sexy publicou uma delas (a outra fotografia que ilustrou as duas páginas da matéria era do fotógrafo Marco Gomes, realizada durante uma palestra que fiz no Sesc-Senac sobre poesia marginal).

De lá pra cá, Sabino voltou pra Manaus (fez, inclusive, a minha avaliação de “risco cirúrgico” na primeira e única vez em que entrei na faca para consertar um úmero danificado em Borba), Palmério saiu da Sexy e escreveu alguns livros fundamentais para entender o Bananão (“O Princípe da Pirataria” e Honoráveis Bandidos” são dois deles), Edson Aran foi ser redator da Playboy, depois retornou para a Sexy, depois voltou para a Playboy, depois saiu de novo e escreveu alguns livros hilariantes (“Conspirações” e “O Imbecilismo” são dois deles), Wesley continuou fotografando meninas belas e eu também continuei lançando meus folhetins.


Aí, no início de 2006, o escritor Mouzar Benedito – que eu e Marco Gomes havíamos levamos para conhecer o Festival dos Bumbás de Parintins no ano anterior, no barco da galera do GRES Reino Unido da Liberdade – me mandou um livro de presente: “Grandes mulheres que eu não comi, entre elas Vera Fischer, as que sim, e o último salto do goleiro Castilho” (Editora Casa Amarela, 108 pp).

O título é graúdo porque o autor também não cabe em uma definição de meia lauda.

Jornalista e escritor, Palmério Dória narra suas peripécias nessa autobiografia, desde a infância em Santarém (PA) até a chegada ao Sudeste brasileiro, em que sua condição de jornalista o colocou diante de mulheres cintilantes como Vera Fischer, Gretchen, Narcisa Tamborindeguy, Glória Maria e Brigitte Bardot, entre outras.

Além das musas, passeiam pelo livro figuras políticas como Jânio Quadros, Jáder Barbalho, Heitor Aquino Ferreira e outros menos votados.

Filho de goleiro, sobrinho de goleiro, e ele mesmo um goleiro frustrado, Palmério Dória sempre teve Castilho como ídolo no futebol. Adorava-o pela firmeza, pelas defesas impossíveis, pelas pontes aéreas e espalmadas milagrosas.

E entendeu-o perfeitamente quando o grande arqueiro, imortalizado no Fluminense, em fevereiro de 1987, aos 60 anos, saltou pela última vez, jogando-se do apartamento da ex-mulher, num edifício no bairro de Inhaúma, no Rio, ao receber o mais duro não, o não do amor.

Para provar que aqui no Norte é tudo índio, tudo parente, Palmério recorda que foi companheiro de classe, no curso primário, do fero jornalista e escritor Lúcio Flávio Pinto, provavelmente o mais emblemático e valoroso jornalista da região amazônica.


Os dois foram juntos tentar a vida em São Paulo. Depois de certo tempo, Lúcio Flávio voltou para Belém e se tornou editor do combativo Jornal Pessoal, que circula na cidade há mais de 20 anos.

Palmério resolveu prosseguir na batalha e está em Sampa até hoje. Os dois são meus ídolos, claro.

E a autobiografia do jornalista é simplesmente imperdível, como vocês vão descobrir pelas postagens que começo a publicar a partir de hoje. Divirtam-se.


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