Pesquisar este blog

quarta-feira, fevereiro 21, 2018

Beber, dever e decorar



Por Ivan Lessa

Escrevo no dia em que, no Brasil, têm início os festejos de Momo, conforme se dizia em minha época. Pior: tríduo momesco, para certos jornais e locutores de rádio.

Em sinal de solidariedade, e já que não há mais bailes decentes no Rio que foi meu e a que pertenci, estarei assistindo o desfile das escolas, em avenida ou sambódromo, e torcendo olimpicamente para que vença a melhor.

Ou seja, como todo mundo com quem me dava, estarei à distância contando com a vitória de Mangueira.

Em Londres, comemorarei os três - ou cinco ou dez - dias de carnaval, bebendo vinho e uísque e comendo coisas preparadas pelo microondas.

Como a ressaca é garantida, irei depois à farmácia para adquirir alguns remédios adequados, vitaminas e, para disfarçar o aspecto acabado de meu rosto, um ou dois produtos de beleza masculina.

O preço disso tudo é de menor importância para mim. Estou me lixando: boto tudo no cartão de crédito.

Na quarta-feira de cinzas, vou procurar mobília nova para a sala, já que, nela, a gata andou fazendo um estrago danado.

A rigor, não vou fazer nada disso. Mas o que é o "a rigor" diante do poderio, diante do charme avassalador das estatísticas?

Acabei de ficar sabendo, pelas folhas, que o dinheiro gasto em bens de consumo não essenciais, tais como os que mencionei há pouco, aumentou em cerca de 30% em termos reais nos últimos dez anos.

E que a dívida média para cada homem, mulher e criança da Grã-Bretanha é de perto de 15 mil dólares.

Isso porque as taxas de juro andam baixas.

Portanto, mais de 60% das pessoas vivem em estado de absoluto desconhecimento dos problemas econômicos globais.

É verdade. Ou deve ser verdade.

Só pode ser por isso que venho envelhecendo melhor do que as mulheres britânicas que vejo todo dia no elevador ou no metrô.

Não que eu tenha notado nada. Mas as pesquisas afirmam isso: a expectativa de vida está aumentando para os homens.

Que é, então, onde o círculo, a carnavalesca serpentina da vida, se fecha: só pode ser a bebida, as dívidas irresponsáveis e o vivo interesse por questões ligadas à decoração.

Nenhum comentário: