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sexta-feira, fevereiro 23, 2018

Sim, é apenas um comentário sobre a foto...



Por Ismael Benigno

Independentemente de quem mandou intervir na segurança do Rio de Janeiro (e foi o Vampirão, por razões óbvias e outras inconfessáveis), as forças armadas estão na rua. Se formos todos sinceros, vamos admitir que ninguém sabe no que vai dar. Em sendo o local o Brasil, a chance de dar merda é altíssima.

Apenas um comentário sobre a foto que correu a internet hoje, de crianças pequenas tendo mochilas revistadas por soldados do Exército. Vi dezenas de pessoas, amigas ou não, indignadas com a situação. E não consigo resistir a perguntas tão óbvias quanto a situação deprimente da segurança brasileira.

Primeira: vocês acham que as crianças das favelas não têm contato diário e próximo com fuzis como os da foto? Talvez a diferença seja apenas a do FAL brasileiro, dos soldados, para o AR-15 americano, dos bandidos.

Vocês acham que a violência da cena da foto é inaugural para essas meninas e meninos? Ou para piorar ainda mais a conjectura: se o destino de crianças em favelas brasileiras é conviver com homens armados, soldados do Exército ou bandidos, sem direito a uma terceira opção, o que vocês escolheriam? Ou os bandidos não invadem casas e violentam meninas – muitas vezes filmando – nas favelas?

Vamos combinar, para começo de conversa, que favela nem deveria existir. Mas soluções de longo prazo não são pro bico do Brasil, então esqueçamos.

Depois, criança perto de fuzil nunca ornou muito qualquer paisagem de país que se preze. A diferença, aqui, é que o fuzil da foto está ali para proteger a criança, e não para ameaçá-la.

Pra falar a verdade, nenhum fuzil assusta mais ninguém nos morros cariocas. E essa é a grande tragédia brasileira.

Concordo totalmente que a população se arme de celular, gravador e filmadora para monitorar qualquer abuso nas abordagens à população.

Mas pergunto, pra finalizar, aonde estavam os protetores dos direitos das comunidades das favelas, quando o caso era flagrar, filmar, denunciar e expor as atrocidades cometidas por traficantes contra os inocentes dos morros?

É mais do que salutar vigiar o poder público para evitar as atrocidades e as arbitrariedades que os militares brasileiros já mostraram saber fazer no passado.

Mas seria também muito bem-vindo que os blogueiros, youtubers e humoristas da paz se dispusessem a ir vigiar o comportamento de quem sempre mandou nos morros, de fuzil na mão, sem representar absolutamente nada que fosse benéfico para os morros.

Do fim da ditadura militar, em 1985, foram-se mais de 30 anos. Fazer experimento acadêmico tornando o Exército o bandido invasor, em homenagem a uma época em que a maioria dos ativistas de hoje nem sonhava um dia nascer, é muita falta de vergonha na cara.

A gente sabe, claro, que brasileiro não sabe ser mocinho o tempo todo. Provavelmente vai dar merda, mesmo.

Mas se indignar com soldado armado e não dar um pio para bandido armado é o suprassumo da covardia de quem não tem contato com nada desse mundo cão dos morros, a não ser pelo cigarrinho de maconha que finge não saber de onde e a que custo chegou na sua rodinha de violão.

Foi por muitas outras coisas, porque a coisa é complexa demais, mas também foi com o violão e a cara de paisagem de muita gente que a imagem dessa foto foi ganhando cores tão tristes.

quinta-feira, fevereiro 22, 2018

Canção de Fim de Ano



Por Antônio Maria

Que dia maravilhoso haverá, aquele em que for possível telefonar para os melhores amigos e dizer-lhes que houve um ligeiro engano, que não teria sido preciso escrever coisa alguma? E que, dali em diante, nada mais se escreverá, a não ser os nomes e os números necessários das pessoas e das coisas.

Que boa impressão a de ser-se uma parte do coral, um grito em meio às vozes que clamam o gol, um gemido noturno, entre os muitos e repetidos gemidos, na imensa e fria sala do hospital de indigentes! E que absurda e amiga paz a de saber-se que a lua e a flor, o rio e a queixa, nada foi mais lua ou flor, mais rio ou mais queixa, por causa do que se disse. A própria mulher foi sempre bela ou fêmea, antes e a salvo da minha poesia e das minhas mãos!

Vivi entre o que viveu. Fui multidão e povo, um lugar ocupado, uma rescendência de suor, uma voz que pediu licença, um olhar que mendigou prazeres e uma parte milesimal dos pés que povoaram. Das minhas mãos, prefiro não contar, a não ser na custosa confissão de que foram mãos vadias. De bem, fizeram a bênção e o carinho... mas o carinho é vadio e, em toda vez que se aparta de Deus, é proibido. Prevalece, portanto, o existente da multidão, o corista, aquele que não foi o solista de beleza alguma e que, por isso, se sente irresponsabilizado dos erros de maneira especial e destacada!

Sou o rosto fora de foco de uma fotografia em que dezenas de pessoas aparecem em segundo plano. Posso ter ou não a barba crescida; posso trazer ou não uma flor no peito; posso chorar até, e ninguém botará reparo. A fotografia passará de mão em mão e todos os que comigo estiverem desfocados só serão odiados quando não houver mais nada a odiar em primeiro plano.

Só assim é – se o homem real e constante – o que sente o gosto e o cheiro da vida. A maioria se evade de sua condição real, para fazer ou imitar o êxito. Entretanto, só o êxito casual é verdadeiro. Exemplo de êxito casual: a beleza. Exemplo de beleza: a mulher bela. Uma mulher sentou-se à minha frente. Tinha luz própria... E tanta, que um fanal de evidente claridade iluminou minhas mãos, quando em gestos inúteis (as mãos) procuravam supor os seus múltiplos encantos. Mas não me quero perder além do homem real e constante, portanto, desenvolto.

Só farei, sem pudor e remorso, aquilo que fizer com desenvoltura. Principalmente, a poesia e o amor. O amor ou é desacanhado, destro, irrefletido... ou é suor. A poesia também. Por isso volta-se a multidão, vivem-se as imunidades corais e espera-se a vinda casual da poesia e do amor.

Sou o homem real, que sua, que mente, que disfarça, que teme, que inveja e cobiça. Tive e tenho os meus momentos de suicida. Não gosto que me conheçam aquém e além de um homem constantemente exposto ao erro e ao crime. É dever do ser humano pressentir em seu semelhante um sem-número de intimidades inconfessáveis. O grande e verdadeiro amor ao próximo é aquele que ama os erros mostrados e pressupostos.

Além da verdade, só existe a multidão, que exime o homem das proclamações e o ampara das consequências de sua coragem. Depois de cumprida a Verdade, ter-se-á conquistado o silêncio. “O silêncio alcançado à custa de sempre dizer a mesma coisa” (João Cabral de Melo Neto).

Só creio em dois estados de lucidez: o dos bêbados e dos poetas. Ambos são negados. Mas essa negação ainda não é a definitiva. Lucidez não é, por exemplo, comprar-se uma vitrola por cem dólares e se vendê-la por vinte contos. Isto seria melhor chamado de “paciência”... ou “organização”... ou ainda “paciência organizada”.

Lucidez não é ainda ir-se hoje para Brasília e voltar-se, daqui a três anos, com cem milhões. A isto eu chamaria de “disciplina para fazer o fácil”.

A grande lucidez dos poetas estaria, por exemplo, neste verso de Fernando Pessoa: “Em tudo quanto olhei, fiquei em parte”. A lucidez dos bêbados é difícil de defender, porque existem mil bêbados diferentes na humanidade. Mil que partem de dois: o bom e o mau. Ambos são lúcidos e, se um desagrada, é porque sua natureza repele o estado angelical e luzente da bebedice.

O conhecimento incessante da verdade faz com que o homem caminhe para o anjo. Chegarão primeiro os que mais depressa conheceram ao seu semelhante, tanto quanto a si mesmo. Nunca foi impossível o exato conhecimento próprio. É necessária, porém, a coragem bastante, para que cada qual se veja e se pegue, se espie e se apalpe, em cada um dos seus mais íntimos espaços físicos e morais.

Que as constantes feiúras a encontrar não nos retraia os olhos (no caso, o sentir) e as mãos. Depois, será mais fácil conhecer-se o próximo. E depois, então, mesmo que se minta, só se saberá da utilidade e do consolo da verdade. Faltará ânimo para o fingimento e a fuga, quando acreditarmos em que ninguém engana ninguém e em que somos capazes de conhecer o próximo, desde o instante inicial do primeiro conhecimento.

A sintomatologia do mal é evidente e constante. O homem mau ri errado. Por isso, deve-se viver em multidão. Falar e rir em coro, andar e parar em batalhões. Viver entre os que, simplesmente, estiverem vivendo. A vida coral nos alivia da obrigação do êxito, do êxito que é casual (e verdadeiro) ou é fabricado e cínico. Desconfiai dos feitos que são repetidamente comemorados com jantares e missas de ação de graças!

É esta uma simples canção de fim de ano. Escrevia, confessando-me e comprometendo-me em cada uma das minhas pequenas descobertas. Se não atingi, rondei mais das vezes a insolente verdade dos homens e das coisas. Em vez disso, escreveria uma crônica de Natal... Mas, em tudo o que eu dissesse do Nascimento de Cristo e fraternidade humana, correria o erro constante de repetir: “Natal, Natal, bimbalham os sinos...”.

(14/12/1956)

Instrumento sem dó



Por Ivan Lessa

Depois de mais de duas décadas de Grã-Bretanha, acho que já dá, de vez em quando, para eu enfileirar as coisas que gosto e desgosto aqui por estas ilhas.

As coisas que eu gosto ficam para outro dia, uma vez que aqui aprendi a ter o maior cuidado em não parecer que estou – conforme dizíamos – “puxando o saco”.

Além do mais, se é que estou bem lembrado, basta a gente elogiar uma coisa do estrangeiro, vivendo-se nele, que logo vem alguém para criticar a nossa – e lá vêm aspas de novo – “falta de patriotismo”.

Eu não aceitei diversas coisas ligadas à cozinha.

Outras me souberam ao paladar com a naturalidade de uma média com pão e manteiga.

É o caso do café da manhã reforçado inglês.

Aquele que vem com feijão branco de forno, salsicha inglesa (25% é pão), cogumelos e um tomate quente e sem casca feito na panela. Com um ovo estrelado, claro.

Mas aí já estou falando do que eu passei a gostar. Não é esse, hoje, meu objetivo.

Não gosto de 80% dos programas de humor da televisão. É tudo muito físico demais para meu gosto.

Sou mais os americanos, em matéria de enlatados.

O cinema também não desce redondo. Dele, faço a mesma crítica que os franceses, que juram inexistir cinema inglês.

Há, no entanto, porque o mundo e todos seus habitantes são um poço misterioso, a possibilidade de eu estar criticando exatamente como eles, os ingleses, se criticam. Essas coisas – who knows? – pegam.

Tudo isso para chegar onde eu gostaria de não estar: perto de uma gaita de foles.

Para mim a pior coisa que há na Grã-Bretanha são as gaitas de foles, em todas as suas variações.

Mesmo em situação fúnebre, o lúgubre das gaitas de foles me soa quase que uma palhaçada e um exagero de deboche em meio a uma situação seríssima.

Todos os lugares-comuns me ocorrem: a gaita de foles soa como um saco de gatos protestando contra a iminência de serem jogados no rio.

Eu pensava que gaita de foles só na Escócia. Enganei-me em si bemol.

Elas estão em toda parte. Os irlandeses as manuseiam com – só pode ser – maldade inaudita.

E agora, fico sabendo, no sábado, 6 de abril, Sean Connery, ator que eu admirava, vai liderar 10 tocadores, ou executores, de gaita de foles em Nova York, uma cidade que já teve, do ano passado para cá, coisas bastantes com que se chatear.

Mais: os jornais me informam que as 10 mil gaitas de foles estarão representando 30 países.

Não sei se o Brasil consta da lista. Atenção, cuidado: a gaita de foles é ardilosa.

Se bobearem ela chega ao forró e acaba com ele.

Se isso é ou não desejável, não cabe a mim opinar.

Recado ao sr. 903



Por Rubem Braga

Quem fala aqui é o homem do 1003. Recebi outro dia, consternado, a visita do zelador do prédio, que me mostrou a carta em que o senhor reclamava contra o barulho em meu apartamento. Recebi depois a sua própria visita pessoal – devia ser meia-noite – e a sua veemente reclamação verbal.

Devo dizer que estou desolado com tudo isso, e lhe dou inteira razão. O regulamento do prédio é explícito e, se não o fosse, o senhor ainda teria ao seu lado a lei e a polícia. Quem trabalha o dia inteiro tem direito ao repouso noturno e é impossível repousar no 903 quando há vozes, passos e músicas no 1003.

Ou melhor: é impossível ao 903 dormir quando o 1003 se agita; pois como não sei o seu nome nem o senhor sabe o meu, ficamos reduzidos a ser dois números, dois números empilhados entre dezenas de outros.

Eu, 1003, me limito a leste pelo 1005, a oeste pelo 1001, ao sul pelo Oceano Atlântico, ao norte pelo 1004, ao alto pelo 1103 e embaixo pelo 903 que é o senhor. Todos esses números são comportados e silenciosos; apenas eu e o Oceano Atlântico fazemos ruído e funcionamos fora dos horários civis; nós dois apenas nos agitamos e bramimos ao sabor da maré, dos ventos e da lua.

Prometo sinceramente adotar, depois das 22 horas, de hoje em diante, um comportamento de manso lago azul. Prometo. Quem vier à minha casa (perdão; ao meu número) será convidado a se retirar às 21:45, e explicarei: o 903 precisa repousar das 22 às 7 pois às 8 deve deixar o 783 para tomar o 109 que o levará até o 527 de outra rua, onde ele trabalha na sala 305.

Nossa vida, vizinho, está toda numerada, e reconheço que ela só pode ser tolerável quando um número não incomoda outro número, mas o respeita, ficando dentro dos limites de seus algarismos. Peço-lhe desculpas – e prometo silêncio.

Mas que me seja permitido sonhar com outra vida e outro mundo, em que um homem batesse à porta do outro e dissesse: “Vizinho, são três horas da manhã e ouvi música em tua casa. Aqui estou”. E o outro respondesse: “Entra, vizinho, e come de meu pão e bebe de meu vinho. Aqui estamos todos a bailar e cantar, pois descobrimos que a vida é curta e a lua é bela”.

E o homem trouxesse sua mulher, e os dois ficassem entre os amigos e amigas do vizinho entoando canções para agradecer a Deus o brilho das estrelas e o murmúrio da brisa nas árvores, e o dom da vida, e a amizade entre os humanos, e o amor e a paz.

quarta-feira, fevereiro 21, 2018

A pajelança de João da Mata


Luiz Lobão e Áureo Petita no Canto do Fuxico

Abril de 1976. Fazia dez anos que o time do Maués, da Cachoeirinha, não ganhava do time do Náutico, do Beco do Macedo, em partidas oficiais pelo campeonato amador, quando Áureo Petita e Luiz Lobão vestiram pela primeira vez a camisa do Maués, na época dirigido pelo técnico Luiz Calango.

Jogando ao lado de Gilberto, Ernâni, Vivaldo, Erasmo, Mário Rato e Alcides, os dois ex-craques do Murrinhas do Egito fizeram uma exibição de gala e o Maués enfiou 4 a zero no Náutico, com três gols de Luiz Lobão e um do endiabrado Áureo Petita, depois de ele ter driblado a zaga inteira da equipe adversária.

Assim que o jogo terminou, João Zaranza, dono do Náutico, chamou Luiz Lobão e Áureo Petita para uma conversa reservada. Se os dois topassem jogar pelo seu time, ele empregaria ambos na Fogás, onde exercia o cargo de gerente da Manutenção. Os dois toparam.

Luiz Lobão foi trabalhar como estoquista e Áureo, como frentista da bomba de gasolina dos veículos da manutenção. Puto da vida, o técnico do Maués, Luiz Calango, passou uma semana inteira andando pelo bairro disposto a enfiar uma peixeira cega no bucho dos dois “traíras”.

Na véspera do jogo de estreia dos novos reforços do time, João Zaranza chamou Luiz Lobão e Áureo Petita para uma nova conversa reservada. Os dois teriam de participar de uma sessão de descarrego no Centro de Umbanda Caboco Sete Flexas, em Petropólis, que tinha como babalorixá um outro funcionário da Fogás, João da Mata, empregado de João Zaranza e um dos mais fiéis torcedores do Náutico. Os dois toparam.

A pajelança transcorreu normalmente. Áureo Petita e Luiz Lobão ficaram apenas de cueca em um círculo de pólvora, próximo do congá. Depois de uma sequência de cânticos, o babalorixá João da Mata incorporou o exu Tranca Ruas, que retirou sete moedas de um alguidar e passou as moedas pelo corpo dos atletas.

Depois, de um segundo alguidar, Tranca Ruas retirou uma mistura de mel de abelha, azeite de dendê e gergelim e “engraxou” os pés dos atletas. Finalmente, Tranca Ruas colocou fogo na pólvora e, enquanto recitava um “ponto”, despejou sobre a cabeça dos dois atletas uma cuia contendo “banho de cheiro”, à base de alfazema, erva doce e manjericão. Feito isso, Tranca Ruas foi embora.

Na sequência, o babalorixá João da Mata deu um toque para João Zaranza, única testemunha ocular da sessão de descarrego, sem esconder a sensação de dever cumprido:

– Pronto, meu padrinho, tá tudo amarrado! Tá tudo amarrado! Só vai dar nóis!

João Zaranza se despediu do babalorixá, colocou os dois atletas no seu carro e foi deixa-los em casa.

No dia seguinte, durante o jogo de estreia dos novos reforços, nada parecia dar certo. Luiz Lobão perdeu quatro gols cara a cara com o goleiro, chutando a bola bisonhamente pra fora. Áureo Petita não conseguia dar um único drible, que tropeçava na bola e desabava de cara no chão. Não conseguiu fazer um lançamento decente nem se manter em pé em campo por mais de cinco minutos. Um vexame. O Náutico perdeu de 1 a zero. Puto da vida, João Zaranza foi tomar satisfações com o babalorixá:

– Que porra de feitiço foi aquele, João da Mata, que porra de feitiço foi aquele? O Áureo Petita e o Luiz Lobão apanharam da bola o tempo todo...

– Ué? Eles não são os fodões da Vila Mamão do time do Maués?... – reagiu o babalorixá. – Pois, o exu Tranca Ruas amarrou eles com um nó-de-cachorro da gota serena, que nunca mais aquelas duas pestes vão fazer porra nenhuma dentro de campo...

Foi um parto para João Zaranza desfazer o equívoco. Luiz Lobão e Áureo Petita tiveram que ser conduzidos às pressas para uma nova sessão de descarrego, a fim de reverter a pajelança anterior.

Deu certo. Naquele ano, o Náutico se sagrou campeão, Luiz Lobão foi o artilheiro da competição com 27 gols e Áureo Petita foi eleito o craque do ano. O babalorixá João da Mata era danado.

Aula de Inglês



Por Rubem Braga

 Is this an elephant?

Minha tendência imediata foi responder que não; mas a gente não deve se deixar levar pelo primeiro impulso. Um rápido olhar que lancei à professora bastou para ver que ela falava com seriedade, e tinha o ar de quem propõe um grave problema. Em vista disso, examinei com a maior atenção o objeto que ela me apresentava.

Não tinha nenhuma tromba visível, de onde uma pessoa leviana poderia concluir às pressas que não se tratava de um elefante. Mas se tirarmos a tromba a um elefante, nem por isso deixa ele de ser um elefante; mesmo que morra em conseqüência da brutal operação, continua a ser um elefante; continua, pois um elefante morto é, em princípio, tão elefante como qualquer outro. Refletindo nisso, lembrei-me de averiguar se aquilo tinha quatro patas, quatro grossas patas, como costumam ter os elefantes. Não tinha. Tampouco consegui descobrir o pequeno rabo que caracteriza o grande animal e que, às vezes, como já notei em um circo, ele costuma abanar com uma graça infantil.

Terminadas as minhas observações, voltei-me para a professora e disse convincentemente:

– No, it's not!

Ela soltou um pequeno suspiro, satisfeita: a demora de minha resposta a havia deixado apreensiva. Imediatamente perguntou:

– Is it a book?

Sorri da pergunta: tenho vivido uma parte de minha vida no meio de livros, conheço livros, lido com livros, sou capaz de distinguir um livro a primeira vista no meio de quaisquer outros objetos, sejam eles garrafas, tijolos ou cerejas maduras – sejam quais forem. Aquilo não era um livro, e mesmo supondo que houvesse livros encadernados em louça, aquilo não seria um deles: não parecia de modo algum um livro. Minha resposta demorou no máximo dois segundos:

– No, it's not!

Tive o prazer de vê-la novamente satisfeita – mas só por alguns segundos. Aquela mulher era um desses espíritos insaciáveis que estão sempre a se propor questões, e se debruçam com uma curiosidade aflita sobre a natureza das coisas.

– Is it a handkerchief?

Fiquei muito perturbado com essa pergunta. Para dizer a verdade, não sabia o que poderia ser um handkerchief; talvez fosse hipoteca... Não, hipoteca não. Por que haveria de ser hipoteca? Handkerchief! Era uma palavra sem a menor sombra de dúvida antipática; talvez fosse chefe de serviço ou relógio de pulso ou ainda, e muito provavelmente, enxaqueca. Fosse como fosse, respondi impávido:

– No, it's not!

Minhas palavras soaram alto, com certa violência, pois me repugnava admitir que aquilo ou qualquer outra coisa nos meus arredores pudesse ser um handkerchief.

Ela então voltou a fazer uma pergunta. Desta vez, porém, a pergunta foi precedida de um certo olhar em que havia uma luz de malícia, uma espécie de insinuação, um longínquo toque de desafio. Sua voz era mais lenta que das outras vezes; não sou completamente ignorante em psicologia feminina, e antes dela abrir a boca eu já tinha a certeza de que se tratava de uma palavra decisiva.

– Is it an ash-tray?

Uma grande alegria me inundou a alma. Em primeiro lugar porque eu sei o que é um ash-tray: um ash-tray é um cinzeiro. Em segundo lugar porque, fitando o objeto que ela me apresentava, notei uma extraordinária semelhança entre ele e um ash-tray.  Era um objeto de louça de forma oval, com cerca de 13 centímetros de comprimento.

As bordas eram da altura aproximada de um centímetro, e nelas havia reentrâncias curvas — duas ou três – na parte superior. Na depressão central, uma espécie de bacia delimitada por essas bordas, havia um pequeno pedaço de cigarro fumado (uma bagana) e, aqui e ali, cinzas esparsas, além de um palito de fósforos já riscado. Respondi:

– Yes!

O que sucedeu então foi indescritível. A boa senhora teve o rosto completamente iluminado por onda de alegria; os olhos brilhavam – vitória! vitória! – e um largo sorriso desabrochou rapidamente nos lábios havia pouco franzidos pela meditação triste e inquieta.  Ergueu-se um pouco da cadeira e não se pôde impedir de estender o braço e me bater no ombro, ao mesmo tempo que exclamava, muito excitada:

– Very well!  Very well!

Sou um homem de natural tímido, e ainda mais no lidar com mulheres. A efusão com que ela festejava minha vitória me perturbou; tive um susto, senti vergonha e muito orgulho.

Retirei-me imensamente satisfeito daquela primeira aula; andei na rua com passo firme e ao ver, na vitrine de uma loja, alguns belos cachimbos ingleses, tive mesmo a tentação de comprar um. Certamente teria entabulado uma longa conversação com o embaixador britânico, se o encontrasse naquele momento. Eu tiraria o cachimbo da boca e lhe diria:

– It's not an ash-tray!

E ele na certa ficaria muito satisfeito por ver que eu sabia falar inglês, pois deve ser sempre agradável a um embaixador ver que sua língua natal começa a ser versada pelas pessoas de boa-fé do país junto a cujo governo é acreditado.

(Maio, 1945)

Beber, dever e decorar



Por Ivan Lessa

Escrevo no dia em que, no Brasil, têm início os festejos de Momo, conforme se dizia em minha época. Pior: tríduo momesco, para certos jornais e locutores de rádio.

Em sinal de solidariedade, e já que não há mais bailes decentes no Rio que foi meu e a que pertenci, estarei assistindo o desfile das escolas, em avenida ou sambódromo, e torcendo olimpicamente para que vença a melhor.

Ou seja, como todo mundo com quem me dava, estarei à distância contando com a vitória de Mangueira.

Em Londres, comemorarei os três - ou cinco ou dez - dias de carnaval, bebendo vinho e uísque e comendo coisas preparadas pelo microondas.

Como a ressaca é garantida, irei depois à farmácia para adquirir alguns remédios adequados, vitaminas e, para disfarçar o aspecto acabado de meu rosto, um ou dois produtos de beleza masculina.

O preço disso tudo é de menor importância para mim. Estou me lixando: boto tudo no cartão de crédito.

Na quarta-feira de cinzas, vou procurar mobília nova para a sala, já que, nela, a gata andou fazendo um estrago danado.

A rigor, não vou fazer nada disso. Mas o que é o "a rigor" diante do poderio, diante do charme avassalador das estatísticas?

Acabei de ficar sabendo, pelas folhas, que o dinheiro gasto em bens de consumo não essenciais, tais como os que mencionei há pouco, aumentou em cerca de 30% em termos reais nos últimos dez anos.

E que a dívida média para cada homem, mulher e criança da Grã-Bretanha é de perto de 15 mil dólares.

Isso porque as taxas de juro andam baixas.

Portanto, mais de 60% das pessoas vivem em estado de absoluto desconhecimento dos problemas econômicos globais.

É verdade. Ou deve ser verdade.

Só pode ser por isso que venho envelhecendo melhor do que as mulheres britânicas que vejo todo dia no elevador ou no metrô.

Não que eu tenha notado nada. Mas as pesquisas afirmam isso: a expectativa de vida está aumentando para os homens.

Que é, então, onde o círculo, a carnavalesca serpentina da vida, se fecha: só pode ser a bebida, as dívidas irresponsáveis e o vivo interesse por questões ligadas à decoração.

sexta-feira, fevereiro 16, 2018

O problema do onde



Por Ruy Castro

Uma das maiores preocupações dos garotos de 1968, além da ditadura militar e da guerra do Vietnã, era namorar. Não que faltasse com quem. O problema era onde. Namorar era um eufemismo para fazer amor, o qual era um eufemismo para o muito mais realista fazer sexo. A pílula já era uma realidade e, naquele ano, em certos círculos do Rio, a virgindade feminina se tornara um tabu ao contrário: uma garota que chegasse virgem aos 19 anos tinha vergonha de admitir isso para colegas.

Se fossem solicitados a resolver o problema das meninas, os rapazes estariam sempre dispostos a ir para o sacrifício. Mas, onde? Os motéis ainda não existiam, os hotéis para encontros ficavam na longínqua São Conrado e quase ninguém tinha carro ou dinheiro. No desespero, ia-se para a praia à noite, principalmente a do Leblon. Era escura, deliciosamente mal iluminada, deserta e, exceto por algum guarda enxerido e achacador, com privacidade garantida. Os problemas eram o desconforto e a areia, donde a expressão “sexo à milanesa”.

A alternativa, para os poucos que tinham carro, era a corrida de submarino – uma modalidade esportiva noturna, praticada por casais no banco da frente de seus Gordinis ou Aero-Willys, com os vidros fechados e embaçados, na orla do Arpoador ou do Castelinho. Nunca se viu um submarino ao largo, mas a prática era tão socialmente aceita que uma Kombi do General ficava de plantão nas proximidades, para o indispensável cachorro-quente de depois.

Mais seguras eram as garçonnières dos amigos. Garçonniéres eram quarto-e-salas mantidos por homens casados para suas piruetas extraconjugais. Como não as usavam todo dia, às vezes emprestavam-nas por algumas horas aos amigos e, de repente, sem que soubéssemos como, a chave caía na nossa mão, sob a condição de que fôssemos mais rápidos ainda.

Uma delas, por volta de 1966 ou 67, ficava na rua Paula Freitas, em Copacabana. Ali, muitas vezes estivemos a ponto de morrer de prazer. Pois imagine o susto ao ler nos jornais, em 1969 ou 70, que aquele endereço acabara de “cair”. Fora tomado pelos órgãos de segurança, por se tratar de um “aparelho” da VPR – a Vanguarda Popular Revolucionária, um dos grupos da luta armada –, com ninho de metralhadoras e tudo, debaixo da cama. E nunca soubemos se, desde sempre, o cafofo da Paula Freitas já não era um “aparelho”, só que também usado para fins imorais.

Mais alguns anos se passaram e o romantismo do sexo à milanesa e da corrida de submarino foi substituído pelo profissionalismo dos motéis, com seus tetos espelhados, camas redondas e risco zero. Os nativos se habituaram a esse conforto e assim é até hoje.

Tudo isso foi há muito, muito tempo. Desde então, tivemos a libertação da mulher, duas ou três revoluções sexuais, a ascensão e o declínio da Aids, a incrível volta da camisinha e uma brutal expansão imobiliária, mas, para muita gente, nada mudou – o problema de onde continua. Os adolescentes sempre terão de improvisar nesse departamento, seja de escada de serviço do prédio, entre um andar e outro, ou na hora do recreio, atrás do murundu.

Em 1983, Darcy Ribeiro, então vice-governador do Rio, anunciou que, depois do Sambódromo, mandaria construir um Beijódromo. O qual nunca chegou a existir e ainda bem, porque era uma falsa boa ideia. Todo exibicionismo é bobo, ainda mais quando permitido. Sexo é sempre ótimo, mas, com transgressão e risco, é muito melhor.

quinta-feira, fevereiro 15, 2018

O mocó está de luto: Paulo Figueiredo e Jorge Tufic não moram mais aqui!



Em menos de uma semana, dois grandes amigos atravessaram o espelho. O advogado, professor universitário, jornalista e escritor amazonense Paulo Figueiredo faleceu na madrugada do dia 9, sexta-feira, em São Paulo, após passar por uma cirurgia no hospital Sírio Libanês.

Paulo Figueiredo foi articulista de diversos veículos de imprensa no Amazonas, incluindo um período como colaborador do jornal A Crítica. 

Sua última obra lançada foi “Náufragos da Esperança – Corrupção e Incompetência na República Lulopetista”, na qual analisa, com olhar crítico, os anos de governo do PT no Brasil.

Ele também escreveu “O Cesteiro Inglês” e o “O Golpe Militar no Amazonas – Crônicas e Relatos”.

Além da carreira na comunicação e no Direito, ele também foi secretário de Estado de Relações Internacionais no primeiro governo de Amazonino Mendes.

O Governo do Estado publicou uma nota de pesar pelo falecimento de Figueiredo, prestando “condolências aos familiares e amigos nesse momento de perda”.

A Ordem dos Advogados do Brasil Seccional do Amazonas (OAB-AM), na qual Paulo Figueiredo era registrado com o número 547, também manifestou pesar pela morte dele.

O velório foi realizado no sábado, após o corpo ser encaminhado de São Paulo a Manaus.


Já o jornalista e poeta Jorge Tufic Alaúzo, autor da letra do Hino do Amazonas, morreu nesta quarta-feira, 14, também em São Paulo. Ele tinha 87 anos e lutava contra um câncer no pulmão.

Nascido em Sena Madureira (AC), em 1930, Tufic foi membro da Academia Amazonense de Letras e publicou inúmeros livros.

Aos 12 anos de idade, o escritor se transferiu para Manaus, onde realizou estudos secundários.

Mais tarde, militou na imprensa de Manaus e foi um dos fundadores do Clube da Madrugada, tendo ocupado também a direção da Fundação Cultural do Amazonas.

Em 1976, foi agraciado com o diploma “O Poeta do Ano”, prêmio concedido pelo Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Amazonas, em reconhecimento à sua vasta e intensa atividade literária.

Jorge Tufic era sócio-fundador da Academia Internacional Pré-Andina de Letras, em Tabatinga (a 1.108 quilômetros a oeste de Manaus), além de fazer parte do Conselho Estadual de Cultura.

O poeta acreano foi o vencedor do concurso nacional lançado, em 1980, pelo então governador do Estado, Jorge Lindoso, para a escolha do hino do Amazonas.

Desde 1969, Tufic ocupava a cadeira de nº 18 da Academia Amazonense de Letras, que tem como patrono o poeta Jonas da Silva.

Dentre os livros publicados por Jorge Tufic estão “Varanda de pássaros”, “Chão sem mácula”, “Retrato de Mãe” e “Quando as noites voavam”.

A ex-presidente da AAL, Rosa Brito, lamentou o ocorrido. “Sentimos muito, ele era uma pessoa muito competente e querida. É mais um intelectual respeitado que se foi, ele era um excelente poeta. A sociedade amazonense e brasileira perdeu um grande poeta”, disse ela.

quinta-feira, fevereiro 08, 2018

A história pelas marchinhas



Por Bete Bissoli

Nem só de confete, serpentina, cordões, vermute e lança-perfume eram feitos nossos antigos carnavais. Claro que sem música não há carnaval! O samba, DNA musical do Brasil, o frevo, o maracatu e outros ritmos regionais sempre nos representaram muito bem, mas as marchinhas... Ah! As marchinhas! Elas foram peças fundamentais da festa!!! Mais que isso, fixaram-se no inconsciente coletivo do nosso povo mais que qualquer outro ritmo.

Elas chegaram ao Brasil no início do século passado, trazidas pelos portugueses, e se caracterizam pela mistura da marcha portuguesa com ritmos norte-americanos. O talento, a criatividade e malícia de nossos compositores se encarregaram de fazer o resto e, na década de 30, o gênero se consolidou.

Pra saber muito da história do Brasil, de política, políticos e de usos e costumes de 1920 até pelo menos 1960 é imprescindível ouvir marchinhas carnavalescas.

Poeticamente falando, é principalmente nesse repertório irônico, engraçado, espirituoso, mordaz, escrachado, esculhambador e implacável que está gravada a nossa história de pelo menos cinco décadas.

Mesmo tendo o Rio de Janeiro como berço, elas escreveram a crônica do dia-a-dia do brasileiro, foi delas a primazia de refletir uma época importantíssima e são elas que, na maior simplicidade, nos oferecem um grande aprendizado. Além de serem gostosíssimas de ouvir e de dançar.

Enquanto ritmo dançante, a marchinha carnavalesca é superdemocrática. Todos têm o direito de dançá-la, pois não é necessário saber dançar!

Não se aprende a dançar marchinha. Não é preciso... Cada um se expressa como quer, como sabe, como não sabe, como inventa! Pra dançar samba, frevo, tango ou qualquer outro gênero musical há que se aprender passos, movimentos, convenções. Na marchinha não... Basta fazer uso do espontâneo, mais nada. Pensando bem... Será por isso que a marchinha andou meio fora de circulação nos últimos tempos? Será que perdemos a simplicidade, a espontaneidade?

Não, não fiquem tristes: a marchinha carnavalesca tá voltando com força total e há um número expressivo de jovens, tanto em grandes como em pequenas cidades, que procura e curte os ambientes em que o gênero tem destaque.

Vai ver estamos recuperando o espontâneo e retomando a alegria perdida. Além do mais, o carnaval é uma festa tão democrática! Por que não abrir espaço para as marchinhas carnavalescas tanto quanto se abre para outras vertentes de nossa música popular como o samba, axé music, samba-reggae, etc?

Quem não se lembra, e quem não gosta, de “Mamãe Eu Quero” (Vicente Paiva/Jararaca); “A Jardineira” (Benedito Lacerda/Humberto Porto); “Pó de Mico” (Dora Lopes/Renato Araujo/A. Souza); “Me Dá Um Dinheiro Aí” (Homero Ferreira/Ivan Glauco); “Fantasia de Toalha” (Sacomani/Arrelia/Ercílio Consoni); “Índio Quer Apito” (H. Lobo/Milton de Oliveira); “Roubaram a Mulher do Rui” (José Messias); “Vai com Jeito” (João de Barro); “Transplante Corintiano” (Manoel Ferreira/Ruth Amaral/Gentil Júnior); “Joga a Chave Meu Amor” (J. R. Kelly/J. Rui)?

Quem não brincou velhos e novos carnavais ao som de “Máscara Negra” (Pereira Matos/Zé Kéti); “Aurora” (Mário Lago/Roberto Riberti); “A Lua É dos Namorados” (Cavalcanti/Klécius Caldas/Brasinha); “Cachaça” (Mirabeau/L. de Castro/H. Lobato); “Turma do Funil” (Mirabeau/Milton de Oliveira/Urgel de Castro); “Me Dá um Gelinho” (Manoel Ferreira/Ruth Amaral) “Cabeleira do Zezé” (João R. Kelly/Roberto Faissal); “Alá-lá-ô” (Nássara/H. Lobo) e “Taí”, de Joubert de Carvalho?

O amor, o preconceito, a traição, as louras, morenas e mulatas, nomes de mulher, homenagens, profissões, falta de água, luz, tudo enfim que fez ou faz parte do nosso cotidiano já foi abordado à exaustão nas marchinhas, mas sempre mantendo a originalidade, simplicidade, graça e criatividade. Daí o encanto de suas letras.

Por Bete Bissoli

Nem só de confete, serpentina, cordões, vermute e lança-perfume eram feitos nossos antigos carnavais. Claro que sem música não há carnaval! O samba, DNA musical do Brasil, o frevo, o maracatu e outros ritmos regionais sempre nos representaram muito bem, mas as marchinhas… Ah! As marchinhas! Elas foram peças fundamentais da festa!!! Mais que isso, fixaram-se no inconsciente coletivo do nosso povo mais que qualquer outro ritmo.

Elas chegaram ao Brasil no início do século passado, trazidas pelos portugueses, e se caracterizam pela mistura da marcha portuguesa com ritmos norte-americanos. O talento, a criatividade e malícia de nossos compositores se encarregaram de fazer o resto e, na década de 30, o gênero se consolidou.

Pra saber muito da história do Brasil, de política, políticos e de usos e costumes de 1920 até pelo menos 1960 é imprescindível ouvir marchinhas carnavalescas.

Poeticamente falando, é principalmente nesse repertório irônico, engraçado, espirituoso, mordaz, escrachado, esculhambador e implacável que está gravada a nossa história de pelo menos cinco décadas.

Mesmo tendo o Rio de Janeiro como berço, elas escreveram a crônica do dia-a-dia do brasileiro, foi delas a primazia de refletir uma época importantíssima e são elas que, na maior simplicidade, nos oferecem um grande aprendizado. Além de serem gostosíssimas de ouvir e de dançar.

Enquanto ritmo dançante, a marchinha carnavalesca é superdemocrática. Todos têm o direito de dançá-la, pois não é necessário saber dançar!

Não se aprende a dançar marchinha. Não é preciso… Cada um se expressa como quer, como sabe, como não sabe, como inventa! Pra dançar samba, frevo, tango ou qualquer outro gênero musical há que se aprender passos, movimentos, convenções. Na marchinha não… Basta fazer uso do espontâneo, mais nada. Pensando bem… Será por isso que a marchinha andou meio fora de circulação nos últimos tempos? Será que perdemos a simplicidade, a espontaneidade?

Não, não fiquem tristes: a marchinha carnavalesca tá voltando com força total e há um número expressivo de jovens, tanto em grandes como em pequenas cidades, que procura e curte os ambientes em que o gênero tem destaque.

Vai ver estamos recuperando o espontâneo e retomando a alegria perdida. Além do mais, o carnaval é uma festa tão democrática! Por que não abrir espaço para as marchinhas carnavalescas tanto quanto se abre para outras vertentes de nossa música popular como o samba, axé music, samba-reggae, etc?

Quem não se lembra, e quem não gosta, de “Mamãe Eu Quero” (Vicente Paiva/Jararaca); “A Jardineira” (Benedito Lacerda/Humberto Porto); “Pó de Mico” (Dora Lopes/Renato Araujo/A. Souza); “Me Dá Um Dinheiro Aí” (Homero Ferreira/Ivan Glauco); “Fantasia de Toalha” (Sacomani/Arrelia/Ercílio Consoni); “Índio Quer Apito” (H. Lobo/Milton de Oliveira); “Roubaram a Mulher do Rui” (José Messias); “Vai com Jeito” (João de Barro); “Transplante Corintiano” (Manoel Ferreira/Ruth Amaral/Gentil Júnior); “Joga a Chave Meu Amor” (J. R. Kelly/J. Rui)?

Quem não brincou velhos e novos carnavais ao som de “Máscara Negra” (Pereira Matos/Zé Kéti); “Aurora” (Mário Lago/Roberto Riberti); “A Lua É dos Namorados” (Cavalcanti/Klécius Caldas/Brasinha); “Cachaça” (Mirabeau/L. de Castro/H. Lobato); “Turma do Funil” (Mirabeau/Milton de Oliveira/Urgel de Castro); “Me Dá um Gelinho” (Manoel Ferreira/Ruth Amaral) “Cabeleira do Zezé” (João R. Kelly/Roberto Faissal); “Alá-lá-ô” (Nássara/H. Lobo) e “Taí”, de Joubert de Carvalho?

O amor, o preconceito, a traição, as louras, morenas e mulatas, nomes de mulher, homenagens, profissões, falta de água, luz, tudo enfim que fez ou faz parte do nosso cotidiano já foi abordado à exaustão nas marchinhas, mas sempre mantendo a originalidade, simplicidade, graça e criatividade. Daí o encanto de suas letras.

Foi pensando nisso que selecionei algumas, entre milhares, e convido você para, juntos, observarmos o recado poético que elas nos mandam. Então, vamos lá?

A primeira marcha feita especialmente para carnaval foi “Ó Abre Alas”, uma marcha-rancho de Chiquinha Gonzaga, encomendada pelos foliões do Cordão Rosa de Ouro, em 1899. Essa música é importantíssima, pois antecipou em vinte anos a fixação desse gênero musical no Brasil: “Ó abre-alas que eu quero passar/ Eu sou da Lira, não posso negar/ Ó abre alas que eu quero passar/ Rosa de Ouro é quem vai ganhar”.

O triângulo amoroso Colombina, Pierrô e Arlequim foi retratado por Noel Rosa e Heitor dos Prazeres com extraordinária veia humorística em “Pierrô Apaixonado”: “Um Pierrô apaixonado/ Que vivia só cantando/ Por causa de uma Colombina/ Acabou chorando, acabou chorando!/ A Colombina entrou no botequim/ Bebeu, bebeu, saiu assim, assim/ Dizendo: ‘Pierrô cacete! Vai tomar sorvete com o Arlequim!’/ Um grande amor tem sempre um triste fim/ Com o Pierrô aconteceu assim/ Levando este grande chute/ Foi tomar vermute com amendoim”.

As questões habitacionais sempre foram ótimo tema a ser enfocado por nossos compositores, como na espirituosa “Marcha do Caracol”, de Peter Pan/Afonso Teixeira: “Há quanto tempo não tenho onde morar/ Se é chuva apanho chuva/ Se é sol apanho sol/ Francamente, pra viver nessa agonia/ Eu preferia ter nascido caracol/ Levava a minha casa nas costas muito bem/ Não pagava aluguel nem luvas a ninguém!/ Morava um dia aqui, um outro acolá/ Leblon, Copacabana, Madureira ou Irajá!”

“Pedreiro Waldemar”, de Roberto Martins/Wilson Batista, aborda o tema pelo lado do protesto social: “Você conhece o pedreiro Waldemar?/ Não conhece, mas eu vou lhe apresentar/ De madrugada toma o trem da circular/ Faz tanta casa e não tem casa pra morar/ Leva a marmita embrulhada no jornal/ Se tem almoço, nem sempre tem jantar/ O Waldemar, que é mestre no ofício/ Constrói o edifício e depois não pode entrar”.

“Maria Candelária”, de Klécius Caldas/Armando Cavalcanti, satiriza funcionários públicos de alto escalão, hoje chamados de funcionários que têm QI (quem indica): “Maria Candelária é alta funcionária/ Saltou de pára-quedas, caiu na letra ó, ó, ó, ó, ó!/ Começa ao meio-dia/ Coitada da Maria!/ Trabalha, trabalha/Trabalha de fazer dó, ó, ó, ó, ó!/ À uma, vai ao dentista/ Às duas, vai ao café/ Às três, vai à modista/ Às quatro, assina o ponto e dá no pé!/ Que grande vigarista que ela é!…”.

Depois de anos de ditadura, tempo em que era obrigatório pôr a foto do líder da nação na parede de todas as repartições públicas, em 1945 Getúlio Vargas foi deposto. As fotografias foram retiradas das paredes. Em 50, ele candidatou-se à presidência e venceu as eleições. As fotos voltaram aos seus lugares, daí o “Retrato do Velho”, de Haroldo Lobo/Marino Pinto: “Bota o retrato do velho outra vez/ Bota no mesmo lugar/ O sorriso do velhinho/ Faz a gente trabalhar, oi!/ Eu já botei o meu/ E tu não vais botar?/ Já enfeitei o meu/ E tu vais enfeitar?/ O sorriso do velhinho/ Faz a gente se animar, oi!”

Já que estamos tratando de crítica política, vamos agora a uma marchinha que fala dos bajuladores e tem tudo a ver com o assunto: “Cordão dos Puxa-Sacos”, de Frazão e Roberto Martins, que diz: “Lá vem o cordão dos puxa-sacos, dando vivas aos seus maiorais/ Quem está na frente é passado pra trás/ E o cordão dos puxa-sacos cada vez aumenta mais/ Vossa Excelência, Vossa Eminência/ Quanta reverência nos cordões eleitorais/ Mas se o doutor cai do galho e vai ao chão/ A turma toda ‘evolui’ de opinião/ E o cordão dos puxa-sacos cada vez aumenta mais”.

Não poderiam faltar na lista duas marchinhas que fizeram sucesso duas vezes, ao serem lançadas e, mais recentemente, quando foram temas de novelas da Rede Globo: “Sassaricando”, de Luiz Antônio/Zé Mario/Oldemar Magalhães, de sentido ambíguo, é uma delas: “Sá-sassaricando/ Todo mundo leva a vida no arame/ Sá-sassaricando/ A viúva, o brotinho e a madame!/ O velho, na porta da Colombo/ É um assombro/ Sassaricando/ Quem não tem seu sassarico/ Sassarica mesmo só/ Porque sem sassaricar/ Essa vida é um nó”.

“Cadê Zazá?”, de Roberto Martins/Ari Monteiro, fala de uma “dispensada” rápida e fulminante: “Cadê Zazá, cadê Zazá?/ Saiu dizendo: ‘Vou ali e volto já’/ Mas não voltou… Por quê? Por que será?/ Cadê Zazá, Zazá, Zazá?/ Sem ela vou vender o bangalô/ Que tem tudo mas não tem o seu amor/ Sem ela, pra que serve geladeira?/ Pra que ventilador?/ Pergunto, ninguém diz onde ela está/ Cadê Zazá, Zazá, Zazá?”.

“Maria Escandalosa”, composta por Klécius Caldas/Armando Cavalcanti, junta uma bem-humorada crítica comportamental com um quê de sensualidade: “Maria escandalosa/ Desde criança sempre deu alteração/ Na escola, não dava bola/ Só aprendia o que não era da lição/ Depois a Maria cresceu/ Juízo que é bom encolheu/ E a Maria escandalosa/ É muito prosa, é mentirosa, mas é gostosa/ Hoje ela não sabe nada/ De história, de geografia/ Mas seu corpo de sereia/ Dá aulas de anatomia/ Maria escandalosa/ É muito prosa, é mentirosa, mas é gostosa”.

O duplo sentido também é marca de “Diabo sem Rabo”, de Haroldo Lobo/M. de Oliveira: “A minha fantasia é de diabo/ Só falta o rabo, só falta o rabo/ Eu vou botar um anúncio no jornal:/ Precisa-se de um rabo pra brincar no carnaval/ Já comprei lança, carapuça, comprei tudo/ Até o pé-de-pato e a capa de veludo/ Mas, que diabo! Puxa, puxa, que diabo!/ Depois de tudo pronto eu notei que falta o rabo”.

“Papai Adão”, de Klécius Caldas/Cavalcanti, comenta de forma bem-humorada a supremacia feminina: “Papai Adão, papai Adão/ Papai Adão já foi o tal/ Hoje é Eva quem manobra/ E a culpada foi a cobra/ Uma folha de parreira/ Uma Eva sem juízo/ Uma cobra traiçoeira/ Lá se foi o paraíso/ Hoje é Eva quem manobra/ E a culpada foi a cobra”.

Nas questões político-econômicas, nada melhor que um recado desaforado aos norte-americanos com “Yes! Nós Temos Bananas” (João de Barro/Alberto Ribeiro): “Yes! Nós temos bananas/ Bananas pra dar e vender/ Banana, menina, tem vitamina/ Banana engorda e faz crescer/ Vai para a França o café/ Pois é!/ Para o Japão o algodão/ Pois não!/ Pro mundo inteiro/ ”Home”ou mulher/ Bananas para quem quiser”.

Se o carnaval pode ser responsável por muitos amores desfeitos, ele também pode salvar grandes amores. Certamente ao som de “Bandeira Branca”, de Max Nunes/Laércio Alves, muitos casais ficaram de bem em um baile carnavalesco: “Bandeira branca, amor/ Não posso mais/ Pela saudade que me invade/ Eu peço paz/ Saudade, mal de amor, de amor/ Saudade, dor que dói demais/ Vem, meu amor/ Bandeira branca, eu peço paz”.

Para fechar esta série de marchinhas tão representativas dentro da história musical brasileira, nada melhor que o “Hino do Carnaval Brasileiro”, composto por Lamartine Babo: “Salve a morena! A cor morena do Brasil fagueiro/ Salve o pandeiro! Que desce o morro pra fazer a marcação/ São, são, são, são quinhentas mil morenas! Louras, cor de laranja, cem mil/ Salve, salve, meu carnaval Brasil/ Salve a lourinha! Dos olhos verdes cor da nossa mata/ Salve a mulata! Cor do café, a nossa grande produção!/ São, são, são, são quinhentas mil morenas/ Louras, cor de laranja, cem mil/ Salve, salve, meu carnaval Brasil!”.

Um supercarnaval às galeras de todas as idades, com alegria, mas também muito cuidado para não estragar o carnaval de outras pessoas e nem seu próprio carnaval!


Bete Bissoli é jornalista e compositora

Mulher na Vara comemora 25 anos de carnaval



Vinte e cinco carnavais. Vinte e cinco anos carregando uma vara de quase cinco metros pelas ladeiras, que serve de palco para a mulherada fazer evoluções no meio da folia. O bloco Mulher na Vara, tradicional agremiação do Carnaval olindense, sai às ruas em 2018 com uma alegria especial: a de comemorar bodas de prata de frevo, descontração, animação e muitas histórias engraçadas.

A comemoração já começou no mês passado, quando aconteceu, no Catamaran, um baile com shows de Beto Barbosa, Samba LED e orquestra de frevo. Convidados como Nono Germano, André Rio e Josildo Sá, além de Jota Michiles e Nena Queiroga, homenageados do Carnaval do Recife em 2018, deram uma canja na festa do bloco que, assim como muitos da folia olindense, surgiu “por acaso”.

“Era o carnaval de 1992 e uma amiga do criador da Vara, Carlos Porciúncula, torceu o pé quando estava em Olinda, ficando impossibilitada de caminhar. Os amigos decidiram então carregá-la pelas ladeiras. Primeiro, no braço; depois, usando um pedaço de madeira que acharam pelo caminho. Não demorou para começarem a falar: ‘Olha a mulher na vara, olha a mulher na vara’. Achamos que era um bom nome para um bloco e, no outro ano, o Mulher na Vara estreou no carnaval”, explica Samuel Costa, um dos diretores da agremiação.

Desde então, sempre na segunda-feira de carnaval, o Mulher na Vara coloca o estandarte nas ruas, partindo da Ladeira da Boa Hora, onde fica sua sede.

“O bloco é democrático. Na Vara sobem baixinhas, gordinhas, mulheres de todas as idades. E procuramos sempre respeitar todas. É uma brincadeira saudável da qual a minha filha participa, Dona Dá (moradora ilustre da Cidade Alta que organiza o encontro de bois no carnaval) participa, ou seja, qualquer foliã animada pode subir na Vara e fazer sua festa”, faz questão de salientar Samuel.

Um pouquinho de coragem é necessário também, já que a Vara é erguida a quase dois metros de altura. É subir e confiar na força dos “carregadores” da Vara e dos deuses do carnaval, claro.

A história da marchinha “Índio quer apito”



A marchinha “Índio quer apito” é uma das músicas mais tocadas nas ruas do Brasil durante o carnaval. Segundo o cantor baiano Walter Levita, numa visita a uma comunidade indígena na Ilha do Bananal, no início dos anos 60, a esposa do então presidente Juscelino Kubitschek, Sarah Kubitschek, havia levado muitas bugigangas para agradar os índios.

Na hora em que ela tentava colocar um colar no pescoço do chefe índio (que era bem mais alto do que ela), a primeira-dama soltou um sonoro “pum”.  Aí o chefe, inocentemente, ou sacanamente, teria dito a famosa frase que passaria a circular no anedotário carioca.

Em 1961 os dois excelentes compositores carnavalescos, Haroldo Lobo e Milton de Oliveira, aproveitando essa fofocaria do povo, driblaram a censura lançando a maliciosa marchinha “Índio quer apito”:

Ê, ê, ê, ê, ê, índio quer apito / Se não der, pau vai comer! / Ê, ê, ê, ê, ê, índio quer apito / Se não der, pau vai comer! / Lá no bananal mulher de branco / Levou pra índio colar esquisito / Índio viu presente mais bonito: / “Eu não quer colar! Índio quer apito!” / Ê, ê, ê, ê, ê, índio quer apito / Se não der, pau vai comer! / Ê, ê, ê, ê, ê, índio quer apito / Se não der, pau vai comer!

Momo, Arlequim, Colombina e Pierrô: conheça os personagens típicos do carnaval



Quem é quem? Você já deve ter visto um homem, geralmente bem gordinho, desfilando com roupas de rei brilhantes, carregando um cetro e uma coroa. Ou um tipo de palhaço que veste uma roupa colorida e usa máscara. Esses personagens típicos do Carnaval vêm de culturas e países distantes, mas, por diversas razões, foram entrando na festa do carnaval brasileiro.

Momo – Na mitologia greco-romana, o Momos era o Filho do Sono e da Noite. Ele ficava o tempo todo prestando atenção nas atitudes dos deuses e dos homens e fazendo graça de tudo. Era considerado o deus da Graciosidade, pois passava o tempo todo rindo e fazendo piadas dos outros. Era representado com uma máscara numa mão e uma figura ridícula na outra, para dar a entender que ele tirava a máscara dos vícios dos homens.

Com o passar do tempo, em Portugal, virou um personagem que tinha o trabalho de divertir os amos e senhores, nos castelos e nas casas dos nobres.

Ele apareceu pela primeira vez como personagem de um carnaval na Colômbia, em 1888. Uma figura alegre, brincalhona e governante da bagunça da festa.

No Brasil, surgiu em 1933, no Rio de Janeiro. Jornalistas que trabalhavam no periódico “A Noite”, inventaram um boneco de papelão e batizaram ele de O Momo.

No ano seguinte, decidiram transportar o personagem do papel para a vida real. O cronista do jornal Moraes Cardoso aceitou o cargo e eles saíram desfilando pelas ruas do Rio de Janeiro, saudando o rei! Ele foi o rei Momo pelos 15 anos seguintes, até morrer.

A tradição se manteve e, até hoje, a figura do Rei Momo é adotada nos carnavais cariocas e de outros estados. É a autoridade maior do evento e recebe até as chaves da cidade para governar durante o período de festas.


Arlequim – Esse é um personagem da antiga comédia italiana (commedia dell’arte). Usa uma roupa bem colorida, feita, em geral, com formatos de losangos. Ele tinha a função de divertir o público, nos intervalos das peças de teatro, com piadas e brincadeiras. Foi, depois, incorporado como um dos personagens das comédias e ganhou destaque nas apresentações. Virou amante da Colombina. É fanfarrão, brigão e cínico.

Colombina – Principal personagem feminina da commedia dell'arte, amante do Arlequim e companheira do Pierrô. Namoradeira, alegre, fútil, bela, esperta, sedutora e volúvel. Vestia-se de seda ou cetim branco, saia curta e usava um bonezinho.

Pierrô – Personagem também originário da commédia dell'arte, ingênuo e sentimental. Usava uma calça e um casaco bem grandes enfeitados com pompons e uma grande gola franzida.

quarta-feira, fevereiro 07, 2018

Carta à prezada sra. Carmem Lúcia


“Prezada” modo de dizer, pois não prezo por nada do que a senhora diz ou faz. Não a chamarei de ilustríssima, excelentíssima ou meretíssima. Sou médico e nunca exigi que as pessoas me tratassem por “doutor”. Leio, estupefato – palavra antiga, mas que cai bem – que a senhora declarou na abertura do ano judiciário, depois de dois meses de “merecidas” férias, que “discordar da justiça pode; o que não pode é desacatar”.

De que justiça – com “jota” minúsculo – a senhora fala? Da justiça que se omitiu e até legitimou golpes de estado e ditaduras que fizeram sofrer nossa gente? De “amigos presos/ amigos sumindo assim/para nunca mais...”? Deve ser a da Suíça, da Lua, de Marte...

Senhora, a justiça da qual a senhora fala consome um terço do orçamento da Nação Brasileira. É o mais alto orçamento do planeta. Seu poder, STF, leva mais de meio bilhão de reais por ano. Mais do que todo orçamento de nossos programas sociais. Para sustentar 11 ministros e dezenas de copeiras, motoristas, engraxates, garçons, mordomos, seguranças, etc. E a senhora vem falar em “desacatar”.

Desacato é o que a tal “justiça” faz e sempre fez ao povo brasileiro. Lembremos que um juiz , quando é pego, ao invés de ser preso, é aposentado compulsoriamente. Com todos os vencimentos em dia.

A sua “justiça” deixa de punir ladrões notórios. A senhora mesmo, num voto de Minerva – a deusa jamais concordaria com uso tão banal de seu nome –, livrou um dos maiores corruptos e traficantes de ser processado. Ontem mandou arquivar processos de outro notório corrupto por “decurso de prazo, pois engavetam por 19 anos o processo.

Vossos “penduricalhos”, como auxílio moradia, educação, creche, saúde, etc. é um acinte, num país em que o auxílio-miséria é tratado por vossa elite como apenas comprador de votos e que vosso “presidente” já ameaça extinguir de vez, em nome do chamado “estado mínimo”. Eu lhe pergunto: se o bolsa família compra votos, o auxílio moradia compra sentenças?

Hoje, leio estarrecido que uma vossa colega de São Paulo liberou o desfile de um bloco de carnaval chamado “PORÃO DO DOPS”. (No coments)

É essa justiça que a senhora se revolta quando acha que é “desacatada”. Essa “justiça” que desacata todo um povo, uma nação inteira. Meu velho pai – semi-analfabeto, porém mais sábio que a senhora – sempre disse: “direito tem quem direito anda”. E a justiça de que a senhora fala, anda, há muitos anos, muito feia. Por fora e por dentro.

Manoel Bione (médico e jornalista)

Algumas curiosidades sobre o Carnaval no Rio de Janeiro


A origem do carnaval carioca está nos entrudos promovidos por colonos portugueses, no século XVIII. As pessoas saíam às ruas jogando pó-de-arroz e perfume umas nas outras, sem nenhuma ordenação. Essa festa continuou acontecendo por muito tempo, e está aí a origem dos blocos carnavalescos.

Em 1835, o carnaval passou a ser comemorado pela elite carioca, em bailes de máscaras no Hotel Itália. O parâmetro para essas festas, conhecidas como Sociedades Carnavalescas, era a sociedade parisiense.

Em 1855, a cidade presenciou seu primeiro desfile de Carnaval, feito por um grupo de intelectuais auto-denominado “Congresso das Sumidades Carnavalescas”. Até Dom Pedro II assistiu ao desfile.

O desfile de blocos de rua durante o Carnaval carioca foi autorizado pela política em 1889.

No final da década de 1920, alguns blocos de carnaval começaram a se organizar, dando origem às primeiras escolas de samba.

De 1930 a 1944, o Carnaval era festejado na Praça Onze, por muitos considerada o “berço do samba”. Nesse ano, ela foi demolida para dar lugar à Avenida Presidente Vargas, que foi palco da festa até a inauguração do Sambódromo, em 1984.

O primeiro desfile de escolas de samba organizado no Rio de Janeiro aconteceu em 1932. Cada escola podia apresentar até três sambas e a campeã foi a Mangueira.

A grande fama das escolas de samba carioca, entretanto, só veio nos anos 50, quando intelectuais passaram a se interessar por cultura popular e pelo “folclore” do carnaval, levando os desfiles à classe média.

A folia carioca está no Guinness Book: é o maior Carnaval do mundo!

Apesar de a festa carioca ter raízes antigas, foi somente em 1963 que ela entrou para o calendário turístico da cidade. O que motivou a oficialização do Carnaval carioca foi o histórico desfile do Salgueiro com o samba-enredo Chica da Silva.

Foi na gestão de Roberto Paulino, biênio 60/62, na Mangueira, que foi criada a Ala das Baianas com as características atuais. Eram 125 baianas coordenadas por D. Neuma. Foi no desfile das campeãs em 1970, quando o presidente era Juvenal Lopes que a mais famosa baiana da Mangueira Nair Pequena, morreu em plena avenida, quando a escola cantava o samba de enredo “Um Cântico a Natureza”.

No carnaval de 1972, a Império Serrano com o enredo “Alô, Alô, Tai Carmem Miranda” chegou com suas alegorias praticamente nuas na concentração, deixando os componentes da escola, tristes e preocupados. De repente, Fernando Pinto, o carnavalesco, foi montando folhagens, bichos e coqueiros que estavam embrulhados em plásticos, transformando os esqueletos das alegorias em uma deslumbrante floresta. Era o gênio de Fernando Pinto que começava a despontar. A escola de samba Império Serrano foi campeã com um carnaval que ninguém se esqueceu até hoje.

Em 1969, quando Fernando Pamplona anunciou que o enredo era “Bahia de Todos os Deuses”, os salgueirenses ficaram preocupados. Havia crença geral que o carnaval sobre a Bahia dava azar, pois todas as escolas que tinham feito carnavais a respeito do tema não haviam conseguido passar do 3° lugar. Inclusive o Salgueiro, em 1954, ficou nessa posição com “Uma romaria à Bahia”. A coisa piorou ainda mais quando foi determinado que a escola ia se formar do lado direito da Candelária, que, segundo os sambistas, também dava azar. Contra todos os prognósticos pessimistas Salgueiro foi campeão nesse ano.

Dagmar, esposa de Nozinho, irmão de Natal da Portela, foi a primeira mulher a tocar surdo numa bateria de escola de samba.

Num desfile da Azul e Branca denominado “Noite de São Silvestre” promovido pelo jornal “A Manhã” na noite de 31 de dezembro de 1949, a pastora Finoca, em adiantado estado de gestação não deu ouvidos às ponderações de sua mãe Adelaide, também sambista, e as do marido Nunes e desceu para o desfile. Na madrugada de 1º de janeiro de 1950, a escola partiu da Praça Onze para o Obelisco. Na altura da rua D. Gerardo, Finoca começou a sentir os primeiros sintomas do parto. Sentou-se no meio fio encostou a cabeça no poste e chamou o repórter Aroldo Bonifácio para acionar uma ambulância. O jornalista, ao tentar sair, para procurar um telefone foi seguro por Finoca que havia piorado. Não houve jeito. Nasceu a criança sob a assistência apavorada do jornalista. A menina ganhou o nome de Adelaidinha se tornando depois uma famosa passista.

O famoso “Tablado”, local onde as escolas de samba desfilaram, de 1952 a 1956 tinha 1 (um) metro de altura e cerca de 60 metros de extensão. O “Tablado” ficava na Av. Presidente Vargas, entre as ruas Uruguaiana e Av. Rio Branco, em frente à Escola Pública Rivadávia Correa. As escolas de samba desfilavam no sentido Av. Passos – Candelária.

A ala de baianas na década de 30 era formada, quase exclusivamente, por homens que saiam nas laterais das escolas, portando navalhas presas as pernas para defenderem as agremiações em caso de brigas.

Desde 1996, os enredos das escolas de samba vêm assumindo o formato de “Projetos Culturais” elaborados por especialistas. A necessidade de seduzir patrocinadores determinou o aparecimento de enredos capazes de proporcionar retornos financeiros. Segundo alguns dirigentes de escolas de samba, os enredos orientados nesse sentido são uma saída para abaterem os custos cada vez mais altos dos carnavais.

No carnaval de 1996 cerca de 20% dos componentes de Escolas de Samba como a Imperatriz Leopoldinense, Portela e Mocidade Independente vieram de estados como São Paulo e Minas Gerais.

Sabino Barroso, um dos arquitetos que fez o projeto da quadra da Mangueira, é um exímio pandeirista. Tocou durante seis anos na bateria da Mangueira. Segundo Sabino o mestre Waldomiro gostava do pandeiro na bateria (havia poucos pandeiristas), pois dava um tom leve ao conjunto. Mas, uma coisa é o pandeirista que dá exibição, outra é o que sai na bateria.

Paulinho do Ouro, um dos mais eficientes administradores de barracão de escola de samba, diz: “Trabalho por terceirização com turmas de no máximo 50 pessoas e todo planejamento é feito por etapas”. Ao se concluir uma etapa, entra outra, de forma que no final do carnaval não fica o corre-corre tão comum dos últimos dias dos preparativos quando cerca de 200 pessoas se acotovelam nos barracões das escolas de samba trabalhando dia e noite.

Irênio Delegado, jornalista, foi quem levou as classes sociais mais privilegiadas para assistirem aos ensaios das escolas de samba. O fato se deu em 1948. Foi organizada uma grande programação para o lançamento de um refrigerante na Serrinha. Nesse dia veio uma comitiva de 30 pessoas importantes de São Paulo e do Rio de Janeiro, entre elas o diretor da Rádio Nacional, Victor Costa. Em continuidade várias festas foram planejadas com o apoio dos jornais A Noite e A Manhã. Depois as festividades foram estendidas para a Portela, Aprendizes de Lucas e Azul e Branco do Salgueiro.  A Império Serrano deixou de dar ensaios na Serrinha e veio para o Madureira Tênis Clube.  O “high society” começou a chegar e a partir da segunda metade da década de 60 tornou-se um modismo ir à quadra das escolas de samba.

Uma das alegorias consideradas mais bonitas, verdadeira obra de arte foi a “Yemanjá”, confeccionada, para o carnaval de 1969, por Arlindo Rodrigues, toda em “papier-machê” prateada. A “Yemanjá” estava sentada num mar de rosas pratas, com diversas oferendas e cercando-a uma cascata feita por pequenos e numerosos espelhos que com o toque da luz do sol deu o efeito tão desejado pelo artista. Naquele ano, o Salgueiro iniciou seu desfile por volta de 11h, do dia, com um céu de brigadeiro.

A Império Serrano, na década de 50, recebia, em sua sede e terreiro de ensaios, no final da rua Balaiada, um dos pontos mais alto do morro da Serrinha (para chegar à sede se subia por uma estreita escada, cavada no barro), turistas e personalidades (fato inédito) oferecendo a famosa Ceia do Samba. Entre os visitantes ilustres que foram à Serrinha, citamos o Prefeito da cidade, a cantora Marlene, o locutor Manuel Costa, entre outros. Um forte temporal que caiu na cidade em 1958 fez ruir a velha sede acabando com um dos mais tradicionais costumes do samba.

Rubem Barcelos, famoso compositor do Estácio, incentivador de blocos, morreu no dia 17 de junho de 1927, com uma hemoptise galopante (tuberculose) não vendo a primeira escola de samba do Rio, a Deixa-Falar, que ajudou a fundar, desfilar.

O compositor do Salgueiro, Djalma Sabiá, autor de um dos mais belos sambas de enredo de todos os tempos, chamado “Navio Negreiro”, é o inventor da bebida “batida leite de onça”.

De 1958 a 1962, a Coca-Cola Refrescos e o jornal Última Hora, patrocinaram um desfile extra, antes do carnaval (realizou-se na Praça 7 e no Campo do Fluminense). A iniciativa não se repetiu.

Foi Nelson de Andrade, ex-presidente de Salgueiro e da Portela, o autor do lema usado até hoje pela escola Vermelho e Branco da Tijuca, ” nem melhor, nem pior, apenas uma escola diferente”.

O público que assistia em 1958, aos desfiles das escolas de samba, na Av. Rio Branco, comprimido por uma corda de aço que margeava as calçadas, alugava caixotes de madeira a CR$ 5,00 (cinco cruzeiros).

Em 1959, pela primeira vez contrariando uma norma do regulamento dos desfiles, o Salgueiro não usou as tradicionais cordas. Daí em diante, caiu a obrigatoriedade das cordas envolvendo toda a escola de samba.

Em 1959, o desfile das escolas de samba estava atrasado mais de 4 h, porque a Unidos de Bangu não queria entrar devido a um defeito em de seus carros alegóricos. A segunda escola a desfilar, a Aprendizes de Lucas se recusou a substitui-la. Para resolver o impasse Nelson de Andrade, então presidente do Salgueiro, em homenagem ao povo, resolveu abrir o desfile. Nesse mesmo ano o Salgueiro foi a Cuba e desfilou na inauguração de Brasília.

A região do Estácio, morada de artífices, operários e biscateiros, vizinho do São Carlos era um ponto natural de encontro, convergência de malandros alguns deles excelentes sambistas. Exatamente por isso, tem uma história importante no samba. Os botequins do Estácio, sobretudo, os do “Compadre” e “Apolo”, eram frequentados pelos bambas que fundaram a primeira escola de samba.

O surgimento da primeira escola de samba, a Deixa Falar, coincidiu com a implantação da gravação elétrica no Brasil, responsável pelo impulso ao mercado do disco.

O decreto-Lei estadual que designa o dia 2 de dezembro como o Dia Nacional do Samba é de autoria do deputado Frota Aguiar. O fato se deu durante o 1º Congresso Nacional do Samba.

Em 1961, o Sr. Victor Bouças, então diretor do Departamento de Turismo criou o “júri-móvel”, uma carreta onde se instalava a Comissão Julgadora e que devia circular enquanto a escola desfilava. A “engenhoca” não funcionou e o júri permaneceu fixo. Nesse mesmo ano, o Sr. Victor Bouças propôs que o desfile das escolas de samba fosse realizado no Maracanã, pois a Av. Rio Branco já não comportava o crescimento das agremiações. Em 1962 as escolas fizeram o último desfile na Av. Rio Branco, indo para a Candelária (Av. Presidente Vargas).

Em 1983, a escola de samba Caprichosos dos Pilares que estava no grupo especial com o enredo “Um Cardápio à Brasileira”, desfilou às escuras na Passarela do Samba durante cerca de uma hora, pois faltou luz. A escola continuou o desfile, porém na abertura dos envelopes, as notas não foram computadas. A escola de Pilares foi mantida no Grupo Especial. Fato semelhante aconteceu com a escola de samba Santa Cruz em 1992, que também fez seu desfile às escuras. A partir desse incidente o regulamento dos desfiles estabeleceu que na ocorrência de falta de luz as escolas deverão continuar o desfile, mas para valer o julgamento os jurados devem descer das cabines, permanecendo na pista.

A religião, a maldição e o samba portelense


Paulo da Portela (sem chapéu) ao lado de Heitor dos Prazeres

Por Edilson Nascimento

Não é novidade nenhuma para os internautas que religião e samba se dispõem em cruz. Quem nunca participou das festas para São Jorge e São Sebastião com muito samba? Qual a quadra de escola de samba que não tem o seu santo protetor perto da sua bateria e em lugares considerados vulneráveis? Que escola de samba que nunca deu um banho de ervas em sua quadra preparado pelas suas baianas? Qual porta-bandeira não rezou o seu mastro antes de entrar na avenida?

Pois é, este instrumento de confiança chamado religião, através de seus sacerdotes, alimenta a fé de muitos sambistas. Em 1974, ocorreu uma história que colocou os valores espirituais da diretoria de harmonia da nossa querida Portela em xeque.

Natal, saudoso personagem do samba carioca e então presidente da Portela, trouxe o trabalho de seu pai-de-santo. Trabalho feito, não teria para ninguém, a Azul e Branco de Madureira se consagraria campeã. Mas a tal mandinga tinha que ser feita pela harmonia da escola. E aí...

Hiram Araújo, grande historiador e pesquisador da cultura popular samba, era diretor e autor do enredo, “O Mundo Encantado de Pixinguinha?”, escolhido para este Carnaval. Natal o elegeu para realizar este favor, digamos assim, especial:

– Você tem que encher a boca de cachaça e jogar um pouco em cada alegoria!

Hiram, que nunca bebeu uma gota de álcool na vida, ficou espantado e disse que aquela não seria a primeira vez.
Com o tom veemente peculiar, Natal fez-se porta-voz da fúria dos deuses e esbravejou a praga:

– Pois então a Portela vai ficar 30 anos sem ser campeã!

O fato é que, neste ano, a Portela perdeu o Carnaval para o Salgueiro por 1 ponto e justamente no quesito enredo. Será que a praga caiu também sobre Hiram Araújo? Bom, pelo menos, ficou claro que a praga era por 30 anos mesmo. Porque em 2005, um ano depois do período desgraçado, a Águia querida quase foi rebaixada. Faltou muito pouco para que esse episódio lamentável acontecesse.

Uma escola de samba aguerrida, protegida por São Jorge, a azul e branco de Madureira ostenta 21 títulos, como bem diz a letra do samba de Carlinhos Madureira, Café da Portela e Iran Silva: “Olha eu aí, cheguei agora / Cheguei para levantar o seu astral / Posso perder, posso ganhar, isso é normal / Vinte e uma vezes campeã do Carnaval.”

Mas a letra de samba-enredo que melhor expressa o título deste post é a do Carnaval da Azul e Branco de 1984, “Contos de Areia”, letra de Dedão da Portela e Norival Reis: “Bahia é um encanto a mais / Visão de aquarela / E no ABC dos Orixás / Oraniah é Paulo da Portela / Um mundo azul e branco / O deus negro fez nascer / Paulo Benjamim de Oliveira / Fez esse mundo crescer (okê-okê) / Okê-okê, Oxossi / Faz nossa gente sambar / Okê-okê, Natal / Portela é canto no ar / Jogo feito, banca forte / Qual foi o bicho que deu? / Deu águia, símbolo da sorte / Pois vintes vezes venceu / É cheiro de mato / É terra molhada / É Clara Guerreira / Lá vem trovoada / Epa hei, Iansã! Epa hei! / Na ginga do estandarte / Portela derrama arte / Neste enredo sem igual / Faz da vida poesia / E canta sua alegria / Em tempo de carnaval / (Ê Bahia...) / Eis o cortejo irreal, com as maravilhas do mar / Fazendo o meu carnaval, é a vida a brincar / A luz raiou pra clarear a poesia / Num sentimento que desperta na folia (amor, amor ...) / Amor, sorria, ô ô ô, um novo dia despertou / E lá vou eu, pela imensidão do mar / Nessa onda que corta a avenida de espuma, me arrasta a sambar / E lá vou eu, pela imensidão do mar / Nessa onda que corta a avenida de espuma, me arrasta a sambar.”

O 22º título do GRES Portela só veio no ano passado após 33 anos de jejum.