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sexta-feira, agosto 04, 2017

ABC do Fausto Wolff (Parte 35)


ÍNCUBO E SÚCUBO – São que nem tique-taque, ziguezague, pingue-pongue, não dá pra falar de um sem falar do outro. Há quem diga que eles não existem, mas o que tem de nego em terreno de macumba que parece estar sendo enrabado pelo diabo, não é brincadeira.

Negócio é o seguinte: o íncubo, que quer dizer literalmente “pesadelo” em italiano (embora isto não tenha nada a ver com as calças deste verbete), é um diabo que mantém relações sexuais com mulheres. Diz a lenda que o mago Merlin (lembram do filme Excalibur?) era filho de um íncubo.

Já o súcubo (devia chamar-se súcuba, pois é uma diaba) gosta de trepar com homens. Daí a mulher incubar e o homem sucumbir. Eu, entre um casamento e outro, vivo sucumbindo. Sério: não precisa me cantar muito pra eu sucumbir. Mas vamos voltar ao que interessa e por isso vou fazer até um parágrafo.
Os verdadeiros criadores dos súcubos e dos íncubos foram os cristãos da Idade Média que reprimiam o sexo.
Não sei quem inventou que Jesus Cristo alguma vez foi contra o ato de fazer amor. Pessoalmente, até desconfio que ele traçou a Madalena.
Aliás, não foi ele quem defendeu a adúltera contra os atiradores de pedras que, como a turma do Monty Python nos mostrou no filme A Vida de Brian, era composta de mulheres usando barbas postiças? Nada mais sujo que a cabecinha de um puritano!
No período pré-renascentista, os sacanas dos íncubos infestavam os conventos. Era só alguém abrir uma frestinha que entravam íncubos de todos os tamanhos, marcas, tipos e jeitos.
Gostavam muito de freiras e também de virgens e viúvas. As virgens, então, viviam se queixando: “Eu estava distraída na cama quando um incubo me comeu”.
É lógico que os médicos mais esclarecidos (havia alguns, podeis crer) viam nesses íncubos e súcubos nada mais que a realização histérica de fantasias sexuais.
Até uns duzentos anos atrás, porém, a Igreja garantia que se tratava de diabos com a aparência humana.
Lembram daquelas freirinhas do convento de Loudun lideradas por madre Joana dos Anjos sobre as quais Aldous Huxley escreveu tão bem? Todas possuídas por íncubos!
Se sexo não é a mola que move a humanidade, pra que grana, pra que poder, pra que sucesso?
Tinha, é lógico, muita mulherinha da pá virada (deve fazer uns vinte anos que eu não escrevo “pá virada” e vai levar outros vinte para eu escrever “pá virada” e nesta brincadeira já escrevi “pá virada” quatro vezes) que fantasiava o vizinho de íncubo e fazia tudo o que o diabo gosta, enquanto os chifres do marido cresciam.
A maioria, porém, acreditava que estava possuída pelo demônio.
R. Scott, um médico do século XVI, deixou escrita a sua opinião de que íncubos e súcubos não passam de males do corpo que causam problemas à mente. Foi chamado de burro pelos intelectuais da época e gozado pra cacete.
Enquanto isso as mulheres histéricas, que diziam ter sido possuídas por íncubos, apresentavam sintomas de falsa gravidez. A barriga realmente inchava e ao fim de nove meses ela dava à luz ar em profusão.
Vocês me desculpem, mas tem uma súcuba aqui do meu lado que, por acaso, é minha mulher e eu pretendo sucumbir à ela. Boas sucumbidas e boas incubadas, aliás, é o que desejo a todos vocês.

INSEMINAÇÃO (e Inovolução) Artificial Não vai doer nada. Primeiro vou inseminá-la e depois inovulá-la. É quase como brincar de papai-mamãe. Aparentemente, a inseminação é apenas a introdução do esperma na vagina da mulher por qualquer outro meio que não a ejaculação propriamente dita. Mas apenas aparentemente. 
Na Umbria (Itália), mais de dez anos atrás, vi como inseminam as vacas. As coitadas ficam em fila, rabo para cima. Chega o veterinário e enfia todo o braço envolto em plástico dentro das clarabelas. Depositam o esperma direitinho nos ovários. O esperma, não só de touros como de cavalos e cães puro sangue é vendido – principalmente quando o exemplar é campeão de exposição – a preço altíssimo. Em Minas Gerais tem um cidadão que vive de porra de boi que exporta para o mundo todo.
A inseminação artificial serve também para engravidar mulheres cujos maridos são estéreis e mais: para engravidar mães de aluguel com esperma de um homem cuja mulher não pode ter filhos.
Tudo começou em 1972, quando um casal londrino que não podia ter filhos procurou o Dr. John Hunter. Ele verificou que por causa de um problema na uretra o marido não conseguia ejacular dentro da mulher.
Não teve dúvidas: mandou ele bater uma punheta, botou o esperma ainda quente numa seringa e o injetou na parte posterior da vagina da mulher. Sucesso absoluto. Nove meses depois, nascia a primeira criança produzida por inseminação artificial.
Outro dia, ao dar uma palestra para uma turma de jornalistas, parodiei Jefferson e disse que entre um país sem governo e um país sem jornais, eu preferia um país sem governo.
Infelizmente, em termos de Brasil, deram-me mais do que pedi: um país sem governo e sem jornais.
O jornalismo deveria informar o povo o que faz o governo e não o contrário.
Exatamente por isso a população vive na maior ignorância no que diz respeito à física nuclear. Só soubemos da existência do césio depois dele ter matado um bocado de gente.
No que diz respeito à engenharia genética, a nossa ignorância ainda é maior, pois o progresso científico envolve fatores éticos, morais, religiosos, econômicos e, como sempre, políticos.
Um aspecto positivo: uma senhora casada com quarenta anos espera um filho. Ela tem uma chance em sessenta de que a criança nasça com a síndrome de Down, ou seja, com defeitos internos, retardamento mental e uma morte prematura.
Se tivesse vinte e cinco anos, a chance da criança nascer com a doença seria de uma em 1.500.
A gigantesca maioria, que é pobre, enfrenta os riscos no escuro, mas esta senhora de que estamos falando vai a um médico especialista quando está no quarto mês de gravidez.
Ele tira uma prova do fluido amniótico do seu útero e em seguida conta os cromossomos. Se tiver um extra, a criança nascerá com a síndrome de Down.
O casal pode optar pelo aborto. E a síndrome de Down é apenas uma das mais de 1.800 doenças congênitas capazes de produzir até mesmo monstros sem cérebro.
Se o médico constata que o marido carrega um gene perigoso, o casal pode optar pela inseminação artificial.
Geralmente, nesses casos o doador é um estudante de medicina que ganha uma graninha para bater punhetas e dar ao hospital esperma sem defeitos.
Discretamente, o médico que trata da mulher que quer ter um filho através da inseminação, procura um doador saudável que se pareça com o marido dela.
Eu pergunto: e se ela escolhesse – porque essas mulheres de um modo geral têm dinheiro – numa sala, entre vinte doadores, o esperma de um determinado cidadão, não estaria implícito o adultério?
Há menos de oito anos uma clínica especializada na Noruega fez uma pesquisa, com trezentas mulheres que queriam ser inseminadas, sobre quais qualidades preferiam que tivesse o doador do sêmen.
Duzentas e trinta queriam que ele fosse inteligente, física e mentalmente saudável e reconhecidamente honesto.
Setenta queriam que eles fossem parecidos com os respectivos maridos.
Se não houver uma legislação muito séria sobre este assunto, podemos muito bem cair (se é que já não caímos sem saber) no fascismo genético.
Por exemplo: um cavalo campeão de corridas, com seu esperma, pode engravidar num ano 10 mil éguas. E se começarem a vender esperma de prêmios Nobel, campeões de atletismo, artistas de cinema? Teríamos, de repente, milhões de Paul Newmans, Milton Friedmans, Pelés e Alexander Flemmings e – é preciso contar, principalmente, com as imbecis – Silvester Stallones e Josés Sarneys? E o homem comum, o operário comum, se tornaria ainda mais parte de uma raça inferior à parte? E quando irmãos começassem a trepar entre si?
E o que é que vocês pensam da inovulação artificial?
É o seguinte: mulheres com bloqueio nas trompas não podem engravidar. Entretanto, a medicina genética, há mais de dez anos estimula os ovários da mulher com hormônios. Depois disso, remove os óvulos, que são fertilizados em laboratório com o esperma do marido.
Os óvulos crescem numa solução morna, rica e nutritiva durante oito dias. Em seguida os médicos escolhem um óvulo que se transformará numa criança e os demais são jogados na lata de lixo.
O óvulo escolhido, já embrião, é colocado no útero da mulher e nove meses depois nascerá uma criança, filha de alguém que em princípio não poderia ter filhos. Ao escolher qual dos óvulos vingará, os médicos não estão brincando de Deus?
A complexidade, porém não pára aí.
Uma vez fertilizado, o óvulo pode ser depositado em qualquer útero. Quem garante que já não existem mulheres ricas e comodistas que preferem ter os óvulos fertilizados fora do útero e depois colocalos no útero de uma mulher que ganharia dinheiro para carregar o filho alheio?
Isso já acontece com animais. Os veterinários retiram, por exemplo, os óvulos de uma vaca (algumas dezenas) que são fertilizados pelo esperma de um touro campeão. Um óvulo é recolocado na vaca original e os demais em outras.
Se elas estão longe, o óvulo viaja agarrado no útero de uma coelha e, posteriormente, é transferido para a vaca.
Com bichos, tudo bem, mas numa luta judicial para a posse de uma criança de quem é o filho? Da dona do óvulo ou da que carregou a criança por meses? Isso para não falar do bebê de proveta, que cresce fora do útero.
Quem sabe dentro de algum tempo poderemos ter um feto num vaso, como decoração, em nossa sala de visitas? Ficamos todos batendo papo vendo-o crescer lentamente.
Levando-se em conta a ignorância irresponsável dos políticos que dominam o mundo neste fim de século, pensem o que cientistas loucos, físicos e biólogos com mania de grandeza podem fazer! Bum!

ISHERWOOD, Christopher (1904-1987) – Eu poderia escrever um verbete sobre Somerset Maugham (O Fio da Navalha), ou Edward Morgan Forster (Passagem Para a Índia), ou qualquer grande escritor menor inglês nascido no fim do século passado ou princípios deste que fosse bem-comportado e tia velha como Isherwood. Acontece que a letra “I” está muito pobre de personagens. Sobrou pra ele, portanto.
Garoto da alta classe média, ele descobriu sua preferência aos doze anos, quando gozou ao lutar com um coleguinha. Na mesma escola, aliás, estudava o excelente poeta Hugh Wystan Auden, três anos mais moço, também viadinho e que chegou a ser seu amante por muitos anos.
Isherwood, que gostava de ver seu pai – que morreu durante a Primeira Guerra Mundial – fazer ginástica meio pelado no quarto, só conseguiu convencer sua mãe de que era chegado a um trolho quando tinha quase cinquenta anos. Ele, Maugham, Forster e muitos escritores britânicos eram enrustidíssimos.
Quem ler seus livros com atenção verá, porém, que tanto o professor de Forster de Passagem Para a Índia, como o escritor de Maugham de Fio da Navalha e o jovem professo de The Berlin Stories, de Isherwood, são completamente assexuados. Aliás, isso fica mais ou menos claro pelo menos na transposição de Passagem Para a Índia e The Berlin Stories (Cabaré), para o cinema.
Depois de passar alguns anos dando muito nos bares gay de Berlim pra Hitler, Isherwood entrou para o partido comunista, mais porque era moda que por ideologia.
Mudou para os Estados Unidos depois da Segunda Guerra Mundial, mas só aos sessenta e cinco anos confessou publicamente seu homossexualismo.
Eis um trecho de uma entrevista que deu para o Gay Sunshine (O Raiar do Sol Bichal), de São Francisco:

“Apaixonei me quando ainda adolescente, mas nunca fiz nada a respeito. Só na universidade tive um affair deveras físico. Não tinha qualquer dúvida sobre minha homossexualidade. Era como uma escolha que minha mente e meu corpo tinham feito em caráter definitivo. Estava pronto a admitir que poderia ser igualmente heterossexual se quisesse. Cheguei a fazer uns dois testes. Tudo funcionou direitinho, mas eu preferia garotos e já sabia que podia amá-los. Sempre fui perfeitamente feliz como sou. Se minha mãe é responsável por isso, sou-lhe grato... Foi em Berlim que conheci André Gide (autor de Os Moedeiros Falsos, prêmio Nobel). O francês também gostava de meninos. No bar que frequentávamos, na ausência de alguém suficientemente jovem para ele, arranjaram-lhe um rapazinho que tinha de fato vinte anos mas que aparentava ter quinze. Não houve reclamações”.
Até sua morte não houve uma bichinha bem-comportada que não o adorasse, quer nos Estados Unidos, quer na Inglaterra.
Apesar de andar sempre com viados (“Sinto-me asfixiado quando estou longe de minhas irmãs e irmãos”), apesar de nunca ter tido uma namorada, apesar de desmunhecar pacas e apesar dos personagens centrais dos seus livros serem sempre indefinidos, Isherwood ficou muito surpreso ao saber que sua confissão de profissão de fé homossexual não apanhou ninguém de surpresa.

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